Constrangimento na final prova que Libertadores feminina precisa mudar
Corinthians é tetracampeão diante do Palmeiras com estádio vazio e público muito aquém do que o futebol feminino é capaz de mobilizar
Foi um torneio de absoluta prevalência das equipes brasileiras. Pela primeira vez na história da Copa Libertadores feminina, três das quatro semifinalistas representavam o Brasil, e a grande decisão reservou simplesmente um clássico entre Corinthians e Palmeiras, vencido pelo time alvinegro, que se superou com uma jogadora a menos no segundo tempo e conquistou seu quarto título na competição.
No entanto, a final do torneio realizado na Colômbia teve arquibancadas praticamente vazias, algo inimaginável caso o dérbi tivesse sido realizado no Brasil e que só comprova que passou da hora de a Conmebol rever o formato da Libertadores feminina.
Seria compreensível por uma questão de custos promover o torneio em duas semanas e sede única se o futebol feminino não estivesse num estágio bem diferente da época em que o torneio se abriu para as mulheres, em 2009. Desde então, a modalidade ganhou aderência e investimentos, principalmente a partir de 2019, quando clubes que disputam competições sul-americanas começaram a ser obrigados a manter times femininos, além do masculino.
Alguns clubes alegam que não teriam condições de bancar os custos de logística e viagens se a Libertadores feminina fosse realizada no mesmo formato da masculina, com jogos de ida e volta em diferentes países do continente. Porém, se este é o principal entrave, cabe à Conmebol usar parte de sua milionária receita para oferecer ajuda às equipes com deslocamentos.
Nem que, para isso, seja necessário repensar a fase de grupos, dividindo os times de acordo com regiões ou implementando, em caráter transitório, um formato de mata-mata semelhante ao da Copa do Brasil. O que não pode é seguir impedindo que clubes mandem jogos do maior torneio continental em seus respectivos países.
Público e apelo não faltam. Na Colômbia, sede desta última edição, o mesmo estádio Pascual Guerrero, que recebeu menos de 10% da sua capacidade para Corinthians e Palmeiras, já abrigou 37.000 torcedores na decisão do campeonato local entre América e Deportivo Cali, no ano passado.
No Peru, o clássico Alianza Lima x Universitario foi prestigiado por 42.105 pessoas, recorde sul-americano no futebol feminino que acabou quebrado logo em seguida, em jogo do pentacampeonato brasileiro do Corinthians, que colocou 42.566 torcedores na Neo Química Arena.
A atmosfera fria e silenciosa nas arquibancadas desta final não representa só um constrangimento para a Conmebol, como também uma frustração enorme para a comunidade do futebol feminino, que lamenta a chance perdida de dois jogos com estádios lotados, tanto a Neo Química Arena quanto o Allianz Parque, caso a decisão tivesse sido disputada nas casas de cada finalista.
Fora a necessidade de mudança do formato, a Libertadores feminina não tem o direito de reproduzir a questionável final única do masculino. Nas últimas edições de finais de competições da Conmebol, torcedores brasileiros tiveram dificuldades para comprar ingressos e passagens a preços inflacionados, a ponto da decisão da Sul-Americana de 2021, entre Athletico e Red Bull Bragantino, em Montevidéu, ter sido um fracasso de público.
O maior dérbi de todos os tempos do futebol feminino merecia outro tipo de ambiente e mobilização, dada a ocasião histórica proporcionada pelo encontro de dois dos projetos mais bem-sucedidos da América em uma final de Libertadores. Em nada ofusca o feito do tetracampeão Corinthians, muito menos a noite inspirada da goleira Lelê, mas serve como um atestado de urgência para que a Conmebol valorize, de fato, a modalidade.