Del Nero já havia se queimado ao fugir de hotel na Suíça
Numa ação rápida na manhã de 27 de maio de 2015, em Zurique, na Suíça, agentes do FBI e da polícia local prendiam vários dirigentes esportivos, entre eles o vice-presidente da CBF, José Maria Marin, acusados de crimes de corrupção.
De sua suíte, ainda aturdido com a presença ali de homens fardados e com a ordem de prisão, Marin mal conseguia falar. Solidária e ao mesmo tempo atônita, sua esposa, dona Neusa, tomada por um impulso, tem a ideia de telefonar para Marco Polo Del Nero, hospedado em outro quarto do hotel. Vai lhe pedir ajuda.
- Presidente, estão aqui na nossa suíte levando o meu marido preso. Eu não sei o que está acontecendo. Estou muita nervosa. Ele está trêmulo. Por favor, faça alguma coisa.
Do outro lado da linha, Del Nero, então presidente da CBF, já informado por seu assistente Alexandre da Silveira sobre a operação contra a cúpula do futebol mundial, tenta tranquilizar dona Neusa:
- Fique tranquila. Estou indo aí.
Del Nero não só não apareceu no quarto de Marin como acelerou sua saída do hotel. Horas mais tarde, viajava de volta ao Brasil, deixando de participar de um congresso da Fifa.
A conversa de dona Neusa com Del Nero foi reproduzida meses depois ao Portal Terra pelo vice da CBF, Delfim Peixoto, que mantinha boa relação de amizade com a esposa de Marin e defendia publicamente a punição para os que haviam se beneficiado da CBF com vantagens indevidas. Delfim morreu na queda do avião da Chapecoense, em novembro de 2016, na Colômbia.
O fato narrado acima nem requer uma interpretação mais aprofundada. Basta que lhe seja aplicada a máxima do ‘quem não deve, não teme’ para que haja uma conclusão sobre a reação de Del Nero tão logo soube da detenção de Marin.
Desde aquela data, Del Nero se viu refém das investigações da Justiça dos EUA. No final de 2015, veio a público a informação de que ele e o ex-presidente da CBF, Ricardo Teixeira, estavam indiciados pela justiça norte-americana, por crimes de corrupção. Pesam contra eles, entre outras acusações, a de aceitar benefícios ilícitos em transações comerciais envolvendo competições de futebol.
Impedido de sair do Brasil por receio de ser preso pelo FBI, Del Nero esteve ausente em dezenas de compromissos oficiais no exterior pela CBF – assembleias e reuniões da Fifa, da Confederação Sul-Americana de Futebol, jogos da Seleção brasileira, etc.
Temeroso de que uma punição severa da Fifa lhe tirasse do cargo ainda em 2015 ou em 2016, ele fez várias manobras na CBF para se manter no poder. Contou para tanto com o empenho do diretor Rogério Caboclo, seu braço direito na entidade e eleito há duas semanas como o novo presidente da CBF – numa articulação liderada pelo próprio Del Nero.
Projetado como presidente da CBF num acordo com Ricardo Teixeira, Del Nero não conseguiu sair do ostracismo desde abril de 2015, quando tomou posse. Sem poder representar a CBF fora do País, decidiu investir firmemente nas federações estaduais – detentoras de poder suficiente para determinar a quem cabe o controle da CBF. Aumentou por várias vezes o ‘mensalinho’ para essas entidades – hoje recebem por mês R$ 75 mil e seus presidentes ganham por fora mais R$ 25 mil mensais da confederação.
Assim, conseguiu se sustentar no cargo, enquanto preparava Caboclo para alguma eventualidade. Suspenso por 90 dias em dezembro de 2017 pela Fifa, ele anteviu ali seu banimento definitivo do futebol. Por isso, apressou o processo de sua sucessão com Caboclo sob sua tutela. Duas semanas atrás, houve a eleição e os clubes, renegados em toda a discussão eleitoral, acabaram avalizando o candidato da continuidade. Só Flamengo, Corinthians e Atlético-PR não homologaram o nome do novo testa de ferro do futebol brasileiro.