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Copa do Catar

Irã x Estados Unidos: rivais na Copa têm um histórico de tensões em outras áreas

Embargos, conflitos, ameaças... Não faltam histórias em torno dos países que vão a campo nesta terça-feira (29), às 16h (de Brasília), em Doha (QAT), pela Copa do Mundo

29 nov 2022 - 09h55
(atualizado às 11h45)
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Weah e Taremi: americanos e iranianos frente a frente (AFP / Montagem LANCE!
Weah e Taremi: americanos e iranianos frente a frente (AFP / Montagem LANCE!
Foto: Lance!

A Copa do Mundo de 2022 abrirá espaço para adversários que têm histórico de disputas. Nesta terça-feira (29), Irã e Estados Unidos lutam por uma das vagas do Grupo B às oitavas de final no Estádio Al Thumama, em Doha (QAT), às 16h (horário de Brasília). Mas não faltarão lembranças das relações conflituosas dos dois países, que convivem com episódios de tensões, ameaças e momentos de violência em outras áreas.

ALIADOS QUE SE TORNARAM INIMIGOS

Xá Reza Pahlevi: o monarca que tinha ligação com o Ocidente (Divulgação)
Xá Reza Pahlevi: o monarca que tinha ligação com o Ocidente (Divulgação)
Foto: Lance!

Inicialmente, houve um período no qual as relações entre os dois países era bem-sucedida. O monarca Xá Mohammad Reza Pahlevi era bem visto por países do Ocidente.

- Até 1979, o governo iraniano era ostensivamente pró-Estados Unidos e pró-Israel. O Xá Reza Pahlevi queria ser o representante dos Estados Unidos na região. Fez, inclusive, enormes investimentos em tecnologia militar de ponta... - explicou Andrew Traumann, pesquisador do Grupo de Estudos em Pesquisas em Oriente Médio (Gepom).

No entanto, houve momentos conturbados no Irã neste períod.

- Internamente, Pahlevi tinha um governo extremamente repressivo. Não havia partidos políticos. Além disto, ele tinha uma polícia secreta chamada Savak, que matava e torturava opositores e perseguia qualquer tipo de opinião divergente. Houve centenas de milhares de desaparecidos no Irã - recordou Traumann.

Alguns fatores levaram o país de vez à crise.

- Isso tudo leva a uma grande insatisfação da população. Mesmo após a crise do petróleo, quando houve a quadruplicação do preço do barril (em 1973 o aumento chegou a 400%), não houve uma melhora na qualidade de vida da população - e acrescentou:

- Até a classe média, que apoiava o regime ditatorial, vai abandonar o Xá. Afinal, tinha havido uma promessa de melhorias de IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e nada aconteceu. Ele continuou a investir apenas no setor militar e houve muito pouca melhoria na infraestrutura - completou o pesquisador.

Aiatolá Khomeini: símbolo da Revolução Islâmica (Wikicommon)
Aiatolá Khomeini: símbolo da Revolução Islâmica (Wikicommon)
Foto: Lance!

O professor Andrew Traumann apontou como isto abriu espaço para a Revolução Islâmica de 1979.

- Essas situações levaram a manifestações que uniam liberais, marxistas, religiosos... A Mesquita é a única instituição que o Xá Reza Pahlevi não ousava tocar, pois a religião é muito importante para os iranianos. Ali se tornou um foco revolucionário, devido às respostas do Xá, que simplesmente abriu fogo contra a população civil. Quanto mais mortes nas manifestações, maior foi a revolta da população - e destacou:

- O Aiatolá Khomeini, então exilado na França, foi orquestrando essas manifestações. A partir do momento que ocorreu um massacre em 8 de setembro de 1978, com milhares de mortos. O Xá se viu forçado a renunciar. Depois disso, ele fugiu para o Egito e a Revolução Iraniana foi consumada - concluiu.

Professor de Relações Internacionais da Uerj, Paulo Velasco vê este momento como um marco para o atrito entre iranianos e americanos.

- A grande ruptura vem com a ascensão da Revolução Iraniana, que coloca os xiitas no poder. O Aiatolá Khomeini foi o primeiro grande líder religioso e se tornou um grande inimigo dos Estados Unidos - disse.

SEQUESTRO DE DIPLOMATAS NA EMBAIXADA AMERICANA EM TEERÃ

Estudantes iranianos sequestraram diplomatas americanos: 444 dias de espera (Foto: AFP)
Estudantes iranianos sequestraram diplomatas americanos: 444 dias de espera (Foto: AFP)
Foto: Lance!

Passados nove meses da ascensão da Revolução Islâmica ao poder, Irã e Estados Unidos tiveram um dos capítulos mais conturbados de sua história. Tudo começou quando o grupo Estudantes Islâmicos Seguidores da Linha do Imã entrou na sede da embaixada americana em Teerã.

