Quando recebeu um convite do diretor Guel Arraes para escrever um dos episódios da série Brava Gente, em dezembro de 2001, Fernando Meirelles não tinha idéia do estardalhaço que estava por fazer. Desde então, o episódio Palace II já deu origem a um longa, Cidade de Deus, que levou 3 milhões de espectadores aos cinemas, e uma microssérie, Cidade dos Homens, que virou até DVD.Diante de tanto sucesso, a Globo renovou contrato com a produtora independente O2 para mais uma temporada de quatro episódios de Cidade dos Homens. Como aconteceu no ano passado, a microssérie vai ser exibida em outubro, na Semana da Criança, com os mesmos atores, diretores e roteiristas da versão original. "Vamos focar menos o tráfico e mais a vida dos dois adolescentes, com direito a namoros, curtições e frustrações... Queremos revelar um pouco desse universo, desconhecido de boa parte dos brasileiros", acredita Fernando Meirelles.
Mais uma vez, Douglas Silva e Darlan Cunha, ambos de 14 anos, voltam a interpretar Acerola e Laranjinha. Na nova temporada, os dois vão viver conflitos típicos de qualquer adolescente, de comunidades carentes ou não, como o primeiro emprego e a descoberta do amor. Esse, aliás, é o tema do episódio que vai ser escrito e dirigido por Meirelles. Nele, Acerola vai se apaixonar pela primeira vez.
"Apesar de ser uma continuação, o enfoque vai mudar porque os atores também estão mudando. Agora, eles só pensam em namorar...", brinca o diretor. Douglas Silva concorda com ele. A obsessão do rapaz é tanta que, diante da tradicional pergunta "Você prefere teatro, cinema ou tevê?", ele não pensa duas vezes: "Gosto mesmo é de namorar!". E logo justifica a resposta: "Em todos os trabalhos, sempre pintam umas gatinhas", confessa, maroto.
Além de Fernando Meirelles, os novos episódios de Cidade dos Homens vão ser dirigidos por Kátia Lund, César Charlone e Regina Casé. Foi de Regina, inclusive, o episódio de maior audiência no ano passado. A então diretora estreante alcançou picos de 34 pontos com Uólace e João Victor, escrito por Rosa Amanda Strausz. Dessa vez, diretora e roteirista vão se debruçar sobre o surfe. "Quero me concentrar nas semelhanças e diferenças entre jovens de todas as classes e a praia é o cenário ideal porque mistura gente de todo o tipo", observa.
Quanto ao trabalho de Douglas e Darlan, ela faz questão de ressaltar que a série não tem caráter documental. "Pode parecer que, por viverem realidades parecidas, eles sejam como os personagens. Mas ali eles estão atuando mesmo. Os dois são ótimos atores", garante Regina Casé.
Hoje em dia, Douglas Silva e Darlan Cunha fazem parte do grupo Nós do Cinema, ONG do Morro do Vidigal, Zona Sul do Rio, que serviu de celeiro de atores para o filme Cidade de Deus. Para evitar o "efeito-pixote" - alusão ao triste fim do ator Fernando Ramos da Silva, protagonista do filme Pixote, de Hector Babenco, morto em confronto com policiais -, Fernando Meirelles procurou criar uma certa estrutura para os atores-mirins.
Desde que gravou a microssérie, Douglas saiu da favela onde morava no Complexo da Maré, na Penha, Zona Norte do Rio, para um apartamento na Tijuca, emprestado pelo diretor. Lá, ele mora com a mãe, empregada doméstica, e quatro irmãos. Já Darlan continua vivendo na mesma casa, no Catumbi, com a mãe, o padrasto e a irmã. Mas Fernando também ajudou a família de Darlan fornecendo o material necessário para a construção de mais três quartos. "Gostaria de fazer outros personagens. Mas ficarei satisfeito com o que aparecer", diz Darlan.
Cauteloso, o menino sonha ser fotógrafo como o tio e, um dia, estudar Cinema em Cuba. "Não dá para ser só ator. Tenho de ter outra profissão", reconhece Darlan.