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Anuário de Segurança Pública continua sem dados específicos sobre pessoas com deficiência

Levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública usa informações dos boletins de ocorrência, que não identificam vítimas com deficiência.

18 jul 2024 - 17h07
(atualizado às 17h37)
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Atendimento em Libras na 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência de São Paulo.
Atendimento em Libras na 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência de São Paulo.
Foto: Divulgação / SEDPcD-SP. / Estadão

Dados específicos sobre a violência contra pessoas com deficiência permanecem fora do Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A edição de 2024, produzida pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e divulgada nesta quinta-feira, 18, continua usando informações dos boletins de ocorrência emitidos em todo o País, mas ainda não há padrão nacional para esses documentos e nem espaço no preenchimento dos diferentes modelos em cada Estado para identificar se a vítima tem ou não deficiência auditiva, física, intelectual, múltipla ou visual.

Somente o Atlas da Violência, também feito e publicado pelo FBSP - com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) -, apresenta dados detalhados sobre a população com deficiência porque esse levantamento específico tem base no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), que pertence ao Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes (Viva), atualizado por profissionais de saúde, e os números da população com deficiência projetado para 2022 pela Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), organizada pelo Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE).

Entre as 404 páginas do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024 há somente quatro citações a pessoas com deficiência, mas meramente como grupo mencionado.

"Assim como em anos anteriores, os estupros de vulneráveis seguem representando a maioria das ocorrências, com 76% dos casos. Segundo a legislação brasileira, o estupro de vulnerável tipifica qualquer ato de conjunção carnal ou ato libidinoso com vítimas menores de 14 anos ou incapazes de consentir por qualquer motivo, como deficiência ou enfermidade" (página 162).

"Somados, os registros de estupro e estupro de vulnerável subiram de 78.887 em 2022 para 83.988 em 2023, sendo que 76% desses casos foram de estupro de vulnerável. Não custa relembrar que o estupro de vulnerável se caracteriza não só pela prática de conjunção carnal ou outro tipo de ato libidinoso com menores de 14 anos, mas também com qualquer pessoa que possua enfermidade ou deficiência mental que impeça o consentimento livre para o ato ou, ainda, com alguém que esteja temporariamente em um estado que não possa oferecer resistência" (página 215).

"Internamente, a Nota Técnica nº 17/2020IRPP/DEPEN/MJ7 detalha recomendações para mulheres e grupos específicos no sistema penitenciário. Dentre outras previsões, expressamente tratando da arquitetura prisional, menciona o necessário cuidado com mulheres que estejam acompanhadas de filhos/as, que sejam idosas, grávidas, parturientes, obesas, deficientes físicas, mulheres e homens trans" (página 361).

"Como indicado anteriormente, com a publicação do Levantamento Anual de dados do Sinase 2023, tornou-se possível acessar informações acerca do perfil de adolescentes que cumpriam medida socioeducativa em meio fechado, na data de referência de 30 de junho de 2023. O relatório disponibilizou informações sobre gênero, raça, faixa-etária, matrícula escolar, renda familiar, território de moradia, atribuição do ato infracional, adolescentes com deficiência, adolescentes usuários de CAPS e adolescentes gestantes e/ou com filhos. No momento serão destacados alguns desses indicadores" (página 376).

A inclusão de uma pergunta simples nos boletins de ocorrência, "A vítima é pessoa com deficiência (auditiva, física, intelectual, múltipla ou visual)?", com resposta igualmente simples, "Sim, física (ou auditiva, ou intelectual, ou múltipla, ou visual)", e a exigência dessa informação específica no preenchimento, pode modificar substancialmente o resultado do Anuário Brasileiro de Segurança Pública e de qualquer outro estudo com base em ocorrências policiais.

É uma demanda urgente para dar visibilidade à violência contra gente com deficiência que não chega aos hospitais ou outras unidades de saúde.

É também uma pauta que precisa da atenção de vereadores, deputados estaduais e federais, senadores, prefeitos, governadores e da presidência da República.

Em SP, unidades da delegacia da pessoa com deficiência - ainda poucas, mas essenciais - reúnem informações fundamentais que podem e devem ser analisadas pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, especialmente no que diz respeito a crimes que têm origem na discriminação e no ódio, e se tornam extremamente violentos.

O governo Lula tem ampliado o olhar para as temáticas fundamentais da população com deficiência, relançou o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência - Viver Sem Limite, retomou a Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, instituiu o Sistema Nacional de Cadastro da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (SisTEA), concluiu o relatório final do grupo de trabalho sobre a avaliação biopsicossocial unificada da deficiência, além de assinar o Protocolo de Intenções sobre a Avaliação Biopsicossocial da Deficiência. Diante de tudo isso, devemos entender que o fortalecimento dos direitos passa também pelo acesso a informações básicas, como dados sobre a violência, que servem para estruturar policiais públicas.

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (n° 13.146/2015), que completou nove anos neste mês e carece urgentemente de regulamentação plena, estabelece que acessibilidade é a "possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida" (artigo 3°).

E determina que a discriminação em razão da deficiência é "toda forma de distinção, restrição ou exclusão, por ação ou omissão, que tenha o propósito ou o efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento ou o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais de pessoa com deficiência, incluindo a recusa de adaptações razoáveis e de fornecimento de tecnologias assistivas" (artigo 4°).

Sendo assim, aquele que aplica a punição pela falta de acessibilidade e pela discriminação pode ser punido pelos mesmos crimes. O primeiro passo é registrar o boletim de ocorrência.

Estadão
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