- O Xá Reza Pahlevi havia pedido asilo aos Estados Unidos, pois estava com câncer. A população viu aquilo como uma artimanha. Afinal, em 1953, houve a Operação Ajax, na qual os americanos, ao lado do Reino Unido, tiraram Mohammed Mossadegh, eleito democraticamente do cargo de primeiro-ministro, do poder - relembrou o pesquisador.

Porém, o professor de História das Relações Internacionais no Unicuritiba e Pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Oriente Médio (Gepom) frisou que o episódio da embaixada teve um desdobramento ainda mais forte.

- Um grupo de manifestantes tomou a embaixada iraniana em Teerã para protestar contra este asilo. O que era para ser a manifestação de três dias se tornou um sequestro de 444 dias com apoio do governo iraniano. Isso levou ao rompimento de relações diplomáticas que dura até os dias de hoje - pontuou.

Professor de Relações Internacionais da Uerj, Paulo Velasco aponta que este é o primeiro de muitos momentos de tensões entre os dois países.

- Tivemos este caso dramático logo em seguida durante o governo (Jimmy) Carter. Diplomatas e servidores dos Estados Unidos foram mantidos como reféns por um longo tempo e dali para frente e o Irã se tornou uma pedra no sapato nos americanos no Oriente Médio - disse.

Segundo o professor Andrew Traumann, este longo impasse se torna um divisor de águas na rivalidade entre os dois países.

- A tomada da embaixada foi vista como uma grande humilhação. A embaixada é um lugar inviolável. Sequestrar diplomatas norte-americanos levou as relações a piorarem muito - afirmou.

A longa crise acarretou em mudanças de forças no poder dos Estados Unidos. Candidato à reeleição, Jimmy Carter perdeu a presidência para Ronald Reagan. Os diplomatas foram soltos na mesma data da posse de Reagan.

GUERRA IRÃ-IRAQUE

A guerra por fronteiras que durou oito anos (Foto: AFP)
A guerra por fronteiras que durou oito anos (Foto: AFP)
Foto: Lance!

Outro impasse diplomático aconteceu em 1980. A Guerra Irã-Iraque eclodiu em setembro.

- Em 1980, o Iraque de Saddam Hussein invadiu o Irã e isso levou a uma guerra. Países como Estados Unidos, Inglaterra, Egito e Arábia Saudita apoiaram os iraquianos contra o Irã. a guerra durou oito anos, matou em torno de um milhão de pessoas e não resolveu o impasse fronteiriço entre os dois países - lembrou-se Traumann.

De acordo com Velasco, os desdobramentos da guerra entre Irã e Iraque expõem ainda mais os atritos entre americanos e iranianos.

- Na década de 1980, os Estados Unidos chegam a financiar e a apoiar Saddam Hussein na guerra entre Irã e Iraque. Isso se explica pelo grande temor que eles tinham dos xiitas do regime dos aiatolás - e explicou:

- É claro que muitas coisas mudaram com o tempo no Oriente Médio. O Iraque se tornou inimigo, Saddam se tornou inimigo... Mas o Irã continuou a ser inimigo não só dos Estados Unidos, mas também de Israel. Os iranianos têm seu ódio também destinado aos israelenses - completou

CALMARIA?

Bill Clinton e Muhammad Khatami: presidentes dos Estados Unidos e Irã no
Bill Clinton e Muhammad Khatami: presidentes dos Estados Unidos e Irã no
Foto: Lance!

O marcante "Jogo da Paz" entre Estados Unidos e Irã na Copa de 1998 aconteceu em um período mais brando da política entrre os dois países. O professor Andrew Traumann sinalizou que houve um favorecimento para a atmosfera da partida.

- Do lado dos Estados Unidos estava o democrata Bill Clinton, enquanto o Irã tinha Muhammad Khatami, um presidente mais aberto ao diálogo. Isto deixou levemente amenas as relações dos dois países - disse.

Professor de Relações Internacionais da Uerj, Paulo Velasco detalhou este período.

- No governo Clinton, houve alguns ensaios de aproximação. Coincidiu com Clinton a vitória de Muhammad Khatami, com quem Casa Branca tinha maior disposição de dialogar, por seu perfil mais moderado. Mas foram apenas ensaios, não houve nenhum efeito prático de maior aproximação - e destacou:

- Bill Clinton chegou a dizer que seria importante estabelecer algum diálogo entre os povos americano e iraniano, pois iria melhorar o clima político por consequência - completou.

Clinton, porém, vetou a participação das empresas norte-americanas na indústria petroleira iraniana.

Os anos 2000, porém, foram marcados por muita instabilidade entre americanos e iranianos.

- O relacionamento nesta década foi muito ruim. O Mahmoud Ahmadinejad, ultraconservador, foi eleito presidente do Irã, e piorou a relação durante a gestão de George W. Bush - disse Paulo Velasco.

