Felipe Melo põe volta ao Brasil em 2º plano: "não preciso provar algo"
Titular na Copa de 2010, o volante está bem no Galatasaray e não coloca volta ao Brasil como prioridade. Além disso, descarta desespero por um retorno à Seleção: "não tenho que ficar sofrendo se não chegar a convocação"
Desde que chegou na Turquia, Felipe Melo ajudou a mudar o Galatasaray e também passou por transformações: teve que se adaptar a uma nova cultura, a um novo estilo de jogo e encarou tudo da melhor forma possível - foi campeão, virou um dos principais jogadores do time e tem motivos para não sair de lá. Apesar da procura de outros clubes brasileiros por seu futebol, Felipe assinou um novo contrato para ficar na Turquia e até acompanha o futebol brasileiro, mas não pensa no retorno - nem para os times nem para a Seleção Brasileira.
Felipe Melo não joga no Brasil desde 2004, quando participou da campanha de rebaixamento do Grêmio. Ele foi para o futebol espanhol, conseguiu reerguer a carreira e foi titular da Seleção na Copa do Mundo de 2010. Depois, entre altos, baixos e polêmicas, tem sido procurado constantemente por times grandes do Brasil. Mas o acerto não aconteceu e agora Felipe se diz feliz. "Estou realmente muito contente por começar a temporada com dois títulos (Copa Emirates e Supercopa Turca) e mais a estreia com vitória", contou em entrevista exclusiva ao Terra sobre os primeiros jogos do Galatasaray na temporada.
A Seleção Brasileira é um tema mais espinhoso para Felipe Melo. Com um discurso cauteloso, ele diz estar pronto e à disposição, caso apareça alguma convocação. Mas faz questão de dizer que já está realizado e nem cria expectativa por isso: "penso só em fazer meu trabalho e honrar o meu clube".
Sobre outros assuntos, Felipe Melo fala mais facilmente. Ele faz, por exemplo, uma boa análise da torcida turca, criticando os clássicos do Brasil, que não têm estádios cheios com frequência. Além disso, o volante comenta ainda como tem sido a relação com seus companheiros e rivais na Turquia, como Taffarel, Wesley Sneijder, Didier Drogba e Cristian, ex-Corinthians.
Veja na íntegra a entrevista exclusiva ao Terra:
Terra: Você foi especulado em clubes brasileiros recentemente, como Flamengo e Inter. Por que resolveu não voltar?
Felipe Melo:
Com o Flamengo a conversa foi formal, com um diretor mesmo. Com o Inter na verdade não conversei e não sei se meu procurador conversou. Existiram outros clubes, só que não vale comentar. Mas acho que a história que construí aqui falou mais alto. Cheguei quando o clube estava na pior temporada da história e agora fomos para a Liga dos Campeões, fui bicampeão turco, da Copa... Então o fato de me tornar ídolo aqui falou mais alto.
Terra: Já está completamente adaptado à Turquia?
Felipe Melo:
A cultura de qualquer lugar é diferente, mas aqui não foge tanto quanto em outros lugares. Em Istambul o povo não tem tanta diferença em comparação com o Brasil. Claro que tem diferença, mas não é tão grande. Morei em Turim e lá sim o povo é muito frio. E em relação à comida, todos lugares que fui sempre teve meu arroz, meu feijão, tem pessoas que cozinham para mim... Então minha família está bem adaptada, sem problema.
Terra: No Galatasaray não existem outros jogadores brasileiros. Você mantém contato com os brasileiros que jogam na Turquia?
Felipe Melo:
Eu até converso com o Cristian, mas é difícil ter amizade mesmo, porque é muito longe onde ele está. É em Istambul, mas é na parte da Ásia, que é distante, tem trânsito e leva no mínimo três horas para chegar. Então isso dificulta o encontro mesmo.
Terra: E a torcida turca? Você consegue compará-la com a do Brasil?
