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Apropriação cultural: o que é e exemplos

Entender o que é a apropriação cultural e como ela acontece é a melhor maneira de evitá-la no dia a dia

22 set 2023 - 05h00
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Uso da cultura indígena como fantasia é um exemplo de apropriação cultural
Uso da cultura indígena como fantasia é um exemplo de apropriação cultural
Foto: Umkehrer / iStock

Se você já acessou a internet nos últimos tempos, provavelmente teve contato com o termo "apropriação cultural".

Esse termo se refere a uma prática definida pelo antropólogo Rodney William em seu livro “Apropriação Cultural” como um "mecanismo de opressão" usado para "apagar a potência de grupos históricos e sistematicamente inferiorizados".

Mas, o que exatamente isso significa? E por que essa discussão faz parte das pautas populares e dos debates sobre racismo e identidade pelo país e pelo mundo?

O que é apropriação cultural?

Rodney William, antropólogo e doutor em Ciências Sociais, define apropriação cultural como:

"Um mecanismo de opressão por meio do qual um grupo dominante se apodera de uma cultura inferiorizada, esvaziando de significados suas produções, costumes, tradições e demais elementos. É uma estratégia de dominação que visa apagar a potência de grupos histórica e sistematicamente inferiorizados, esvaziando de significados todas as suas produções, como forma de promover seu genocídio simbólico".

Ele ainda completa a definição com a afirmação de que "apropriação cultural e racismo são temas imbricados”.

Então, segundo William, a apropriação cultural é o que acontece quando costumes, tradições e elementos de uma cultura inferiorizada são adotados por outra cultura.

Porém, nesse processo, todo o significado e contexto em que aqueles elementos eram utilizados na cultura original são perdidos — ou seja, esvaziados de significado.

O grupo que se apropria de algo toma para si os costumes de outro, selecionando apenas o que é interessante para ele, sem se interessar em compreender o significado e usos daqueles elementos ou até mesmo entender e aprender com a cultura do outro.

Essa apropriação pode ocorrer com costumes, rituais, símbolos, linguagens e gírias, estética, música e outras formas de manifestação artística, religiosidade, vestimentas e até mesmo em técnicas e conhecimentos de diversas culturas.

Quais são exemplos de apropriação cultural?

Existem diversos casos que podem ser usados como exemplos de apropriação cultural para uma melhor compreensão do tema.

Um dos mais populares — e que também é mais discutido — é o uso de culturas como fantasias em festas como Carnaval ou Dia das Bruxas. Isso acontece quando pessoas decidem, nessas festas, utilizar símbolos culturais de povos que, geralmente, são inferiorizados. O problema é que, ao utilizarem esses símbolos como fantasia, essas pessoas acabam reforçando estereótipos e preconceitos contra os quais os povos que são inferiorizados lutam para combater todos os dias.

Um dos exemplos mais comuns desse caso é o uso de cocares e símbolos ligados a homens e mulheres indígenas como fantasias. São símbolos que, geralmente, se referem à sua cultura religiosa e à hierarquia do povo e que são esvaziados de seus significados ao se transformarem em fantasias para pessoas que não conhecem seus significados ou usos.

Outro exemplo comum de apropriação cultural — e que mostra o quanto esse conceito está interligado aos casos de racismo — é a prática de blackface que surgiu no século XIX e ainda acontece na atualidade.

Nesses casos, atores brancos pintavam seus rostos de preto com carvão para representar pessoas pretas nos palcos. A pintura, que era ofensiva por si só, vinha acompanhada ainda de interpretações estereotipadas de pessoas negras.

O objetivo da prática era arrancar risos do público ao fazer piadas dos supostos trejeitos das pessoas negras, o que ajudou a perpetuar preconceitos e estereótipos que são usados até os dias de hoje para ridicularizar e discriminar a população negra.

Um exemplo que é muito comum no Brasil é o funk. O ritmo, criado nas periferias e favelas brasileiras como uma maneira de manifestação contra as desigualdades sociais existentes nesses lugares, se tornou popular por todo o país e até mesmo foi exportado para outros países, servindo de inspiração para muitos artistas conhecidos mundialmente.

Quanto mais o funk se popularizou, mais o ritmo se afastou de suas origens e passou a ser visto como um ritmo musical que gerava dinheiro para produtores e artistas. O resultado disso é que o ritmo foi esvaziado, perdendo seu simbolismo original e passando a ser usado por artistas que queriam fazer um sucesso e atingir o topo das paradas.

