Como no Rio, Vila dos Atletas de Tóquio 2020 irá privilegiar luxo em vez de moradia social, diz diretor
A exemplo do que está planejado nos Jogos do Rio de Janeiro, a Vila dos Atletas da Olimpíada de Tóquio, daqui a quatro anos, também deverá ser transformada em condomínio de luxo, sem espaço para moradias sociais.
Segundo Masa Takaya, diretor de comunicações do Comitê Tóquio 2020, a ideia é transformar o complexo em uma "região icônica da vida urbana de Tóquio", voltada a "apartamentos de luxo, como no Rio de Janeiro".
Nos Jogos de Londres de 2012, parte dos apartamentos foi reservada para população de baixa renda após o final da competição.
A Vila dos Atletas, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio, vem sendo alvo de polêmica nos Jogos do Rio por obras inacabadas e críticas das delegações. Antes, o projeto já havia sido criticado por não prever uma cota de moradias sociais.
O empreendimento é chamado "Ilha Pura", com apartamentos que devem ser vendidos por até R$ 1 milhão .
"Cada cidade tem um planejamento diferente", disse Takaya à BBC Brasil. "Nosso plano é diferente daquele de Londres, realizado em 2012. No Japão a Olimpíada prevê um projeto de renovação da região da baía de Tóquio, onde será construída a Vila dos Atletas, que após os Jogos se transformará em um condomínio residencial", diz.
Takaya diz que a diferença entre o que está vendo agora no Rio e o que viu há dois anos, em sua primeira visita, é "impressionante".
"Esta é nossa última oportunidade de observar uma Olimpíada antes dos Jogos de Tóquio. Tenho trabalhado em parceria com meus colegas no Comitê Rio 2016 e posso dizer que tudo parece pronto. É impressionante o que fizeram no Rio nos últimos dois anos", diz.
Questionado sobre problemas específicos que poderiam trazer lições para Tóquio, o diretor prefere a diplomacia. "Cada cidade enfrenta seus próprios desafios, tem seu próprio planejamento. O que estamos levando como inspiração é a grande dedicação do Comitê Rio 2016 na organização destes Jogos."
Remoções e orçamento
Apesar de ressaltar que cada Olimpíada é um caso diferente, com planejamento e desafios específicos, Takaya comentou sobre dois temas comuns aos Jogos nas últimas décadas.
Como no Rio, onde milhares de famílias foram removidas de suas casas para construção de obras olímpicas, o processo em Tóquio também deve ocorrer, mas em escala menor, pois muitos dos locais de competição e infraestrutura já estão prontos.
"Algumas famílias terão que deixar suas casas para a construção do novo estádio nacional, e a Prefeitura de Tóquio está providenciando novos apartamentos para eles", diz.
Sobre a possibilidade de os Jogos de 2020 extrapolarem o orçamento apresentado ao Comitê Olímpico Internacional (COI) no processo de candidatura, como tem ocorrido nas Olimpíadas recentes, Takaya diz que os organizadores japoneses "não estão otimistas".
"A Prefeitura de Tóquio e o governo do Japão têm se reunido com o Comitê Tóquio 2020 para revisar responsabilidades e papéis que cada um deve assumir com relação aos custos. Não estamos otimistas, mas uma vez que isso for concluído, poderemos identificar exatamente o que cada um deve fazer."
No Rio de Janeiro, a expansão da linha 4 do Metrô, que liga a Zona Sul à Barra da Tijuca, obra mais cara e mais importante da Olimpíada, havia sido orçada inicialmente em R$ 5,4 bilhões, mas já consumiu R$ 10,4 bilhões, praticamente o dobro da estimativa.
A obra corresponde a um quarto dos R$ 39,1 bilhões gastos com os Jogos e há estações inacabadas que deverão consumir mais recursos no futuro.
Legado, Jogos de 1964 e Fukushima
Os Jogos de Tóquio 2020 serão a segunda Olimpíada realizada na cidade. Menos de 20 anos após o término da Segunda Guerra Mundial, a capital japonesa foi sede dos Jogos de 1964.
Na época, Tóquio era uma cidade muito diferente do que é hoje: não contava com saneamento básico e grande parte do esgoto era coletada das casas por caminhões. Os transportes ainda eram rudimentares e não havia a grande infraestrutura com a qual a capital conta hoje em dia.
Segundo especialistas, a cidade avançou com os projetos impulsionados pela Olimpíada, como a construção da primeira linha de trem-bala entre Tóquio e Osaka, expansões do metrô e saneamento básico. Com os gastos na linha de trem, apenas duas de oito rodovias planejadas ficaram prontas em tempo para os Jogos.
Takaya diz que estádios que sediaram competições em 1964 serão usados novamente. Na comparação com o Rio de Janeiro, ele diz que Tóquio já conta com uma ampla rede de rodovias, linhas de ônibus e de metrô, e que não será necessário investir pesado em infraestrutura e mobilidade urbana - esse foi, diz o diretor, um dos "pontos fortes" do dossiê de candidatura japonês apresentado ao COI.
Se em 1964 os Jogos foram apresentados à população japonesa como uma oportunidade de reconstrução e inserção do país na comunidade internacional, hoje um elemento semelhante está de volta, já que para muitos a Olimpíada é vista como uma oportunidade de reconstrução após o tsunami e o desastre nuclear de Fukushima, em março de 2011.
"A Olimpíada se tornou um símbolo de esperança e reconstrução para as áreas mais afetadas", diz o diretor de comunicações do Comitê Tóquio 2020.
Para ele, o país convenceu o COI de que não há riscos em receber milhares de turistas mesmo após o acidente nuclear.
"Temos visto que o apoio aos Jogos cresceu entre os japoneses e atualmente há muita animação com o fato de o Japão ser novamente uma sede olímpica. Outra coisa é que, apesar dos temores internacionais por conta do acidente nuclear, nós ganhamos a disputa e temos certeza de que os Jogos de Tóquio serão uma oportunidade de renovação para o país", diz.