Clubes vão priorizar sócios-torcedores na volta do público aos estádios no Brasil
Retorno da torcida aos estádios, com primeiros testes em setembro, terá restrições para evitar aglomerações
Com o avanço da vacinação contra covid-19 no País, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e os clubes planejam o retorno parcial dos torcedores aos estádios. Ele será "parcial" porque os clubes terão de respeitar as regras de distanciamento social nas arenas. Os estádios não poderão ficar lotados para evitar a possibilidade de contaminação com o novo coronavírus.
Com isso, um consenso começa a surgir entre os clubes: os sócios-torcedores terão prioridade na compra dos ingressos na retomada do público. Os clubes apostam na retomada dos planos de fidelidade e na recuperação dessa parcela da torcida, que também foi afetada pela pandemia.
"O sócio-torcedor do Flamengo sempre teve prioridade na compra de ingressos. Com a retomada controlada de público aos estádios, esta prioridade será ainda mais importante, na medida em que teremos uma limitação de ingressos disponíveis para venda. Muito provavelmente, neste início, o público presente será formado majoritariamente por sócios-torcedores", diz Gustavo Oliveira, vice-presidente de Comunicação e Marketing do Flamengo.
A posição do clube com maior torcida do País é a mesma de outras agremiações. "Assim que o retorno for concretizado, ao analisarmos as regras que serão impostas, nós iremos priorizar o acesso aos sócios-torcedores, que mesmo sem poder ir ao estádio permaneceram ao lado do clube durante esse período", assegurou o presidente do Fortaleza Marcelo Paz.
O Juventude pretende abrir a venda de ingressos para o público em geral apenas quando a capacidade de ocupação for superior a 50%. "Temos que reforçar nosso apoio aos sócios, principalmente pela ajuda que eles nos deram na pandemia. Eles se mantiveram adimplentes e apoiaram o clube em todos os momentos", afirma Fábio Pizzamiglio, vice-presidente de marketing.
Victor Grunberg, vice-presidente de administração do Internacional, afirma que o clube vai apresentar um modelo de retomada parcial do público com valorização dos sócios-torcedores.
Durante a pandemia, o Palmeiras ofereceu ao sócio-torcedor com a mensalidade em dia o retorno desses valores em créditos para compra de ingressos extras. O clube afirma que o sócio continuará tendo prioridade em um "movimento automático". "Para cada partida, o clube pretende determinar um número excedente de lugares para atender exclusivamente a essa demanda, privilegiando assim, quem ajudou o clube durante esse período", informou o clube por meio de nota ao Estadão.
Os programas de sócios-torcedores se tornaram uma renda significativa para os clubes nos últimos anos. De maneira geral, eles oferecem vantagens nas compras de ingressos para jogos. Por conta da pandemia, no entanto, o segmento também encolheu.
Testes
A CBF prevê as primeiras experiências de retomada da torcida no segundo turno do Campeonato Brasileiro e nas quartas de finais da Copa do Brasil. Isso deve acontecer no final de agosto e início do mês de setembro. A entidade deve buscar o aval das autoridades estaduais para que as partidas sejam realizadas com público parcial. O governo estadual de Minas Gerais, por exemplo, já autorizou a reabertura nos municípios que estão na "fase verde" no combate à pandemia. Hoje, a região do Vale do Aço, onde se localiza Ipatinga, é a única que poderia receber torcida na arena sem restrições.
Em São Paulo, o governador João Doria (PSDB), afirmou nesta quarta-feira, 11, que não vai antecipar a data para volta do público aos estádios e que isso só deve ocorrer em 1º de novembro.
A Conmebol autorizou em julho o retorno do público aos estádios nos jogos das oitavas de final da Libertadores e da Copa Sul-Americana. Isso depende, no entanto, da liberação das autoridades locais. A Prefeitura do Rio de Janeiro liberou a presença de público na final da Copa América no início do mês de julho. O Maracanã recebeu cerca de 1,6 mil torcedores na vitória da Argentina sobre o Brasil. O cenário mudou em setembro. O poder municipal havia liberado a volta gradual aos estádios, mas voltou atrás em função do aumento de casos de covid-19 na cidade.
Falta de bilheteria
A ausência de bilheteria afetou de forma significativa o orçamento dos clubes brasileiros. O Fortaleza, dono da segunda maior média de público do Campeonato Brasileiro em 2019, foi uma das principais equipes afetadas pela falta de bilheteria. A receita bruta dos ingressos em 2019 foi de aproximadamente R$ 11 milhões, o que representa cerca de 10% da Receita Operacional. A saída, como conta o presidente Marcelo Paz, foi reduzir gastos. "A perda das receitas com bilheterias foi minimizada, mas é difícil compensá-la", avalia. De maneira geral, a participação da venda de ingressos no total de receitas dos clubes gira de 10 a 15%.
O Cuiabá, estreante na Série A, estima perdas de R$ 1 milhão por mês por conta da falta de público. A torcida planejava ver o clube na primeira divisão pela primeira vez. "Para o mato-grossense, não poder ir ao estádio neste momento é difícil. Ficamos 35 anos sem ter um time do estado na Série A. Era um sonho de todos", declarou Cristiano Dresch, vice-presidente do clube.
No Brasileirão de 2019, último com a presença de torcida, a receita bruta resultante da venda de ingressos dos clubes da Série A foi de aproximadamente R$270 milhões.
Sem a bilheteria, os clubes tiveram de diversificar as receitas. Pizzamiglio explica que o Juventude investiu em planos associativos diferenciados a partir de R$ 28 mensais, ingressos virtuais e até campanhas de doação via PIX, além da busca constante de novos patrocinadores. O clube está de volta à Série A depois de 13 anos.
Gustavo Oliveira revela que o Flamengo "conseguiu um incremento representativo nos valores dos patrocínios, maior monetização das redes sociais, venda de espaços na programação da FlaTV, (a terceira maior TV de clubes do mundo), a comercialização direta do PPV do Campeonato Carioca e, é claro, a venda de alguns jogadores de futebol do elenco".
No Palmeiras, o principal desafio foi manter o fluxo de caixa para manutenção dos compromissos firmados. "O Palmeiras definiu que, durante a pandemia, não demitiria ninguém. Para conseguir tais feitos, o clube precisou reduzir seus custos, renegociar prazos, tentar manter quem já era colaborador, buscar minimizar algumas perdas que seriam irreparáveis e negociar atletas", informou o clube.
Apesar da pandemia, o mercado publicitário continuou crescendo no último ano. Desde março do ano passado, mais de 120 novos acordos foram fechados por clubes da Série A. A interação das marcas com as torcidas ficou restrita ao meio digital.
"Durante a pandemia, as ativações no âmbito digital foram fortalecidas", explica Fernando Lamounier, diretor de marketing da Multimarcas Consórcios, patrocinadora do Atlético-MG, Paysandu e Sport. "Mas nada substitui o contato presencial e as experiências ao vivo aos torcedores. Todo o mercado publicitário, as empresas, as agências e os próprios clubes estão ansiosos e já se planejam para esse momento", completa.