O corintiano que "fez" camisa com carvão e viralizou na web
Morador de rua, Vilson de Paula Afonso foi encontrado pela reportagem do LANCE! após viralizar na web com camisa improvisada do Corinthians. Ele conta memórias e sonhos
Rua Aurélia, esquina com Rua Clélia. É por lá que anda Vilson de Paula Afonso, corintiano de 52 anos. Você possivelmente não conhece Vilson pelo nome, mas ele é o dono de uma camisa do Corinthians que emocionou a internet nos últimos dias. Na quinta-feira, uma foto do torcedor com uma camisa corintiana improvisada viralizou na web. A imagem vinha acompanhada com a localização de onde foi feito o clique. Seguindo as pistas, o LANCE! foi até o endereço na manhã do último sábado. E lá estava Vilson, orgulhosamente vestido com o seu manto sagrado desenhado com um pedaço de carvão.
Vilson é morador de rua. Ele dorme na Alameda Santos, próximo da Avenida Paulista, e passa o dia na Rua Aurélia trabalhando como guardador de carros. Era 8h da manhã quando sentamos numa lanchonete bem na esquina do começo do texto. Não demorou cinco minutos para o nosso protagonista aparecer. "Senta aqui com a gente. Quer tomar um café?". Ele aceitou e foi no balcão. Quando voltou, veio para a mesa com um copo de pinga: "Não vai ser uma entrevista, vai ser um bate-papo", disse Vilson, com uma simpatia ímpar.
Entre sorrisos e goles, Vilson explicou a história de sua camisa improvisada:
"Eu tinha ganho uma camisa do Corinthians há muito tempo. Um dia, fui dar uma lavada nela e coloquei pra secar. Aí, na hora que eu volto... Cadê a camisa do meu time? Levaram a camisa do meu Corinthians, roubaram... Aí eu tinha essa camisa branca aqui. Bonitona, né? Eu pensei... Vou improvisar uma do Corinthians. Comecei a rabiscar e pronto. Rabisquei com carvão pra ficar preto e branco. Pelo menos voltei a ter uma camisa do meu time. Tinha que ter".
O TWEET QUE VIRALIZOU
Da série: Corinthiano não vira, ele nasce.
Todos os dias esse senhor fica no bar de esquina das ruas Clélia x Aurélia.
Toma sua cerveja e em dias de culto na Bola de Neve, ajuda a cuidar dos carros.
Ontem eu o vi com essa camiseta "personalizada" do Corinthians.
Achei incrível. pic.twitter.com/2q6JbCscSh
— Leticia Vilar (@letvilar) 11 de janeiro de 2018
Vilson, mais conhecido como "Negão" pelas ruas, passou a ser procurado por torcedores do Corinthians após sua foto se espalhar pela internet. Ainda na quinta-feira ele ganhou uma camisa corintiana. Na sexta, foi presenteado com mais quatro, além de um boné com o símbolo do clube - que virou seu xodó.
"Já recebi, em mãos, cinco camisas e o boné. Estou muito feliz, de coração. Quando a primeira pessoa veio e me deu, eu pensei: o que está acontecendo? Depois um amigo aqui da região me mostrou a foto no celular: Esse aqui é você, né? Na hora da foto, eu estava levando um caixote que uma senhora de uma loja tinha me encomendado. Poderia ter sido um tiro pelas costas, mas foi uma coisa boa, graças a Deus", disse Vilson, explicando porque ainda estava usando a camisa improvisada mesmo tendo recebido diversas camisas novas:
"Essa camisa é a que foi destaque, é com essa que o pessoal está me reconhecendo. Escondi as outras. Um amigo de um estacionamento aqui na região permitiu que eu deixasse lá. Deixei lá no fundo, bem escondido. Preciso deixar bem guardado, né... Vai que acham. Nas ruas, achado não é roubado".
Levantamos da mesa e fomos para a calcada da Rua Clélia, em frente à lanchonete, o local exato da foto que viralizou. Lá, Vilson recebeu das nossas mãos a atual camisa três do Corinthians. A emoção tomou conta do momento.
"Essa paixão pelo Corinthians vai desde mil novecentos e lá vai bolinha! (risos) 77 então, meu! Basílio! Chutou e é gol! A Ponte Preta tentou derrubar a gente. Dicá jogava muito... Eu estava em Pindamonhangaba (SP). Sou de Suzano (SP), mas nessa ocasião o meu coroa, meu pai, que faleceu ano passado, estava trabalhando em Pindamonhangaba. Ele trabalhava em obras e a gente ia com ele pelas cidades onde tinha trabalho. Ele era corintiano, é claro. Toda família é. Somos em seis irmãos, tudo (sic) Corinthians. Um mora aqui, o outro mora ali, mas eles constituíram família", falou Vilson, que só estudou até a oitava série.
Vilson nunca entrou na Arena Corinthians. O mais próximo que passou do estádio foi no metrô de Itaquera. Porém, as lembranças deste dia marcaram.
"Eu não fui na Arena ainda. Fui fazer uma visita para um irmão meu, que mora em Suzano, de trenzão: "tru tru tru". Dá pra ver a Arena de dentro do metrô. Quando eu passei na frente do estádio... Eu fiquei impressionado. Só consigo ver os jogos pela televisão, quando vou passando por algum lugar que tem TV".
Com o sonho de ter uma camisa do Corinthians realizado, Vilson agora quer conquistar outros objetivos. A principal meta de 2018 é arrumar sua dentição.
"Estou tentando um dinheiro para um aluguel, até quem sabe comprar uma casa. Eu fico escondido aqui, escondido ali. Mas meu maior sonho no momento é arrumar meus dentes, colocar um implante nessa carcaça. Batalhei o ano passado inteiro, mas não deu. Joguei na Mega, joguei na Quina... Tem vezes que eu deixo a barba grande porque ela esconde as falhas nos dentes. Tão (sic) faltando alguns e os que sobraram estão querendo cair. Eu não quero pedir nada, mas esse é o meu maior sonho. Quero sorrir bonito nos gols do Timão".
* A camisa entregue a Vilson foi cedida pela Nike.