Competitividade, potencial... ao L!, sócio da XP detalha como SAF tornou futebol nacional atrativo no mercado
Sócio da empresa que intermediou negociações de Botafogo e Cruzeiro, Guilherme Ávila fala sobre decisões de investidores e os desafios para a modernização da gestão
O fato do Vasco ter selado acordo com a empresa 777 Partners para a venda de sua SAF evidencia como o futebol brasileiro tem espaço para um processo de modernização. Sócio da XP Investimentos (empresa que intermediou as negociações de Botafogo e Cruzeiro), Guilherme Ávila destacou ao LANCE! quanto a lei da Sociedade Anônima de Futebol (SAF) abriu caminho para a entrada de investidores
- A grande diferença da SAF em relação a iniciativas e processos que vimos no passado é que ela tem um arcabouço na lei amparando os novos investimentos nessas sociedades que serão criadas para explorarem os clubes e associações. Essa nova lei acaba delineando formatos e traz níveis de proteção para novos investidores mas, obviamente, é uma lei recente - e exemplificou:
- A forma como investidores do Botafogo e do Cruzeiro reagiram mostra que a lei traz algo diferente, um conforto adicional. Possibilita a gente explorar o futebol como ele é explorado em outros lugares do mundo. Antes, as associações não vislumbravam projeto de longo prazo, sustentável, que possibilitasse uma real profissionalização e mudança - completou.
O presidente do Vasco, Jorge Salgado, foi a Miami para fazer o acordo que "não é vinculante". A empresa Matix Advisors participou das negociações. Já nos casos de Botafogo e Cruzeiro, houve a participação da XP. Guilherme Ávila contou como foi o processo no Alvinegro e no clube celeste.
- Este é um processo de M&A, é uma fusão e uma aquisição onde você tem inúmeras frentes para conduzir o processo. Há uma frente de estruturação da transação, uma frente de acesso aos investidores, muito importante para organizar todas as conversas de forma processual, na qual você coloca todos os investidores no mesmo cronograma e nível de informação. Isso aconteceu em ambos os processos - disse.
Aos olhos de Ávila, há uma série de desafios para conciliar neste processo.
- Uma das coisas que a gente acaba se deparando é que o futebol envolve inúmeras pessoas envolvidas com clubes, diversas diretorias... E elas tentam ajudar de alguma forma. Isso é totalmente legítimo, mas a XP tem junto com a área de banco de investimento. Aqui tem mais de cem pessoas dedicadas, um time de M&A dedicado com experiência, trazendo robustez para o processo, garantindo que o processo dê conforto para Botafogo e Cruzeiro envolverem nossa equipe de liderança e estar na velocidade de trazer investidores para os clubes. Você tem uma equipe que acessa investidores do mundo todo, que sabe conduzir negociações muito complexas e isso foi importante - afirmou Guilherme Ávila.
Ávila traçou um panorama de como o mercado do futebol brasileiro é visto aos olhos de potenciais investidores.
- O que a gente tem visto, até pela repercussão dos processos que conseguimos aqui (referindo-se a Cruzeiro e Botafogo) é que tem muita gente querendo entender a nova realidade do futebol brasileiro. É um mercado obviamente muito visado pelo nosso histórico, pela competitividade, pela quantidade de times com altíssimo engajamento, pelo tamanho do nosso país, do número de torcedores. Têm investidores querendo entender - e frisou:
- Só conseguimos entender na hora que houver uma transação na rua. Mas de forma muito macro, no campo de muitas ideias. Estamos vendo um interesse enorme de investidores de diversos perfis dispostos a fazer a diferença, a mudar a realidade daqui. isso está sendo muito gratificante - complementou.
O fato do Real estar desvalorizado em relação a moedas como Dólar e Euro também contribui de alguma forma neste contexto, de acordo com o sócio da XP.
