Por que Marta disputará Copa do Mundo Feminina sem patrocínios de materiais esportivos?
Quatro anos após o ‘Go Equal’ no Mundial da França, a maior artilheira da Seleção chega para sua última Copa sem a chancela de grande marca
Eleita seis vezes a melhor jogadora de futebol do mundo, nomeada pela ONU como ‘Embaixadora da Boa Vontade’ para a luta por igualdade de gênero no esporte e considerada a rainha do futebol, Marta vai para sua quinta e derradeira Copa do Mundo, e para o terceiro grande evento nos últimos anos, sem a estampa de materiais esportivos em suas chuteiras.
O protesto de 2019, repetido nas Olimpíadas de Tóquio para promover a igualdade entre os gêneros no futebol, deve ser mantido por Marta este ano na Austrália e na Nova Zelândia, já que a atleta recusou propostas por avaliar que valores ofertados são desproporcionais com sua história. Novamente, a camisa 10 terá as chuteiras estampadas pela logo 'Go Equal', um movimento que luta por maior participação feminina.
Marta é considerada a jogadora mais bem paga do mundo. Atualmente, a atacante do Orlando Pride tem um salário de US$ 400 mil por ano (cerca de R$ 1,9 milhão) e fortuna está estimada em US$ 13 milhões (R$ 63 milhões), segundo o jornal espanhol Marca.
Em termos de comparação, Neymar recebe 20 milhões de euros (cerca de R$ 107 milhões) por ano da Puma. Já o português Cristiano Ronaldo tem acordo em 15 milhões de euros (aproximadamente R$ 80 milhões) com a Nike enquanto a Adidas paga 19 milhões de euros (quase R$ 102 milhões) para argentino Lionel Messi, de acordo com a revista Forbes.
Uma pesquisa recente do instituto Women's Sport Trust, do Reino Unido, revelou que as pessoas estão comprando mais de marcas que patrocinam mulheres. Para 60% dos entrevistados, as empresas devem investir tanto no esporte feminino como masculino.
Segundo Igor Padilha, CMO da Highline X, agência especializada em marketing esportivo, a grande mídia é a interlocutora essencial entre jogadoras e patrocinadores. Ele destacou como Marta é refém do tratamento da mídia com a modalidade.
“Um dos principais desafios que as atletas enfrentam é a cobertura que é feita dos campeonatos que elas participam. Os horários e divulgação dos jogos deixam a desejar, assim, as marcas têm menor interesse em investir. Falta às marcas a percepção que podemos estar vivendo a era de ouro do feminino no Brasil, e somente com o apoio delas, esta era terá o peso que merece”, observou.
É recente a forma na qual parte da comunicação midiática tem passado a observar o futebol feminino como um produto rentável e popular, e segundo Padilha, isso afeta diretamente na preferência das instituições por nomes como Cristiano Ronaldo e Lionel Messi, em detrimento de estrelas como Cristiane e Formiga.
“Assim como a WNBA (Liga Profissional de Basquete Feminino dos EUA) recebeu um aporte milionário, vejo isso mudando em pouquíssimo tempo no Brasil. As mulheres são metade da população brasileira e as marcas estão começando a perceber isso, optando por garotas propaganda que representam este público tão diversificado”, projetou.
Além dos meios de comunicação, Padilha analisa que o desenvolvimento de estudos e pesquisas feitos por especialistas dá área de marketing tem contribuído com o olhar das grandes empresas para as mulheres esportistas.
O executivo ainda destacou a atuação da publicitária Gabriela Rodrigues, vice-presidente da Soko (Agência de Publicidade), que levantou a discussão sobre igualdade, no mais importante festival de publicidade do mundo.
“Ela levou neste ano a questão de equidade ao Cannes Lions International Festival of Creativity, onde debateu como as marcas podem criar um impacto positivo por meio da criatividade e cultura. Movimentos como este têm surgido em todo o mundo e é através deles que damos maior voz ao público feminino, gerando maior identificação”, relembrou.
Padilha ainda destacou a importância de um vínculo de confiança entre marcas, clubes, seleções e atletas. “É possível construir uma imagem sólida, baseada em valores, transparência e desempenho esportivo consistente. Isso envolve não apenas conquistar títulos, mas também promover uma conduta ética e engajar-se em iniciativas sociais relevantes. Tanto as marcas como os clubes e atletas vão perceber que estamos no mesmo time, e o adversário a ser vencido é a falta de equidade em cada espaço, seja no esporte ou nas mídias”, argumentou.