Punição por cânticos homofóbicos precisa valer para todos os clubes
Árbitros e STJD deveriam adotar o mesmo rigor aplicado ao Corinthians, único punido por homofobia no Brasileirão
Nesta sexta-feira, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) arquivou denúncia contra o Flamengo por cânticos homofóbicos de sua torcida registrados na arquibancada do Maracanã, no último clássico contra o Fluminense. Com isso, o Corinthians continua sendo o único clube punido com restrição de público no estádio nesta edição do Campeonato Brasileiro devido à homofobia.
O STJD determinou que o time paulista jogasse uma partida com portões fechados após a torcida corintiana entoar reiteradamente gritos homofóbicos em clássico diante do São Paulo. Na ocasião, o árbitro Bruno Arleu de Araújo paralisou o jogo por causa das ofensas. O telão da Neo Química Arena exibiu mensagens alertando os torcedores. Como os cânticos não cessaram, o juiz relatou o incidente em súmula, que serviu como base para o julgamento do clube no tribunal.
Desde 2019, quando soou o apito de Anderson Daronco aos 19 minutos do segundo tempo do duelo entre Vasco e São Paulo, em São Januário, primeira partida paralisada em função de cânticos homofóbicos no Brasil, os árbitros trabalham com a recomendação de interromper jogos a qualquer sinal de manifestações discriminatórias. Naquele mesmo ano, a LGBTfobia foi equiparada ao crime de racismo pelo STF.
Chama a atenção que, ainda assim, atitudes como a de Bruno Arleu de Araújo no clássico paulista sejam raras entre os árbitros, que, em sua maioria, têm sido coniventes com cânticos homofóbicos vindos das arquibancadas, a exemplo da arbitragem comandada por Wilton Pereira Sampaio, que não paralisou o último Fla-Flu nem relatou o incidente em súmula.
A falta de vigilância dos árbitros dificulta punições aos clubes. Quando não há paralisação dos jogos, a denúncia deixa de ser protocolada por órgãos da Justiça Desportiva e passa a depender de entidades independentes, como o Coletivo de Torcidas Canarinhos LGBTQ+ ou o Grupo Arco-Íris de Cidadania LGBT, responsável pela notícia de infração mais recente envolvendo a torcida do Flamengo.
De qualquer forma, imagens gravadas dos cânticos discriminatórios proferidos pelos torcedores já deveriam ser suficientes para o STJD ao menos denunciar os clubes. E se o registro em súmula é fundamental, a Comissão de Arbitragem da CBF precisa reforçar a orientação para que os árbitros se tornem mais vigilantes.
Não se trata de uma cruzada clubista. Neste ano, o STJD julgou e multou outros cinco clubes por cânticos homofóbicos de torcida, como o Ceará, sancionado em 40.000 reais. O Flamengo, que teve denúncia arquivada, também já foi alvo de gritos discriminatórios de torcidas rivais ao longo desta temporada. Porém, apenas o Corinthians recebeu a pena de restrição de público prevista para casos do tipo.
É de se lamentar que, mais de quatro anos após a criminalização da LGBTfobia no país, os cânticos homofóbicos sigam tão banalizados nos estádios. E que as instituições esportivas se furtem de agir com rigor diante da urgência de uma mudança de cultura nos estádios. Para isso, punições severas precisam valer para todos os clubes e torcidas.