Fla tomou um caminho inadequado, diz secretário-geral da CBF
Walter Feldman diz que partidas só serão suspensas se algum clube não tiver 13 jogadores à disposição
Confirmada apenas poucos minutos antes do horário marcado devido a uma guerra judicial, a partida entre Palmeiras e Flamengo por pouco não virou o Brasileirão de cabeça para baixo. Caso não fosse mesmo realizado, o jogo poderia ter sido o estopim para a paralisação do campeonato. "Os clubes teriam suas razões para reagir. A decisão da Justiça (de confirmar o jogo) foi fundamental para não acontecer algo mais dramático", admite o secretário-geral da CBF, Walter Feldman, nesta entrevista ao Estadão.
O dirigente afirma que o imbróglio se deu devido à "rejeição do Flamengo" em seguir o que foi determinado para o campeonato, e é enfático quanto à possibilidade de suspensão de jogos na competição: ela só acontecerá caso um clube não tenha 13 atletas para assinar a súmula. Caso contrário, nenhuma partida será remarcada.
A rodada do fim de semana ficou marcada pela indefinição sobre a realização de Palmeiras x Flamengo. O que deu errado para essa partida ter ido parar nos tribunais e só ter sido confirmada minutos antes do horário?
O que deu errado foi a rejeição do Flamengo em relação ao cumprimento do protocolo estabelecido e uniforme para todos os clubes, de que 13 jogadores é número suficiente.
Como o senhor avalia a participação dos sindicatos dos funcionários de clubes e de atletas nesse episódio?
É um caminho inadequado, na medida em que hoje está muito estabelecido que as decisões esportivas devem permanecer no campo das instâncias desportivas. Não havia conflito em termos de uniformidade, de imparcialidade, de tratamento igualitário para todos os clubes. Não havia por que acionar (a Justiça), é uma prática não recomendada, passível de punição, mas evidentemente não foram os agentes do futebol, foram os sindicatos representativos dos trabalhadores. Mas é um caminho inadequado, que causa um desajuste, como efetivamente aconteceu.
Existe o receio na CBF de que casos como o do fim de semana se repitam e que o Brasileiro acabe se tornando mais judicializado?
Na minha avaliação não, na medida que o resultado final restabeleceu o equilíbrio necessário, que passa a ser a partir de agora um paradigma para que exatamente esse conflito - que gerou tantos problemas, traumas e indefinições - deixe de acontecer. Ele será um exemplo para que novos episódios não aconteçam.
Os surtos de contaminação no Flamengo, Fluminense, Goiás, e casos de covid em outros times não seriam um indicativo de que o protocolo não é 100% seguro?
Vou te dar números: 475 jogos, 18 mil testes, sem contar a Copa do Nordeste. Apenas sete jogos adiados, suspensos, e índices decrescentes de contaminação. Dois episódios recentes, Flamengo e Fluminense, que na avaliação científica estão fora da curva, e que, portanto, devem ser analisados em particular. E um alerta da CBF para que o protocolo seja seguido rigorosamente. Nosso protocolo consegue estabelecer parâmetros dentro do sistema de futebol; atividades realizadas fora a gente só pode recomendar que haja um acompanhamento de cada clube para que ela não aconteça.
Então, do ponto de vista da CBF, o protocolo utilizado é seguro?
Nós temos toda a segurança científica... o número de jogos, de testes realizados. Dois fatos de clubes (Flamengo e Fluminense) não abalam a visão científica estabelecida. Os números são de segurança e saúde para atletas, comissão técnica e trabalhadores em geral.
Se houver pelo menos 13 jogadores disponíveis, nenhum jogo do Brasileirão será suspenso?
Exatamente. Isto é uma jurisprudência, está definida no STJD. É um critério que a CBF estabeleceu com os clubes numa reunião plenária com a presença de todos os clubes, sem exceção. É uma decisão uniforme nos campeonatos brasileiros.
A CBF trabalha com a possibilidade de o Brasileirão ser paralisado? Dirigentes de alguns clubes já fizeram comentários nesse sentido publicamente...
(Os comentários foram feitos) no momento antes do jogo, esse jogo dramático do domingo. Evidentemente as tensões, emoções, o sentimento de não atendimento aos protocolos estabelecidos levaram a uma reação antes do jogo. O jogo realizado, e esses números relevantes, que eu chamaria da mais expressivos e casuísticos do mundo em relação ao retorno do futebol, nos dá segurança para a continuação do campeonato. Não há nenhum questionamento sobre isso. Nenhum.
Mas antes da confirmação do jogo, o senhor tinha a impressão de que de fato alguns poderiam partir para a paralisação?
Ah sim, sim. A não realização daquela partida, tendo os princípios estabelecidos de 13 jogadores no mínimo - e o Flamengo tinha 19 jogadores... O protocolo estabelece de maneira muito clara: infectado separa, sem sintoma joga. Outros clubes já tinham passado por isso, por que o tratamento seria diferente com um clube? Aí abalaria a uniformidade, a imparcialidade e a igualdade de tratamento. Evidentemente que, se você trata de forma diferenciada, você não tem equilíbrio no estabelecimento de regras. A não realização do jogo no domingo poderia causar um abalo dramático do sistema, e os clubes teriam suas razões pra reagir. A decisão da Justiça foi fundamental para não acontecer algo mais dramático. Um jogo poderia abalar a questão exemplar que temos hoje.
Outro ponto que gerou discórdia tem a ver com o retorno da torcida aos estádios. Os clubes vão reavaliar essa possibilidade em duas semanas. Há chances de o público voltar às arenas antes do segundo turno?
Não, não, e isso foi feito de maneira muito clara. A gente ouviu o Ministério da Saúde, que deu parecer favorável dependendo das autoridades locais, municipais e estaduais. A CBF fez um contato com grande parte dos governadores e prefeitos, ouvimos direta ou indiretamente. Temos hoje que essas autoridades não têm posição favorável, e tendo em vista o equilíbrio técnico que demandaria a perspectiva de torcida para todos os clubes, nós não vemos a curto prazo a possibilidade de retorno de torcida nos estádios.
Então só vai voltar quando for possível para todo mundo...
Exatamente. A demanda de 19 clubes - não houve a presença do Flamengo nessa decisão - é a seguinte: isonômica, ou seja, igual para todos; gradual, e com a autorização dos governantes estaduais e municipais.