Review: Dodge Durango Hellcat é quase um “ônibus” de 720 cavalos
Fomos até o México para dirigir o peculiar Dodge Durango SRT Hellcat, um SUV de seis lugares que chega a 320 km/h e faz 4,1 km/l
O mundo usava máscara N95 até dentro de casa quando a Dodge anunciou o Durango SRT Hellcat – um SUV de seis lugares espaçoso e potente o bastante para fugir de um eventual apocalipse imposto pela pandemia do coronavírus –, há quatro anos.
Os lançamentos ocorriam por vídeo, e assim Tim Kuniskis, então CEO da Dodge, explicou que a versão envenenada do Durango só existiria na linha 2021.
“O Durango agora tem a alma Hellcat, mas quando entrarmos na linha 2022 ele já não existirá mais. Então você só tem uma chance”, pressionou o executivo. Menos de 2 mil unidades eram previstas para a planta da Jefferson Avenue North, em Detroit, Michigan.
Mas, no fim de 2022, a Dodge mudou de ideia e relançou o modelo para a linha 2023, o que enfureceu os primeiros compradores e lhe rendeu um processo de mais de US$ 5 milhões.
E o que deveria ser um carro limitado a um ano de produção acabou se estendendo até a linha 2025, com direito a edição especial. Batizada de Silver Bullet, marca os 20 anos do casamento entre o Durango e os V8 HEMI e o fim definitivo – desta vez de verdade, pois a venerada família de motores com câmaras de combustão hemisféricas está sendo substituída por um V6 híbrido.
Ônibus escolar de 720 cavalos
Referência quando o assunto é Dodge e Chrysler, o colecionador Alexandre Badolato desconhece a presença de algum Durango SRT Hellcat no Brasil. “Vieram alguns outros modelos da gama Hellcat, mas nenhum Durango. No entanto, do jeito que o mercado brasileiro é, se trouxessem o limite de 99 unidades dispensadas de homologação, venderiam tudo”, avalia.
Custando cerca de US$ 100 mil nos EUA, pelas contas de Badolato desembarcaria aqui por aproximadamente R$ 1,1 milhão.
E se não tem no Brasil, o jeito foi aproveitar as férias escolares e ir ao México testá-lo.
Na saída do aeroporto Benito Juárez, aguardando pelo “nosso” Durango Hellcat, o contato sonoro antecede o visual. Nota-se que o carro vem vindo de longe pelo tom peculiar do 6.2 V8 Supercharged, uma mistura do borbulhar típico dos oito-cilindros com o assovio do compressor ao fundo.
Inevitavelmente a primeira missão foi organizar as bagagens no porta-malas, que é basicamente uma caverna acarpetada de 1.226 litros. Com a terceira fileira de bancos erguida ainda são ótimos 487 litros.
No posto de comando, altura do banco e posição do volante são surpreendentemente boas, entregando uma postura realmente esportiva. Nada ruim também as acomodações na segunda fileira, com poltronas individuais, porta-copos e um generoso apoio de braço.
Mas saída de aeroporto é sempre um caos, e não há outra opção senão usar a truculência dimensional e sonora do Durango SRT Hellcat para cavar encaixes no caótico e impiedoso trânsito mexiquense. A cada toque no acelerador, o som de um dogue alemão de mau-humor latindo vai abrindo espaço entre carros, motos, ônibus e caminhões indóceis.
O trânsito vai enfim fluindo, e acomodado naqueles bancos vermelhos, naquela posição que deixa o condutor tanto em modo conforto quanto modo ataque, é inevitável concluir que a ditadura dos painéis digitais poderia acabar, dando mais espaço a velocímetros de verdade, que nesse caso se entusiasmava até os 320 km/h. O único defeito no bem composto e iluminado painel foi o número de consumo, que se recusou a passar dos 4,1 km/l.
O Durango SRT Hellcat é, no fundo, um SUV das antigas. Traços do casamento entre Daimler (dona da Mercedes) e Chrysler (dona da Dodge) se espalham por toda a arquitetura interna desse veículo antes de tudo familiar. Com direito ao famigerado freio de estacionamento por pedal.
Quando o Durango nasceu, as telas, quando haviam, eram menores e mais limitadas; os comandos do ar-condicionado eram o que sempre foram, e não uma barra de plástico iluminada e sensível ao toque (que de sensível não tem nada); preocupavam-se mais com robustez e qualidade e menos com conectividade.
A conexão que interessava era outra, aquela entre motorista e carro. Que o Durango Hellcat entrega, ainda que com cacoetes de carro de 5,1 metros de comprimento por 1,83 m de altura.
Numa estrada sinuosa, a direção é afiada o bastante e dignamente precisa para um carro de 2,5 toneladas. Suspenções independentes e pneus 295/45ZR abraçando rodas de 20 polegadas fizeram excelente trabalho no equilíbrio do carro. Os freios Brembo dão conta do recado.
Convocar todos os 720 cv de potência e 65 kgfm de torque significa transformar um pacato, obeso, espaçoso e confortável veículo familiar instantaneamente em um feroz superesportivo, uma espécie de ônibus escolar satânico que vai de 0 a 100 km/h em menos de quatro segundos. Parabéns também à transmissão TorqueFlite de oito marchas.
Clássico no futuro? “Sim, bastante colecionável. Mas com limitação de ser SUV. Quantos SUVs colecionáveis a gente conhece?”, questiona Badolato. O Durango SRT Hellcat é certamente um deles.