- Ajuda, porque uma parte do investimento é feito no curto prazo. Mas não é um investimento que você olha em um horizonte de dois ou três anos. Quando eles entram aqui, se tornam acionistas de uma nova companhia. Criam uma janela de oportunidades. Só que isso não é um fator decisivo para os investidores entenderem se de fato é uma boa oportunidade na hora. É um elemento adicional no momento! Mas, se de repente o Real estivesse mais forte não deveria tirar o "apetite" desses investidores - constatou.
O valor pelo qual investidor sela um negócio para gerir uma SAF também passa por alguns parâmetros.
- Há algumas formas de você avaliar. Os processos são amparados por um plano de negócios da nova entidade. Junto com os clubes, a gente trabalha um plano onde cria potenciais de receitas, novas fontes que não são necessariamente exploradas pelo clube. A derivada deste plano é um fluxo de negócios descontado para essas associações - afirmou Guilherme Ávila.
O sócio da XP Investimentos ainda detalhou.
- O investidor trabalhará um plano aderente à expectativa dele e, muitas vezes, acaba derivando a avaliação que ele faz ao clube. Como a gente utiliza isso para saber que está barato? Hoje vemos inúmeras transações de clubes ao redor do mundo. São dados público - destacou.
Ávila apontou onde há contraste em relação ao que o torcedor vislumbra para o seu clube de coração.
- Os clubes são listados em Bolsa. Quando a gente utiliza dessa metodologia de fluxo de caixa descontado e triangula isso com o que é negociado de forma global, seja com clubes listados em Bolsa ou transações de clubes privados, isso está fora do que o torcedor consegue mensurar com sua paixão. É feito com base no mercado, de atratividade daquele nome em relação ao contexto e de cenário no qual ele está atuando. Existe alguma tecnicalidade em relação à transação - disse.
Ávila também aponta que clubes podem ter mais de um investidor.
- É possível, mas isso vai depender de termos acordados de associação, clube e esses novos investidores. São termos de acordo de investimentos. Tem relação em restrição a nomes e a período, e essas variáveis são negociada caso a caso. O que posso dizer é que não é que eventualmente esses clubes fiquem na mão somente desses investidores atuais pela eternidade. Existem mecanismos que há possibilidade de que investidores busquem mais capital, investidores estratégicos de diversas formas. É um processo que aconteceu em outros mercados. Vimos o Southampton e na NBA, além de outros mercados que são mais maduros, que estão em novos ciclos de investimentos, avaliações maiores - destacou.
O sócio da XP Investimentos faz uma ressalva em um aspecto do modelo de negócios estabelecido na lei. A SAF tem de destinar 20% de suas receitas para a instituição arcar com suas dívidas.
- Esse investidor acaba sendo penalizado no potencial que tem para explorar para o clube, pois uma parte relevante, de 20%, vai diretamente para pagar os credores. Obviamente, esse deveria ser o fluxo que os credores dos clubes deveriam entender como potencial de geração de caixa para pagamento da dívida - afirmou Ávila.
Guilherme Ávila destacou o caminho da convergência.
- Por mais exista hoje uma entidade, que é associação ou clube, e outra que é a SAF, há um canal de comunicação entre eles. Ele serve para dar o conforto para a associação, que está vendendo as ações do clube e que será repagada a dívida sim. Em algum momento, com algum fluxo definido, à medida que o crescimento da SAF vá acontecendo - declarou.
O espaço para uma gestão mais profissional também traz alguns caminhos aos quais o torcedor tem de ficar alerta. Entre eles, o de decisões "impopulares". Fábio saiu do Cruzeiro de maneira conturbada, enquanto o ciclo de Enderson Moreira no Botafogo chegou ao fim.
- Passa por decisões impopulares. mas é uma reflexão que cada um dos investidores está fazendo diante da realidade do clube ser administrado como empresa. Cada clube vai olhar pra os investimentos de uma forma sustentável e com equilíbrio. Se são impopulares, são uma parte natural do processo, mas é uma forma de readequarem. se nada muda, essas SAFs podem se tornar insolventes - destacou o sócio da XP Investimentos.
O anúncio do acordo entre o Vasco a 777 Partners, que propõe investimento de R$ 700 milhões, exigirá também por uma cautela da diretoria cruz-maltina.
- É tudo um gerenciamento de expectativa em relação ao torcedor. Cada clube vai se adaptar à realidade na qual está inserida. O Cruzeiro e o Botafogo vão se utilizar desse recurso - disse Guilherme Ávila, ponderando:
- Cada clube tem adequar seu investimento à medida que de fato quiser fazer frente a realidade e à competição que está inserido. Não faz sentido gastar um montante comprometido para uma disputa da Série B. Uma forma inteligente é alocar menos recursos do que isso e, à medida que o clube voltar para a Série A, vai buscando reforços e utilizando o comprometimento de capital a ser investido. Não é um projeto de um ano, dois anos, Estão fazendo um projeto para tornar uma empresa saudável no médio ou longo prazo - completou.
Guilherme Ávila ponderou que a mudança de gestão passa por alguns ajustes.
- A partir do momento que você gere essa nova entidade do futebol, tem de pensar como empresa. Uma empresa não sobrevive com uma gestão sem autoridade, sem olhar os números, sem fazer conta e ver se faz sentido. Existe um processo inicial que vai ter uma turbulência, como em todo o processo de transformação. Mas é uma turbulência saudável, porque outros clubes vão começar a entender também que essa gestão saudável. Quando consegue sair do outro lado ajudará a trazer mais dinheiro, mais receita - declarou.
A proposta da 777 Partners é de adquirir 70% das ações da SAF do Vasco, além de proporcionar as obras para reformar São Januário. Os próximos passos são de aprovação dos conselheiros e beneméritos, além do aval dos sócios. Sócio da XP, que intermediou as negociações para a SAF do Cruzeiro e do Botafogo, Guilherme Ávila, falou sobre como foi mostrar que o novo modelo de gestão traria um bom caminho.
- O que a gente faz é um trabalho de convencimento e reflexão que a gente entende que não é trivial. Damos informações e subsídios para que os clubes tomem as melhores decisões relacionadas a esse processo. Cada clube tem suas complexidades e suas particularidades - e reconheceu:
- As resistências ou falta de concordâncias em relação às escolhas que foram feitas são muito naturais, porque elas envolvem muita gente. Mas de forma geral, saímos muito satisfeitos com as decisões que foram tomadas, nos tempos que foram tomados em prol do clube, do futebol e dos torcedores - completou.
Ávila mostra-se otimista de que a "migração" de clubes para a SAF seja um bom passo para o futebol nacional se profissionalizar.
- Acreditamos que o desfecho delas vai garantir a perenidade desses clubes e principalmente a felicidade dos torcedores que vão conseguir olhar por uma perspectiva muito mais clara de futuro para esses clubes - disse.
O sócio da XP Investimentos também avalia outros aspectos.
- A gente está falando inicialmente pela redução de custos, folha de pagamento dos jogadores, dispensas. Mas, ao mesmo tempo, existem muitas pessoas que gostariam de investir no futebol e eu não estou falando de investidores ligados à SAF. Falo de patrocinadores, de empresas que querem fazer parcerias e que nunca se colocaram próximos a esse universo pois não existia um caminho mais sério para fazer isso - e detalhou:
- Agora, a gente está vendo empresas se aproximando dos clubes para explorarem receitas que antes não eram viáveis ou não eram possíveis e isso, à medida que vai se encontrando equilíbrio econômico no curto prazo e gerando mais receita no futuro vai, naturalmente, incrementar as folhas e perspectivas de contratações. Aquilo tudo que o clube acaba se envolvendo pela paixão. Mas, racionalmente, esse trabalho exige uma reflexão sobre a receita e as despesas e é o trabalho que a gente tem feito esses investidores fazerem. - completou.