‘Diária de R$35’ e vício em futebol: esposa entrega atacante da Seleção
Francielle, que também avalia momento da modalidade no país
Ex-atleta da Seleção Brasileira, Francielle vestiu a camisa verde e amarela por 14 anos. A história no futebol da terceira entrevista da série Pioneiras começou jogando futsal em uma escolinha de Itanhaém, litoral paulista. Ainda criança, ela foi descoberta pelo técnico Kleiton Lima.
A convite do treinador, hoje comandante do Santos, migrou da quadra para o campo e estreou pelo Portuário. Na sequência, a equipe da Vila Belmiro foi seu primeiro clube profissional, onde atuou por 10 anos. No Brasil, ela ainda defendeu o Corinthians e São José, além do Sky Blue, dos Estados Unidos, Stjarnan, da Islândia, e o Avaldsnes Idrettslag, da Noruega. A aposentadoria aconteceu em 2018, aos 29 anos.
Aos 14 anos, Fran teve sua primeira convocação na seleção Sub-19, única categoria de base que existia na época. Dois anos depois, ela já estava na principal, conquistando a medalha de prata nas Olimpíadas de Pequim, em 2008, e no Pan-Americano de 2011.
"Minha trajetória na Seleção no geral foi muito positiva. Disputei Mundiais, Olimpíadas e Pan-Americano. A experiência que eu adquiri não tem preço. A emoção de vestir a camisa, fazer gols pela Seleção e representar o país não tem como descrever, só dá pra sentir mesmo”, relembrou Fran.
A experiência de anos faz Fran ter um olhar atento aos avanços que as mulheres vivem no esporte. Para o Mundial da Austrália e Nova Zelândia foi anunciada pela primeira vez uma logística exclusiva, feita para a aclimatação das jogadoras que lidam com o fuso de 13 horas em relação ao Brasil. Voo fretado, roupas de viagem e delegação com número recorde de 17 mulheres são as novidades observadas pela ex meio-campista.
“Quando eu comecei na Seleção, a diária era R$ 35. Ficávamos 20 dias na Granja Comary treinando e no dia do pagamento, ganhávamos R$ 900 porque ainda havia desconto. Naquela época, para mim já era muito. Em uma viagem para a Austrália a gente fazia 12 horas de voo, ficava sete horas no aeroporto em escala, para pegar outras 13 horas, em classe econômica”, lembrou.
Em 2020, a CBF aunciou pagamentos iguais para as diárias e premiações das seleções masculina e feminina.
Em entrevista ao Terra, Fran avaliou que a modalidade tem sido mais bem retratada pela grande mídia, o que resulta em maior interesse do público. Segundo ela, isso faz com que as marcas olhem para o futebol de mulheres com mais atenção.
Convidada no ano passado para se tornar comentarista, ela foi nomeada como ‘Embaixadora do Paulistão Feminino’ pelo canal TNT, onde atua nas transmissões do campeonato estadual. O fato de não haver muitas ex-jogadoras comentaristas foi importante na decisão pela nova função.
“Tento trazer o meu lado de atleta antes de fazer alguma crítica, porque eu já joguei, e não quero falar nada chato sobre elas, assim, como eu não iria gostar que falassem algo que não vem ao caso sobre mim. Como eu tive a vivência, isso me ajuda, e faz com que eu tenha um trabalho melhor, com visão ampla para comentar os jogos, sem deixar de lado uma crítica construtiva”, ponderou.
Em análise sobre o Mundial da Austrália, Fran destacou as seleções dos Estados Unidos, Inglaterra, Espanha e a Austrália como favoritas. Ela observa um Brasil forte e confiante, com talentos individuais que podem desequilibrar durante o torneio, devido à mescla de atletas jovens e experientes, mas lamentou uma ausência.
“Eu levaria a Cristiane. Ela merecia não só por ser sua última Copa do Mundo, mas pelo desempenho nos últimos anos. A Cris está com 38 anos, e mesmo que não jogasse 90 minutos, renderia em 30 ou 40. Para a sua função ela é perfeita dentro da área”, avaliou a comentarista.
Como grande parte dos especialistas, a ex-jogadora questionou a convocação da goleira Bárbara e da zagueira Mônica por não terem feito parte das últimas convocações.
“A Pia no cenário mundial é muito vitoriosa. Quando ela chegou, encontrou dificuldades nunca vividas antes, como estrutura, campeonatos e calendários. Depois de dois anos eu esperava um desempenho melhor. Concordo que defensivamente o Brasil evoluiu demais, mas ofensivamente, a seleção deixou a desejar. A última data FIFA na Inglaterra foi o melhor momento do Brasil no ciclo Pia. Espero que possam trazer a sonhada medalha, por esse momento que o futebol e atletas brasileiras estão vivendo, e para coroar tudo o que foi feito antigamente", analisou.
Entre as selecionadas da treinadora sueca para a o Mundial, um nome é especial para Fran. O da atacante Andressa Alves, atleta da Roma da Itália, com quem é casada há três anos.
“A Andressa sempre foi julgada pelas pessoas, principalmente pelo temperamento dentro de campo. Ela se transforma, porque é muito competitiva, e às vezes passava do ponto, mas hoje, é muito mais madura, e o tempo que passou na Europa ajudou muito. As duas últimas temporadas na Roma a colocaram de volta na Copa. Ficou um ano sem ser convocada, quietinha, trabalhando e quando a oportunidade veio, ela agarrou e não deixou escapar”, elogiou.
Entre jogos, treinos e transmissões, o casal que é inspiração na luta contra o preconceito, utiliza as horas vagas para curtir a vida. Fran contou que às vezes precisa tirar Andressa da frente da TV, pois a companheira é “viciada em futebol”.
“A gente gosta de viajar bastante e conhecer vários lugares. Quando estamos no Brasil, fazemos churrasco com a família, somos tias babonas, gostamos de dar presentes. Vamos ver jogos nos estádios e assistimos séries. Fazemos de tudo um pouco, mas sempre juntas”, concluiu Fran, ao lembrar o canal criado no Youtube, durante a pandemia, para mostrar os bastidores da sua vida com a esposa.