Apresentadora baiana critica vereador após discurso xenofóbico: ‘Nossa cultura é de não deitar para autoritários’
Jéssica Senra rebateu fala preconceituosa do vereador Sandro Fantinel, de Caxias do Sul (RS)
Após discurso xenofóbico do vereador Sandro Fantinel, de Caxias do Sul (RS), a apresentadora de um telejornal da TV Bahia, afiliada da TV Globo, Jéssica Senra, se manifestou criticando a fala do político. O caso ganhou repercussão nesta semana, quando o parlamentar se referiu a trabalhadores resgatados de de vinícolas em Bento Gonçalves como "aquela gente lá de cima" que só "vive na praia tocando tambor".
“A gente até toca tambor, mas não é a nossa única cultura não. A nossa cultura é de não se deitar para autoritários, tiranos, senhores de engenho”, afirmou a âncora do programa Bahia Meio Dia, nesta quarta-feira, 1º.
Ela também resgatou a história do estado, que foi colonizado por imigrantes europeus, que foram subsidiados pelo governo Brasileiro. “Hoje, esse vereador de um estado construído com a força de pobres imigrantes discrimina pessoas humildes em busca de oportunidades de trabalho. Ignorando sua história, se crê superior social e economicamente”, ressalta.
Xenofobia
Durante seu discurso, Jéssica explica que xenofobia é um comportamento que “exclui, discrimina, que difama pessoas com base na percepção de que são estrangeiras à comunidade”. Também pontua que pode estar atrelada a uma ideia de que estrangeiros “representariam prejuízos ao sucesso econômico” de um cidadão ou de um país, “somados a preconceitos e estereótipos que geram esse ódio”.
Ela também parafraseia o escritor mineiro Luiz Ruffato para explicar o termo, e as diferenças entre ignorância e burrice. “A ignorância é a falta de conhecimento sobre um determinado assunto, a burrice é a incapacidade de entender a realidade, por teimosia ou arrogância”, diz.
Discurso preconceituoso e expulsão do partido
O discurso de Fantinel foi dito na tribuna da Câmara Municipal de Caxias do Sul. Ele pediu para que agricultores, produtores, empresas agrícolas não contratassem mais aquela gente lá de cima", mencionando trabalhadores da Bahia, e sugerindo ainda a contratação apenas de trabalhadores vindos da Argentina.
"Todos os agricultores que têm [trabalhadores] argentinos, só batem palma, porque são limpos, trabalhadores, corretos, cumprem horário, mantêm a casa limpa e, no dia de ir embora, ainda agradecem o patrão."
Sem ser interrompido, o vereador passou a fazer ataques de cunho xenofóbico em pleno parlamento. "Agora baianos, cuja única cultura que têm é viver na praia tocando tambor, era normal que desse esse tipo de problema." "Tem que deixar de lado aquele povo acostumado com carnaval e festa", completou ainda.
Após a fala, Fantinel foi expulso do Patriota, partido do qual fazia parte, nesta quarta-feira, 1º.
"O Patriota Nacional, por sua Comissão Executiva Nacional, efetivou a expulsão do vereador na data de hoje, tendo enviado comunicações oficiais desta decisão para o vereador, para a Justiça Eleitoral do município de Caxias do Sul/RS, para a Presidência da Câmara Municipal de Caxias do Sul/RS. A desfiliação foi efetivada na lista interna de filiados do partido, mediante anotação no sistema FILIA/TSE", afirmou o partido em nota enviada ao Terra.
O Patriota ainda destacou que o discurso do político está "maculado por grave desrespeito a princípios e direitos constitucionalmente assegurados, à dignidade humana, à igualdade, ao decoro, à ordem, ao trabalho, já que se referem de forma vil a seres humanos tristemente encontrados em situação degradante". Segundo o partido, a fala dele tornou inconciliável sua permanência nas fileiras do Patriota. "O partido prima pelo respeito às leis, à vida e à equidade", acrescentou.
Investigação
O Ministério Público do Rio Grande do Sul decidiu investigar, em duas frentes a declaração do vereador, sendo uma na esfera criminal e a outra em âmbito civil, para analisar eventual dano coletivo à luz de possível violação de direitos humanos.
O procurador-geral de Justiça, Marcelo Lemos Dornelles, afirmou ao Estadão que o caso foi encaminhado à Promotoria de Justiça Criminal de Caxias do Sul e para a Promotoria de Justiça com atribuição em matéria de Direitos Humanos. Ainda segundo o jornal, o chefe do MP gaúcho, avalia que as declarações 'preconceituosas do vereador, uma pessoa pública em exercício de mandato eletivo, proferidas na sede do Parlamento municipal, atingiu não apenas o povo nordestino, haja vista a ampla repercussão do caso em todo o País'.
Um inquérito policial também foi aberto para apurar as declarações, em tese, pelo crime de racismo. O delegado responsável pelo caso oficiou a Câmara de Caxias do Sul na manhã de quarta, para obtenção do vídeo que registra as falas de Sandro Fantinel.
As gravações foram encaminhadas à Polícia Civil no início da tarde, e pessoas que participaram da sessão ainda serão ouvidas. O vereador só deve ser ouvido na fase final do inquérito, que tem prazo inicial de 30 dias.