Exemplo disso é que, enquanto diversos artistas sem ligação com o ritmo se aproveitam dele para fazer sucesso, nomes que deram origem ao funk, como a Mc Katia e o Mc Marcinho, voltaram a ser marginalizados e também se tornaram esquecidos tanto pelo mercado da música quanto pelos artistas que se apropriaram do funk.

Quais são os casos famosos de apropriação cultural?

Muitas celebridades, empresas e marcas já foram acusadas de apropriação cultural, se tornando exemplos populares de casos de esvaziamento cultural.

Um dos exemplos mais populares de apropriação cultural é o rock'n'roll. O ritmo musical, que é dominado por pessoas brancas e até mesmo tem como seu rei Elvis Presley, um homem branco estadunidense, na verdade foi criado por pessoas negras.

O ritmo tem origem em cultos e na música gospel que era popular entre a população negra dos anos 30 e 40 e tem como principal precursora Rosetta Tharpe, uma cantora que se tornou popular por ser uma das primeiras a usar a guitarra elétrica — um dos principais símbolos do rock — em suas canções.

A Disney, há alguns anos, recebeu críticas depois de colocar à venda uma fantasia do personagem Maui, um dos protagonistas do filme Moana. Porém, a fantasia possuía referências a divindades polinésias, o que foi considerado apropriação cultural da religiosidade do país.

O mesmo aconteceu quando uma marca de artigos esportivos fez uma campanha baseada no festival Holi, tradicional festa da Índia feita para comemorar a chegada da Primavera. A campanha era protagonizada pelo artista estadunidense Pharrell e recebeu críticas não apenas pela falta de representação indiana, mas também pela marca estar usando um símbolo cultural do país para fazer vendas de sua linha de roupas.

No Brasil, há uma discussão frequente sobre celebridades que escurecem a pele e usam de símbolos da cultura negra, como dreadlocks, para se promover em determinadas épocas, mas voltam a ser brancas quando as convém.

Por que apropriação cultural é um problema?

A apropriação cultural é tema de debates, pois é vista como um problema que traz consequências sérias para as populações que têm culturas que são apropriadas e esvaziadas.

Entre as consequências da apropriação cultural, é possível citar:

  • Elementos culturais retratados de maneira estereotipada, caricata e discriminatória — como é o caso do uso de culturas como fantasias;
  • Esvaziamento de elementos políticos e de resistência de grupos marginalizados — como é o caso da apropriação cultural do funk por artistas que não compreendem suas origens e significados;
  • A perda do valor e do sentido de símbolos históricos;
  • O apagamento histórico de lutas de povos marginalizados;
  • A não identificação de povos com suas próprias culturas;
  • O genocídio cultural que acontece pelo esvaziamento dos símbolos e costumes culturais.

Apropriação cultural é crime?

Apropriação cultural não é crime. Porém, sua prática está diretamente ligada à prática de racismo e discriminação contra povos marginalizados e perseguidos.

Por isso, apesar de não ser um crime, é preciso evitar a prática, já que ela incentiva a perpetuação de diversas formas de racismo, como o racismo estrutural, e do preconceito contra minorias.

Como identificar um caso de apropriação cultural?

Além dos casos que são facilmente reconhecidos, como o uso de outras culturas como fantasias, a prática de blackface e até mesmo o uso de roupas e penteados característicos de alguns povos, identificar casos de apropriação cultural exige muita observação. Isso porque nem todos são óbvios e, por isso, são difíceis de serem identificados.

Por isso, é preciso se informar e entender exatamente o que significa esse conceito para entender as formas como essa apropriação se manifesta. Um exemplo comum é o uso de algum símbolo cultural de outro povo como forma de deboche ou de maneira caricata e estereotipada.

Como evitar a apropriação cultural?

É possível admirar culturas sem cometer apropriação cultural: é a apreciação cultural, que acontece quando pessoas buscam entender e estudar mais sobre símbolos, roupas, comidas, linguagens e tudo relacionado à cultura alheia antes de utilizá-los. 

Ou seja, a melhor maneira de evitar a apropriação cultural é procurando saber mais e entender outras culturas. Se informar é sempre a chave para evitar preconceitos e discriminações e isso não seria diferente nesse caso.

No NÓS, editoria do Terra focada em Inclusão, você pode encontrar mais artigos para se informar sobre diversas culturas. Leia mais agora mesmo!

O que é apropriação cultural? O que é apropriação cultural?

Fonte: Redação Nós
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