Felipe Melo:
Joguei três campeonatos brasileiros, fui campeão no Flamengo, no Cruzeiro... Então, apesar de ter saído novo, senti o calor da torcida brasileira sim. E na verdade no Brasil o problema é que hoje tem clássicos com o estádio vazio. Aqui em todos jogos o estádio é cheio. E se tratando de clássico é muito cheio mesmo, tem gente que fica para fora. A diferença é essa, o povo vai ao estádio e, independente do jogo, o povo prova que é apaixonado por futebol.
Terra: Tendo a experiência em países que existem estádios lotados, por que você acha que no Brasil isso não acontece? É por medo da violência, pelos ingressos caros ou tem algum outro motivo?
Felipe Melo:
Não acho que seja por medo, porque aqui também tem esse problema. Na verdade o Brasil está até na frente, porque em clássicos vão as duas torcidas. Aqui é clássico com torcida única e mesmo assim acontecem problemas, como no ano passado - jogamos contra Fenerbahce com o título já conquistado e ainda assim um torcedor foi morto. Então aqui tem esse perigo e eles vão para o estádio. Acho que
(o problema no Brasil)é mais pelo preço do ingresso, que pelo que eu vejo é absurdo. Isso acanha um pouco, porque o torcedor pode ver em casa e prefere ficar no sofá mesmo.
Terra: Como foi a pré-temporada do Galatasaray e a estreia do time no Campeonato Turco?
Felipe Melo:
Foi bacana. Eu cheguei um pouco depois, mas ainda deu para ajudar o time a ganhar a Copa Emirates. Depois tivemos a Supercopa Turca, vencemos por 1 a 0 a poderíamos ter vencido por mais, por 3 ou 4. Fomos bicampeões. No primeiro jogo, como sempre, tem muita tensão. E foi contra o Gaziantepspor, que é um time bem armado, que sempre dá trabalho... Então sofremos no final, mas ganhamos. E estou muito feliz, realmente muito contente por começar a temporada com dois títulos e mais essa estreia com vitória.
Terra: Nesse jogo da estreia foi marcado um pênalti para o Galasaray e, aparentemente, teve uma dicussão por causa da cobrança. O que aconteceu de verdade?
Felipe Melo:
Não teve discussão. Eu sou o batedor oficial, sempre bati, mas o Burak
(Yilmaz)pediu para bater. Então eu fui pegar a bola, mas ele pediu para cobrar e eu deixei. Se você vê direito, pode ver que não tem dicussão nenhuma. Se tiver pênalti na próxima partida, eu vou para bater, mas se ele pedir, não tem problema nenhum. Ele é o goleador da equipe e quero mais que ele seja feliz. Na verdade fiquei bastante feliz com a reação da torcida, porque me aplaudiram bastante pela atitude, então fiquei contente com tudo isso.
Terra: O Sneijder se destacou muito no primeiro jogo e tem chamado atenção, junto com outro astro, o Didier Drogba. Como tem sido o relacionamento com eles?
Felipe Melo:
Eles chegaram para ajudar muito o time. Quando eles vieram, a gente já estava em um bom momento, vínhamos de um titulo na casa do nosso rival, estávamos na Liga dos Campeões e em primeiro lugar no Turco. Mas jogadores desse calibre sempre chegam para somar, porque, além de ídolos, a gente se dá bem. O Galatasaray é um grupo bem unido. Claro que existem polêmicas, como em toda família, porque é muito homem junto. Mas é tudo em prol do grupo.
Terra: E como foi a experiência de ter o Taffarel (preparador de goleiros do Galatasaray) como técnico do time?
Felipe Melo:
Ele só sentou no banco, na verdade, e foi auxiliado por nosso treinador mesmo, por rádio. Mas é um cara que dispensa comentários, que viveu da bola por anos e que ganhou tudo que um atleta pode ganhar. Ele tem muita experiência e só tem a ajudar. Ele não teve nada de medo, porque é muito respeitado e, quando falava algo, era coisa boa. Lembro dele dando conselhos bons, porque quem está do lado de fora sempre vê de outra maneira, melhor.