Houve um novo momento momento de leve estabilidade entre os governos dos dois países posteriormente.

- Este relacionamento mais aberto ao diálogo é retomado durante o governo de Barack Obama. Neste período, é eleito no Irã foi Hassan Rohani, um presidente mais moderado. Foi quando aconteceu o primeiro telefonema de um presidente norte-americano parabenizando um presidente iraniano pela vitória - afirmou Andrew Traumann.

Aos olhos do Professor de Relações Internacionais da Uerj, Paulo Velasco, apenas no período de Obama houve margem para engrenar uma negociação.

- Obama é eleito no mesmo período que o Rohani e isto abriu espaço para uma tentativa de diálogo. As duas delegações voltaram a se sentar à mesa depois de quatro décadas e estabeleceram o acordo nuclear de 2015 - disse.

ACORDO NUCLEAR?

Trump sai do acordo nuclear: crise com o Irã à vista (Reprodução
Trump sai do acordo nuclear: crise com o Irã à vista (Reprodução
Foto: Lance!

As negociações do acordo nuclear, porém, trouxeram um turbilhão diplomático na relação entre Irã e Estados Unidos:

- A partir de 2015, há a questão do programa nuclear iraniano. O Irã, por ser signatário do programa de não-proliferação nuclear de 1968 tinha direito a um acordo pacífico. Só que há uma pressão muito forte dos Estados Unidos e um lobby de Israel para que os iranianos fiquem cada vez mais isolados. Além disto, a Arábia Saudita não quer que o Irã volte ao mercado do petróleo, pois seria um concorrente - disse Traumann.

Houve uma discórdia em relação ao tema que envolveu Estados Unidos e Irã.

- Foi feito um acordo e, basicamente, por razões políticas, Donald Trump (então presidente dos Estados Unidos) se retirou do acordo em 2018. Temos todo um retrocesso nesse sentido. O Irã retoma seu programa nuclear. O acordo fica sem os Estados Unidos, seu principal fiador. A situação atual é bastante complexa para projetar uma retomada - disse Andrew Traumann.

Trump frequentemente definiu o Irã como terrorista em suas redes sociais. Em 2 de janeiro de 2020, houve outro momento de tensão entre os dois países: um bombardeio em Bagdá ordenado pelo presidente dos Estados Unidos matou Qassem Soleimani, chefe de uma unidade especial da Guarda Revolucionária do Irã e um dos homens mais poderosos do país. No mesmo atentado, também morreu Abu Mahdi al-Muhandis, chefe de milícia iraquiana apoiada pelos iranianos.

A tentativa de acordo nuclear agora passa por outros obstáculos.

- Os Estados Unidos tentam um acordo nuclear por meio do governo Joe Biden, mas agora têm de negociar com um governo de linhagem mais conservadora, que é o Ebrahim Raisi - disse o professor de Relações Internacionais da Uerj, Paulo Velasco.

O pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Oriente Médio (Gepom), Andrew Traumann, destacou que as negociações ficaram mais turbulentas diante da situação atual em território iraniano.

- O Irã vive um contexto interno difícil com as manifestações nas ruas contra o governo. E o país convive com um governo linha-dura, que não está disposto ao acordo nuclear como era originalmente. Para o governo iraniano, o Ocidente mentiu! Prometeu que iria descongelar os bens que o Estado iraniano tem na Europa e nos Estados Unidos e isso não aconteceu. Há uma grande pressão da população, que está muito descrente em relação às promessas de que o acordo nuclear trará progresso e prosperidade. É uma situação muito complexa - disse.

EMBARGOS ECONÔMICOS E CRISE INTERNA IRANIANA

Irã em meio a protestos: crise financeira acentua momento de revolta (Foto: AFP)
Irã em meio a protestos: crise financeira acentua momento de revolta (Foto: AFP)
Foto: Lance!

As sanções econômicas dos Estados Unidos também vêm rendendo desavenças com o Irã. Os embargos mais recentes afetaram exportação de petróleo, atividades cibernéticas e fabricação de armas.

- São mais de 40 anos de sanções. O Irã não tem acesso a peças automotivas. Muitos aviões iranianos são dos anos 1970. O país está fora do mercado de petróleo, só consegue vender para alguns poucos países como a China, Paquistão... Também não pode ter contas bancárias dentro da União Europeia - e constatou:

- Muito se falou recentemente da Rússia ser excluída. Mas o Irã já saiu há muitos anos, está completamente embargado. Não poder vender seu petróleo. Isso prejudica bastante a economia de seu país - finalizou.

Irã e Estados Unidos medem forças nesta terça-feira (29) em Doha. O jogo é decisivo. Os iranianos têm três pontos, enquanto os americanos estão com dois no Grupo B.

Lance!
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