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2% da população no Brasil é de pessoas trans ou não-binárias

Para pesquisadora de levantamento de 2021, porcentagem atual pode ser maior por aumento da autodeclaração e visibilidade do tema

14 jul 2023 - 05h00
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Hoje, 14 de julho, é comemorado o Dia Internacional das Pessoas Não-Binárias
Hoje, 14 de julho, é comemorado o Dia Internacional das Pessoas Não-Binárias
Foto: iStock

Hoje, 14 de julho, celebra-se o Dia Internacional das Pessoas Não-Binárias. Embora a maioria dos países não reconheça a não-binariedade como um gênero legal, o Brasil soma casos isolados de retificação de documentos - alguns via decisão judicial, é importante frisar - com a identidade. O Ministério da Justiça, inclusive, começou a discutir no último mês de maio a possibilidade de adequar formulários da Polícia Federal para emissão de passaporte para pessoas que não se sentem pertencentes ao gênero masculino ou feminino. Essa movimentação vai de encontro aos anseios e necessidades de uma comunidade que não para de ganhar volume e voz. 

Uma pesquisa inédita na América Latina feita em 2021 pela Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (FMB/Unesp) mostrou que 2% da população adulta brasileira é formada por pessoas transgênero ou não-binárias. Em números absolutos, isso significa cerca de 3 milhões de indivíduos. Segundo Maria Cristina Pereira Lima, docente da FMB/Unesp e uma das autoras do artigo com os resultados, a proporção encontrada é parecida a de países como Estados Unidos e Inglaterra, mas ela poderia ser maior hoje em dia.

"Acredito que se a pesquisa fosse feita hoje, haveria um percentual um pouco maior de pessoas que se definiriam como não-binárias", observa Maria Cristina. "Tem havido uma discussão maior sobre o tema e, desse modo, pessoas que até então não identificavam seu desconforto com o gênero binário provavelmente estão se encontrando e compreendendo sua experiência."

Maria Cristina lamenta que não existam dados mundiais sobre a população não-binária. "Infelizmente, ainda há países em que é crime não se identificar como homem ou mulher cisgêneros. Nesses locais, os dados são muito imprecisos. E no Brasil, mesmo com a mortalidade elevada das pessoas trans, principalmente por causas violentas, os números são provavelmente subnotificados", pontua.

Para o levantamento, foram entrevistadas 6 mil pessoas, em 129 cidades, nas cinco regiões do Brasil. Ainda segundo a pesquisa, realizada em parceria com a Universidade de São Paulo (USP) e publicada na revista cientítica "Nature Scientific Reports", o Brasil tem 12% de pessoas pessoas maiores de 18 anos que se declaram LGBTQIA+, o que corresponde a 19 milhões de brasileiros de acordo com dados populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

O estudo mapeou a diversidade sexual e de gênero no país a partir de uma amostra representativa da população brasileira, num processo similar ao que é feito nas pesquisas eleitorais. 

Cerca de 3 milhões de pessoas no Brasil são transgêneros ou não-binárias, conforme estudo
Cerca de 3 milhões de pessoas no Brasil são transgêneros ou não-binárias, conforme estudo
Foto: iStock

Censo não contempla população LGBTQIA+

O levantamento da FMB/Unesp em conjunto com a USP teve como objetivo principal dar visibilidade às pessoas não-binárias para destacar a necessidade da capacitação urgente de médicos das mais diversas especialidades, como ginecologia, e de outros profissionais ligados ao atendimento dessa população.

"Ressalto que todos os campos do conhecimento se beneficiam com estudos que descrevam melhor nossa população e melhor compreendam suas necessidades. A arte, a economia, a antropologia, enfim, a ciência como um todo pode se beneficiar de mais estudos sobre gênero em nosso país", diz Maria Cristina.

Os dados obtidos, no entanto, não suprem a lacuna proporcionada pelo Censo Demográfico 2022, que deixou de fora perguntas sobre identidade de gênero e orientação sexual. Segundo o comunicado oficial do IBGE, não seria possível adotar metodologias e técnicas adequadas "com os cuidados e o respeito que o tema e a sociedade merecem".

Na opinião do ativista Toni Reis, criador da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) e diretor do Grupo Dignidade, é urgente que se faça um mapeamento mais abrangente da população LGBTQIA+ para a criação de políticas públicas focadas, principalmente para pessoas transgênero ou não-binárias.

"Estamos há 20 anos numa discussão com o IBGE para que se inclua identidade de gênero e orientação sexual nos questionários. Sem dados concretos do IBGE, fica muito difícil convencer os tomadores de decisão no Brasil a fazerem algo pela comunidade. A falta de dados nos atrapalha na adoção de políticas públicas específicas e no estudo do acesso da população não-binária aos serviços. Não saber quantas pessoas podem se beneficiar, por exemplo, de tratamentos médicos e psicológicos dificulta o dimensionamento de profissionais a serem contratados", afirma.

Falta de dados oficiais dificulta acesso da população LGBT a políticas públicas, principalmente na área da saúde
Falta de dados oficiais dificulta acesso da população LGBT a políticas públicas, principalmente na área da saúde
Foto: iStock

Pesquisa mundial aponta discriminação

Divulgada recentemente, a pesquisa "Equalities Index 2023" realizada pela Ipsos em 33 países concluiu que quatro em cada dez brasileiros (40%) acreditam que gays, lésbicas e bissexuais pertencem ao grupo que mais sofre discriminação no país. Esta é a primeira edição do estudo, que teve o intuito de medir a percepção da população em relação à igualdade social e deve ser realizado anualmente para medir as mudanças da sociedade.

Em segundo lugar, aparecem as mulheres com 39%, e em seguida as pessoas com deficiência física, com 38%. O Brasil está acima da média global nessas três categorias, que têm 24%, 26% e 33%, respectivamente. A soma dos dados ultrapassa 100% já que os entrevistados puderam indicar mais de uma opção.

Outra categoria de destaque no Brasil são pessoas transgêneros e não-binárias. O país está na segunda posição do ranking global sobre acreditar que pessoas trans ou não-binárias sofrem tratamento desigual/injusto no país, com 30%, ficando apenas atrás da Polônia (35%). Em terceiro lugar estão os Estados Unidos (29%). A média global é de 22%. Para 73% dos brasileiros, é o governo quem deveria assumir a responsabilidade de tentar diminuir a desigualdade no país - o que corrobora a tese de que a coleta de dados populacionais mais concretos é imprescindível.

Fonte: Redação Nós
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