Os Sex Pistols fizeram do punk rock uma moda pelas mãos da estilista inglesa Vivienne Westwood e do marqueteiro Malcom McLaren. Com visual agressivo, cheio de alfinetes e tachas, eles viraram ícones de um movimento jovem que queria nada mais do que protestar contra a chatice da música progressiva e do modernismo elitista. Vinte e cinco anos depois, o visual contestador do movimento tomou as passarelas do planeta, tornando-se nada mais que uma tendência mais atrevida no vestir. Não foi exatamente esse o futuro que seus criadores imaginaram para a legítima atitude punk.
``Naquela época a vida era monótona e não se fazia música para jovens. Daí veio o punk e um monte de gente que não sabia tocar começou a criar música. Essa foi a maior motivação do punk rock: o faça você mesmo'', disse Pete Shelley, vocalista e guitarrista da banda inglesa Buzzcocks, em recente entrevista durante sua passagem pelo Brasil.
Assim, o punk ganhou peso nas camadas mais empobrecidas das sociedades e conquistou conotação política ao adotar a Anarquia como símbolo, tornando-se uma importante bandeira da contracultura de massa dos anos 80.
``Com o passar dos anos, ser punk passou simplesmente a significar as formas de ser um outsider, ou seja, tanto faz se você se fantasia como Johnny Rotten ou se você é apenas um nerd ou alguém que curte ser diferente'', disse Milo Aukerman, do grupo norte-americano Descendents.
Aos poucos, a cultura e a estética punk foi virando coisa de classe média alta, chegando ao mundo fashion, que está revisitando os anos 80. Agora, quem quer ser ``cool'' deve ter pelo menos uma peça considerada punk no guarda-roupa. Camisetas em homenagem a Johnny Rotten, por exemplo, são vendidas em lojas conhecidas e não mais nas galerias alternativas do centro de São Paulo.
Cintos de tachinha viraram uma obrigação para quem segue à risca a moda ditada pelas grandes grifes e não é mais tão raro ver ``patricinhas'' comprando coturnos em lojas de uniformes para o Exército - uma mania freqüente entre os punks brasileiros.
Isso sem falar dos coturnos de marca, que custam até R$ 400 e que passeiam por boates clubbers e festas.
PUNK INSTITUCIONALIZADO
Essa popularização da estética punk é superevidente nos corredores e nas passarelas da Bienal, onde aconteceu o São Paulo Fashion Week de 27 de junho a 3 de julho. Parece que os estilistas pelo jeito às vezes esquecem que os punks de verdade são, na sua maioria, pessoas comuns, cujo traje principal é camiseta e calça jeans, sem grandes pretensões.
Jello Biafra, do Dead Kennedys, pode muito bem ser encontrado na esquina das ruas Haight e Ashbury, em São Francisco, de bermuda skatista, camiseta e tênis. Greg Graffin, do Bad Religion, se apresentou pela última vez em São Paulo com uma camisa verde e uma calça jeans clara. Nem mesmo Johnny Rotten usa aquele visual do final dos anos 70.
Mas não adianta filosofar sobre o tema. O que é ou não ser punk é uma discussão muito mais complexa. O fato é que o ``kit punk'' vai ser visto cada vez mais em uma rua perto de você.
``Jovens estilistas estão usando o punk nas suas coleções, porque eles cresceram vendo o punk na TV e nas revistas. Essa era a principal referência deles e quando você cria moda o seu passado é muito importante'', disse a francesa Sandie Bontout, que fazia parte do grupo de compradores que acompanhou a semana de moda brasileira.
``Não se pode dizer que o punk tem a mesma conotação ou é pop. Acho que é uma reação contra à uniformização ditada por marcas chiques como Prada. É uma espécie de contracultura das passarelas, mas que nas ruas é encarada pelas pessoas como mais um modismo'', contou ela, acrescentando que em Paris o estilo punk já foi incorporado ao dia-a-dia das pessoas.
Sendo assim, só resta aos punks mais radicais sentar e chorar. Porque definitivamente chegou a hora de ver muitos Johnny Rottens desfilando por aí.