Documentário expõe 'fraquezas' de Pelé e exalta conquistas
Rei do Futebol aparece de cadeiras de rodas e fala sobre a ditadura em produção da Netflix
"O grande presente que você ganha na vitória não é a joia, é o alívio mesmo". E é justamente o alívio de Pelé e o alívio de toda a população brasileira com a conquista do tricampeonato mundial durante o regime militar o grande foco do novo documentário sobre o Rei do Futebol que estreia nesta terça-feira, 23, na Netflix, dirigido por David Tryhorn e Ben Nicholas.
Diferente do filme Pelé Eterno, a produção da plataforma de streaming traz situações incômodas para Pelé e trata de temas que o eterno camisa 10 nunca gostou de falar, como a utilização da sua imagem pela ditadura e a sua dificuldade de locomoção.
Nos últimos anos, o Rei praticamente não tem mais aparecido em público. Em 2012, ele passou por uma cirurgia para corrigir dores no quadril, mas o procedimento não saiu como o planejado. As pernas que tanto encantaram o mundo começaram a deixar Pelé na mão. Com isso, ele passou precisar de andador e de cadeira de rodas para se locomover.
Apesar de não gostar de ser visto nessas condições, a primeira cena traz Pelé chegando para entrevista com andador. Em outro momento, ele recebe amigos de Seleção e de Santos para um churrasco na cadeira de rodas e ainda brinca sobre a sua situação, demonstrando habilidade em “pilotar” o novo amigo.
Porém, não é só a fragilidade física de Edson Arantes do Nascimento que é exibida em “Pelé”. O documentário, que exalta o período glorioso do ex-atacante entre as Copas do Mundo de 1958 e 1970, suas conquistas e idolatria ao redor do mundo, também questiona Pelé sobre o seu posicionamento durante a ditadura militar.
Questionado se a ascensão dos generais ao poder mudou ao algo, Pelé diz que “o futebol continuou o mesmo. Para mim, pelo menos, não mudou nada”. Mais para frente, ele reconhece que sabia dos abusos do regime. “Se eu dissesse que não sabia, estaria mentindo. Mas era difícil saber o que era verdade e o que era mentira”.
O Rei afirmou que “sempre teve as portas abertas na ditadura”, mas diz que “sempre tinha uma mensagem que era para voltar” após declarar que não defenderia mais o Brasil em Mundiais após a campanha frustrante na Inglaterra em 1966.
“Era uma angústia. Não queria jogar a Copa de 1970, não queria passar o que passei na Inglaterra. Fiquei em dúvida. Um pouco de preocupação, um pouco de saudade. Eu só queria celebrar. Se eu falar que voltei pelo povo, eu estaria mentindo. Era um desafio meu essa Copa do Mundo”, conta.
A conquista do tricampeonato no México foi um sopro de felicidade para um país que enfrentava a pior fase da ditadura. “O brasileiro extravasa da tristeza com o Pelé”, afirma a deputada Benedita da Silva. “Não foi a Copa do Médici, foi a Copa do Pelé”, diz o jornalista Juca Kfouri. Os dois foram alguns dos muitos entrevistados na produção de pouco menos de 2 horas da Netflix.
E Pelé parece concordar com a percepção dos dois: “O fato do Brasil ser campeão, o país deu uma respirada. 1970 foi mais para o país do que para o futebol”.
Além da condição física e da política, “Pelé” ainda trata da infidelidade do Rei em seu primeiro casamento e brinda os amantes do futebol com todo o seu talento. O documentário não entra no debate sobre a importância de Pelé na história do futebol, já que parte do princípio que ele é o melhor de todos os tempos. A idolatria, a reverência e o registro que ele tem 1,283 gols na carreira deixam claro que em nenhum momento se cogita questionar os números do Rei ou compará-lo com as marcas de Lionel Messi, Cristiano Ronaldo ou Diego Maradona.
Veja o trailer: