» Veja as fotos da festaNo dia em que se comemorou a Independência do Brasil, o ator Paulo Autran celebrou 80 anos de idade, 55 de carreira, 85 peças, três novelas e uma minissérie, além de alguns dos mais importantes papéis no cinema.
Sua festa de aniversário aconteceu neste sábado com a pré-estréia fechada do espetáculo Variações Enigmáticas, que entra em cartaz para o público paulistano a partir de domingo no Teatro Faap. Amigos famosos do ator, como Jô Soares, Regina Duarte e Antônio Fagundes, marcaram presença na comemoração.
Em Variações, do dramaturgo francês Eric-Emmanuel Schmidt e estrelada originalmente por Alain Delon em 1996, Autran faz o papel de Abel Zorko, um escritor norueguês ganhador do prêmio Nobel que vive isolado numa casa com vista para o mar.
Um dia Zorko recebe a visita de um jornalista (Cécil Thiré) para falar a respeito de seu livro inédito. A entrevista de uma hora e meia acaba se transformando num jogo da verdade surpreendente.
O texto, dirigido no Brasil por José Possi Neto, foi descoberto em Paris por um amigo de Autran, que se encarregou de traduzi-lo para o português.
"É um espetáculo apaixonante", disse o ator em entrevista à Reuters. "Esse amigo trouxe a peça para mim e quando li fiquei fascinado."
Variações estreou em março no Rio de Janeiro, percorreu o Sul do país e chega a São Paulo no final de semana do aniversário de Autran por pura coincidência. "Não fiz a peça especialmente para comemorar meus 80 anos", afirma.
Especial, de fato, é o CD Quatro Séculos de Poesia, lançado recentemente e no qual o ator declama de Gregório de Matos a Carlos Drummond de Andrade. Apesar de fã do gênero, Autran escreveu poesias somente entre os 8 e os 11 anos de idade.
"Quando escrevi minha última poesia ela era bem pior do que a primeira, então costumo dizer que, em benefício da literatura brasileira, nunca escrevi poesia", afirma o ator, acrescentando que jamais gostaria de ver suas "obras de garotinho" ao alcance do público.
Teatro, sempre teatro
De sua extensa biografia obviamente consta a luta contra o regime militar. Hoje, o país que ainda tem a honra de assistir Autran em plena atividade é mais próximo daquele com o qual o ator sonhava no auge da censura ditatorial.
"Apesar de todos os problemas econômicos, não se pode ignorar o fato de que estamos em plena democracia e esta foi uma vitória do povo brasileiro. Mas todos nós esperamos que o Brasil melhore ainda mais", afirmou Autran, revelando que pretende dar seu voto ao candidato do governo à Presidência.
Não é à toa que seu espetáculo preferido é Liberdade, Liberdade, de Flávio Rangel e Millôr Fernandes, estrelada por ele em 1965. A peça sintetiza os ideais defendidos por Autran naquela época e representa em uma única frase seu verdadeiro amor: o palco.
"Sou um homem de teatro. Sempre fui e sempre serei um homem que dedica a vida à paixão e à humanidade resistentes neste um metro de tablado", dizia a peça.
Autran nasceu no Rio de Janeiro e mudou-se para São Paulo ainda criança. Em 1945, formou-se em Advocacia pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Foi um engravatado por cerca de sete anos até que seu talento artístico veio à tona em 1948, quando encenou A Esquina Perigosa.
Na época conheceu a amiga Tônia Carrero, que o levou para a companhia de seu marido, Adolfo Celi. A primeira estréia profissional de Autran foi em 1949 com Um Deus Dormiu Lá Em Casa, de Guilherme Figueiredo, que logo de cara lhe rendeu cinco prêmios.
Desde então Autran viveu Shakespeare cinco vezes, interpretou Ibsen, Jean-Paul Sartre e Arthur Miller, estrelou o musical My Fair Lady em 1962 e nunca mais parou de atuar. "No teatro, em qualquer idade ainda há muitos papéis que a gente pode fazer (...) Estou pensando em três peças (futuras), mas não vou dizer quais porque em teatro a gente não anuncia com antecedência", afirmou.
No cinema, Autran ressalta sua participação em Terra em Transe, de Glauber Rocha, em 1967, e País dos Tenentes, de João Batista de Andrade, em 1985. Mas atualmente anda um pouco decepcionado com a sétima arte.
"Eu não me afastei do cinema, gosto muito de fazer cinema. O cinema é que se afastou de mim. Recebo poucos convites e geralmente os scripts não me interessam", confessa.
Sua última participação na TV foi na minissérie Hilda Furacão, em 2000. Autran fez apenas três novelas - Pai Herói, Guerra dos Sexos e Sassaricando - e não se arrepende de ter se "aposentado" da telinha.
"Enjoei de fazer novela. Aquela coisa dos próximos capítulos, de ficar muito tempo preso a uma mesma historinha, era muito chata, embora sempre me divertisse na hora de gravar", diz.
Autran viu o teatro crescer e se diz satisfeito com a popularização da arte que tanto ama. "Hoje os espetáculos ficam em cartaz durante anos, recebem milhares de pessoas... Houve uma evolução muito importante e positiva", comenta.
Quanto ao renascimento da cinematografia brasileira, ele revela que não faz a menor idéia "do que o cinema precisa para melhorar", mas diz ter gostado muito de Abril Despedaçado, de Walter Salles, e aponta Rodrigo Santoro como um dos destaques da nova geração de atores.
Exemplo
Depois do teatro, a grande paixão de Paulo Autran é sua atual esposa, a atriz Karin Rodrigues, com quem uniu os laços em 1999 após uma amizade de mais de 30 anos. "Era a coisa mais lógica a fazer e nós só confirmamos o nosso sentimento", conta o ator.
Karin e Autran vivem em casas separadas, mas encontram-se todos os dias. "Se nos damos bem há tanto tempo, para que mudar?", questiona-se, referindo-se à opção de não dividir o mesmo teto com a esposa. "Faz parte da nossa tática de viver bem".
Além de um ícone do teatro e do cinema, Autran pode ainda ser um exemplo para jovens casais. "Não costumo dar conselhos, porque é bobagem...Mas, quem quiser seguir, é uma boa dica".