Terra: Com essa boa fase que você tem vivido, acredita que já superou qualquer preconceito que a torcida tenha criado com você após a Copa do Mundo de 2010?
Felipe Melo:
Na realidade esse preconceito foi criado pela imprensa. Nunca, antes da Copa ou depois, eu passei por uma situação constragendora com a torcida. Sempre fui chamado de guerreiro, sempre dei a cara e tenho uma carreira... Ganhei quase tudo no Brasil, ainda falta a Libertadores, e aqui fora fui campeão também. Ainda não da Liga dos Campeões ou da Liga Europa, mas na Juventus fiquei dois anos sempre jogando e na Fiorentina virei ídolo em um ano. Então não tenho problema com isso mesmo.
Terra: Você acompanhou a Copa das Confederações? Deu vontade de estar lá com a Seleção Brasileira?
Felipe Melo:
Acompanhei alguns jogos, porque estava nos Estados Unidos para pegar sol nessa época do ano, já que no Brasil o tempo oscila muito. Mas sobre a vontade
(de jogar pela Seleção),eu acho que já realizei meu sonho de jogar e ser campeão. Claro que vontade de servir meu País sempre dá, isso é óbvio, mas com o pé no chão, com humildade... Eu tenho trabalhado sempre com intuito de estar bem no clube. O resto é com Deus, ele que decide.
Terra: Observando as convocações recentes do Felipão, pelo menos uma vaga de volante parece estar aberta. Você mira essa vaga?
Felipe Melo:
Não sei, porque nunca tive contato com o treinador, nem com o Parreira. Então, para te falar a verdade, penso só em fazer meu trabalho no clube e honrar meu clube. Entrego futuro nas mãos de Deus, mas acho que não tenho que ficar sofrendo se não chegar a convocação. Só tenho que estar preparado se chegar.
Terra: E o futebol brasileiro, você tem acompanhado?
Felipe Melo:
Sim, tenho canais brasileiros, e os jogos de final de semana dá para acompanhar. Em dia de semana é mais difícil, porque às 21h (de Brasília) é muito tarde. Mas acompanho sim, porque, ao contrário de outros jogadores, inclusive grandes jogadores, eu sou um amante do futebol mesmo, assisto tudo. Vejo na TV, jogo em casa, jogo no videogame...
Terra: Todo esse interesse indica uma vontade de ser técnico futuramente?
Felipe Melo:
Para ser bem sincero, não. Tenho quatro filhos e, quando parar, eu quero apenas seguir meus filhos. Claro que vou fazer alguma coisa, não vou ficar parado, mas hoje não digo que penso em ser treinador. São muitos anos como jogador, muitos anos de concentração e acho que já basta, porque é muito desgastante.
Terra: Voltando a falar do futebol brasileiro, você arriscaria um palpite de quem será o campeão brasileiro?
Felipe Melo:
É muito difícil. O Botafogo está muito bem, tem vencido e tem um bom elenco. Tem o Corinthians, que está crescendo agora. Tem Inter e Grêmio, com excelentes equipes. E tem o Coritiba bem, apesar de ninguém ter apostado muito. O Brasileiro é difícil, é muito dinâmico. Lembro que no último título que o Flamengo conquistou
(em 2009)o time estava em sétimo ou oitavo e de repente arrancou. A torcida se empolgou, começou a apoiar e foi campeão. Então prefiro não arriscar um palpite.
Terra: E a vontade de voltar ao Brasil? Tem algum planejamento a longo prazo para isso?
Felipe Melo:
Hoje eu não penso nisso, não tenho uma ideia se daqui a quatro, três ou dois anos vou voltar. Não penso nisso e não penso que na minha carreira preciso voltar para o Brasil provar algo. Então, se pintar alguma possibilidade, quem sabe?! Mas se não, vou continuar por aqui. Assinei agora um contrato de três anos
(com o Galatasaray)e depois vamos ver o que vai acontecer.