Loucuras na 4ª divisão: conheça o "primo pobre" do Santos
Perder um dia das mães, o aniversário do próprio pai, viajar 760 km de ônibus para assistir uma partida de meio de semana no interior e gastar mais de R$ 300 do próprio bolso por mês já seriam loucuras suficientes para acompanhar um clube. Essas, no entanto, são só algumas das experiências vividas por torcedores da única organizada da Portuguesa Santista, o "primo pobre" do Santos, que sobrevive na quarta divisão do Campeonato Paulista sem recursos da diretoria do clube motivada, exclusivamente, por raízes e esperanças de dias melhores.
"A gente acredita que pode voltar. É um castigo, estamos ajoelhados no milho", disse Bruno Rezende, 27 anos, recepcionista.
Ele é um dos idealizadores da torcida Força Rubro Verde, fundada em 3 de março de 2002, em um passado não tão distante, mas de realidade totalmente oposta.
Em grande parte netos e filhos de portugueses, os cerca de 50 membros da torcida viram o clube ir da campanha histórica até a semifinal do Paulista de 2003, quando perdeu para o São Paulo, a três rebaixamentos consecutivos para o fundo do poço, de 2006 a 2009.
"Já abandonei a minha mãe em um Dia das Mães, o meu pai no aniversário. Encaramos viajar com ônibus quase quebrado", contou Bruno. "O amor pela Portuguesa foi o que nos sobrou. É caro torcer, a família as vezes não entende, mas é o nosso único ideal", completou.
O caro começa pelo ingresso. Sai R$ 20 - R$ 10 a meia-entrada - por jogo para assistir a última divisão. A única organizada da Briosa, como é conhecida, anda na contramão. Não aceita cota de ingressos e ainda briga pelo barateamento do valor para todos os torcedores.
"Queremos só o preço justo. Nossa briga é para todos. Quando vamos no interior pagamos R$ 10. Não queremos nenhuma regalia", argumentou Thiago dos Santos, 33 anos, presidente.
Thiago, por sinal, foi o responsável durante a derrota por 1 a 0 para o Grêmio Prudente, na manhã de domingo, por passar uma rifa no estádio durante todo o jogo para angariar fundos para a viagem para a partida seguinte, em Guariba. O sistema se repete nas partidas como mandante, com um rodízio entre os integrantes. Ao final do jogo, o sistema de som do Estádio Ulrico Mursa anuncia o vencedor.
"Tudo o que temos da torcida e fazemos pelo clube sai do nosso próprio bolso. Fomos para Assis, de carro, e gastamos R$ 270 de combustível e R$ 150 de pedágio", relatou.
O alto custo é amenizado com colaborações de R$ 10 dos cerca de 50 sócios.
Protestos e campanhas
Só neste ano, a torcida liderou duas campanhas de grande repercussão. A primeira, a das setas, em que os torcedores levaram setas coloridas de papel e ficaram atrás do gol para que o time melhorasse a pontaria na competição. Depois, em julho, uma faixa de protesto criticando o alto preço dos ingressos para uma partida de quarta divisão do Estadual: "R$ 20? Ingresso de 1ª, futebol de 4ª".
"Temos diálogo com eles, nos chamaram para conversar porque os episódios geraram muita repercussão. Somos respeitados por sermos independentes", disse Thiago.
A mais nova foi a adaptação do hit "Brasil, decime que se siente", cantada pelos argentinos durante a Copa do Mundo: “vamos, vamos, minha Briosa, eu quero ver você vencer. Não importa o que aconteça, estaremos sempre com você. Do interior ao ABC, a Força vai com você, e se for no céu morreremos para te ver. Do Úlrico ao Japão, não importa a divisão, estará sempre no nosso coração”.
Diretoria minimiza
A diretoria da Portuguesa afirmou, por meio de sua assessoria, que "reconhece a importância do apoio da torcida e busca incentivar a presença do torcedor promovendo constantes promoções". O clube ainda citou que "mantém diversos canais de comunicação direto" e que "a média de público está dentro da expectativa" sendo "uma das maiores entre as equipes que disputam o Campeonato Paulista". Por fim, quanto ao custo dos ingressos diz que "os valores de referência seguem tabela encaminhada pela Federação Paulista de Futebol" e que são mantidos desde 2013, "alinhados com a realidade econômica da região".