Todo mundo quer os games de sempre
Será que a indústria não inova porque a maioria dos jogadores não quer?
Entra ano, sai ano, e continuamos jogando as mesmas coisas.
Pensei nisso depois de publicar a coluna da semana passada, sobre os candidatos ao prêmio máximo do The Game Awards deste ano. Foi esquisito perceber que nenhum título é original: os seis concorrentes são sequências ou remakes de franquias bastante estabelecidas. Aliás, é difícil encontrar uma marca nova entre os indicados das categorias principais (Hi-Fi Rush, Starfield, Lies of P, e o que mais?). Vale lembrar que, em 2022, o grande vencedor foi uma franquia realmente inédita, The Elden Ring.
O fato de a indústria valorizar e premiar as marcas tradicionais indica que a inovação foi um elemento superestimado em 2023. Não apenas as empresas sabem que têm mais chance de se dar bem quando apostam no garantido, como os consumidores preferem investir grana no que já conhecem. Faz sentido, ainda mais se levarmos em conta que o videogame é uma forma de entretenimento das mais custosas.
A real é que o jogador mainstream não pode ser ignorado e sabe bem o que deseja. Conheço muita gente que só compra consoles para jogar as novas versões de FIFA ou Call of Duty a cada ano. E é claro, todos esses também estão aguardando ansiosamente por Grand Theft Auto VI. Esse público mais convencional representa uma enorme parcela dos usuários atuais de consoles e PC.
Olhando assim, dá para concluir que a maioria não está interessada em novidades. Sair da zona de conforto não é a opção favorita, e as produtoras perceberam isso e não querem se arriscar. Tudo leva a crer que a tendência vai continuar nos próximos anos, na medida em que criar games blockbusters do tipo "AAA" se torna um processo cada vez mais caro e demorado.
Existe sim, uma constante busca por novas ideias, mas nada que fuja muito do padrão. Mal jogamos o atual Call of Duty (que ainda tenta se reinventar) e já estamos falando sobre o próximo (que aparentemente irá se passar na Guerra do Golfo). Enquanto isso, sucessos jovens como Fortnite lutam para se manter interessantes, utilizando celebridades (como o rapper Eminem) para manter o apelo com uma massa cada vez mais difícil de ser agradada.
Ao mesmo tempo, para compensar as dificuldades de se criar novas experiências, os estúdios apostam em resgates de clássicos não tão antigos assim, como The Last of Us Part 2, que vai ganhar sua remasterização menos de quatro anos após o lançamento original.
Isso sem contar a obrigação de cumprir prazos e alcançar resultados financeiros rápidos, o que fará a inteligência artificial ser cada vez mais utilizada no desenvolvimento de jogos (o que vai deixando muitos profissionais humanos chateados e sem empregos ao longo desse processo).
A busca pela próxima grande onda se mostra uma tarefa ingrata, e ninguém se arrisca a dizer para onde os videogames estão indo, se é que vão seguir para algum lugar muito diferente do atual. Os pessimistas diriam que a indústria tradicional está estagnada, que tudo já foi inventado e nenhuma novidade interessante é mais possível. Eu estou entre eles, mas, sinceramente, preferiria estar muito errado.
Na superfície, estamos sempre pedindo por novidades e surpresas. Mas no fundo, será que queremos mesmo tanta inovação? Deixo aqui esse questionamento, com a esperança de um futuro diferente, mais ousado, subversivo e criativo. A sobrevivência da indústria dos videogames depende só disso.
*O texto acima faz parte da edição mais recente da newsletter semanal Extra Level, assinada por Pablo Miyazawa. Para assinar gratuitamente e não perder os assuntos mais importantes do mundo dos games e da cultura pop, clique aqui.