Juventus termina o ano com discussão de SAF travada e 'coleção' de sindicâncias contra o presidente
Presidente Tadeu Deradeli, acusado de má gestão e criação de dívidas sem autorização, está na mira de um potencial processo de impeachment; procurado pela reportagem, ele não respondeu sobre as acusações
O Juventus da Mooca termina 2024 sem o que comemorar. Além de perder o acesso à elite do Paulistão na semifinal da Série A2 e cair cedo na Copa Paulista, o clube mergulha em tensão política entre a gestão Tadeu Deradeli e a oposição nos conselhos deliberativo e fiscal. Há motivo: adversários de Deradeli o acusam de centralizar ações, desrespeitar as votações dos conselhos em gestão temerária e até proibir opositores de estacionar dentro do clube. O mandatário foi questionado pela reportagem do Estadão sobre as acusações por diferentes vezes desde o final de novembro, por meio de sua assessoria, mas não se manifestou. O espaço fica aberto.
Um dos episódios dessa tensão foi a discussão para a transformação do futebol do clube em SAF. Entre propostas, o maior valor chegou a R$ 24 milhões. O conselho deliberativo, contudo, acusou Deradeli de não seguir os ritos e contratar uma assessoria financeira sem autorização. Segundo o contrato, ao qual o Estadão teve acesso, a empresa receberia 6% do total de eventual negócio.
Em setembro, o presidente confirmou a história, mas argumentou que o processo estava muito lento. "É para ontem. Não dá para esperar mais. Querem ver novamente o valuation, mas não podemos esperar muito tempo. Se for fazer ao pé da letra, acho que até diminui o valor (do clube)", justificou Deradeli, ao Estadão, na época. "Foi fechado porque a gente precisava de uma empresa que viesse assessorar. O nosso jurídico do é tributário, cível... A lei de SAF é uma coisa nova".
A expectativa inicial do presidente era que o negócio fosse concretizado até julho de 2024, ano do centenário do clube. No começo de agosto, a definição foi adiada para metade do mês, quando foi criada a comissão de análise da SAF no conselho deliberativo. O grupo encerrou o trabalho, e o assunto deve ser pautado em breve, mas não há indícios de que haverá aceite de alguma das propostas.
Conforme apurou o Estadão, a gestão atual acredita que se trata de um boicote, para que uma eventual transformação em SAF não aconteça sob a gestão de Tadeu Deradeli. O mandatário foi eleito vice-presidente em 2022, mas assumiu o novo cargo após Antonio Ruiz Gonsalez renunciar, em março de 2023. Ele tem mandato até maio de 2025, quando estão previstas eleições no clube.
O que pode antecipar uma mudança na gestão é um pedido de impeachment, engatilhado no conselho fiscal e motivado por sindicâncias que investigam, entre outras suspeitas, uso irregular de recursos financeiros do clube social para o futebol. "Trata o Juventus como se sua propriedade fosse", resumiu uma fonte ligada ao clube para a reportagem do Estadão.
A prática é proibida conforme estatuto do Juventus. As acusações ganharam apoio até mesmo no conselho de administração. "Há uma carta do vice-presidente (Odacyr Marinelli Raymundo), listando transgressões estatutárias", diz Eduardo Pinto Ferreira, integrante do conselho fiscal.
Sindicâncias investigam cessão de espaços e contratos sem aval do setor jurídico
Os processos administrativos se estendem a diferentes temas, como o contrato da assessoria financeira e empréstimos tomados em nome do clube social para pagar jogadores. É apontado, em uma das investigações, que há atletas que tiveram contratados sem assinatura do setor jurídico, apenas com a firma do presidente.
Outro caso envolve a cessão de um espaço na sede para a construção de quadras de beach tennis. "O que foi aprovado em plenário foi diferente do assinado. Os números mudaram, deixamos de ter alguns direitos, o aluguel era muito baixo. Um espaço desses, aqui na Mooca, era de R$ 60 mil (o aluguel). (A empresa) pagava R$ 12 mil", critica Ferreira.
Segundo o conselheiro, seriam construídas seis quadras, mas foram feitas apenas cinco. Depois, o total foi expandido para sete. O contrato aumentou para dez anos, sob aluguel de R$ 25 mil mensais, ainda considerado abaixo do ideal pelo conselho fiscal.
Essa mudança foi mais uma feita sem aval de outros poderes. O próprio conselho de administração considera que Deradeli agiu com abuso de poder e expondo o clube a riscos fiscais, sob argumento de que o contrato omitiu pagamentos de Impostos Sobre Serviços (ISS) e Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU).
Outras acusações são sem caráter formal. Uma delas é de que opositores de Deradeli teriam sido proibidos até mesmo de estacionar nas dependências do clube. Outra diz que o presidente centralizou tarefas, como a gestão da agenda do salão de festas do clube social, a alguém de sua confiança, mas que não tem relação com o Juventus.
O processo de impeachment pode acontecer de três formas: por pedido de 500 associados ou 20 membros do conselho deliberativo. Ou, ainda, pelo conselho fiscal. A mobilização nos dois primeiros é vista como insuficiente. Há, inclusive, receio de manifestar-se contra a atual gestão e sofrer alguma retaliação. Por isso que o conselho fiscal, composto por três membros, é o caminho mais viável para um possível impedimento de Tadeu Deradeli.
Previsão orçamentária coloca Juventus com R$ 2 milhões em dívidas
O Juventus aprovou a previsão orçamentária de 2025 com uma votação acirrada no conselho deliberativo (33 a 31) e prevê déficit de R$ 2 milhões. A administração tinha intenção de fazer um empréstimo para quitar parte das dívidas, o que foi negado por 39 votos a 28. Os opositores preocupam-se que o dinheiro seja usado novamente para pagar jogadores.
Uma fonte do clube informou que o presidente confessou que faria o empréstimo da mesma forma, sem autorização. A captação de R$ 500 mil, no começo de 2024, sem aval do conselho, é objeto de mais uma sindicância contra Deradeli. Ele também teria usado, novamente sem autorização, R$ 800 mil da conta garantida do clube, cuja função é financiar capital de giro. Sobre essas acusações, o mandatário também não se manifestou.