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Atakarejo: envolvida nas mortes de tio e sobrinho, empresa revistava funcionários para evitar furtos

Ex-funcionários relatam que, ao final do expediente, tinham que mostrar pertences pessoais para comprovar que não levavam produtos do supermercado; a prática, confirmada pela empresa, foi proibida em 2016 após decisão judicial

28 abr 2022 - 07h19
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Ilustração mostra mãos de uma pessoa negra que segura uma mochila enquando um segurança branco olha para os objetos
Ilustração mostra mãos de uma pessoa negra que segura uma mochila enquando um segurança branco olha para os objetos
Foto: Ilustração/Alma Preta Jornalismo / Alma Preta

A rede de supermercados Atakarejo, que teve o seu nome envolvido nas mortes de Bruno e Yan, tio e sobrinho acusados de furto de carne e entregues ao tráfico por funcionários do mercado, adotava a prática de revistar funcionários como forma de evitar furtos.

Em 2016, a Justiça do Trabalho concedeu uma liminar para proibir a prática na unidade do Atakarejo no bairro de Brotas, em Salvador.

A determinação se deu após o procurador do Ministério Público do Trabalho na Bahia (MPT-BA), Pedro Lino, identificar uma ação em que uma ex-funcionária relatava a existência da revista de funcionários, prática considerada ilegal na legislação trabalhista brasileira, segundo argumento do procurador. No processo, a empresa confirmou a prática, no entanto, defendeu que não se trata de uma prática ilegal, apenas uma ação "preventiva".

Ao levantar o histórico de reclamações trabalhistas contra a empresa, o procurador encontrou outras ações que confirmaram a prática contra outros funcionários.

Mesmo com a liminar, o MPT-BA solicitou uma indenização por danos morais coletivos de R$300 mil. O processo ainda está aberto e atualmente tramita no Tribunal Superior do Trabalho (TST).

A ação do MPT-BA, a que a reportagem teve acesso, cita reclamações trabalhistas anteriores movidas por ex-funcionários que atuavam em diferentes unidades do Atakarejo em Salvador e Região Metropolitana da cidade.

De acordo com relatos, a prática acontecia no momento da saída do expediente, quando os funcionários eram submetidos a retirar pertences pessoais/íntimos e mostrar ao setor responsável, e, em alguns casos, abriam a mochila/bolsa para a vistoria.

Uma das reclamações, movida em 2014 por uma funcionária negra, cita que a prática era humilhante já que ela tinha que colocar sobre uma mesa pertences para serem verificados pelos seguranças do Atakarejo. Na ação, a revista é classificada também "desnecessária" já que a empresa contava com câmeras de filmagem e, mesmo assim, a revista era feita na frente dos outros funcionários, com exposição de objetos pessoais íntimos.

A ação também cita que a funcionária era tratada como uma "'ladra em potencial', sem que jamais fizesse por merecer qualquer desconfiança da Reclamada".

Outra reclamação trabalhista, de 2014, confirma que a vistoria pessoal dos funcionários era feita de forma diária. Na ação, o ex-funcionário, também negro, diz que:

"Durante todo o vínculo empregatício precisava passar por revista apenas no término do expediente, abrindo a mochila e retirando todos os pertences para apresentar ao vigilante, na portaria de acesso dos empregados, fornecedores e promotores; o próprio depoente era quem retirava os pertences da mochila; todos os empregados, independentemente do cargo, bem como os promotores, eram submetidos à referida revista", cita o ex-funcionário no processo.

Em 2013, uma ex-funcionária, que atuou no Atakarejo como auxiliar de serviços gerais, também alegou que era submetida à revista pessoal, inclusive na frente de clientes da loja.

"[...] a revista que era feita à depoente era realizada num caixa que estivesse inativo, sendo que no momento ainda havia clientes sendo atendidos em outros caixas", diz a ex-funcionária em um trecho da reclamação trabalhista.

Na ação, movida pelo MPT-BA, uma testemunha, que trabalhou no Atakarejo no período de 2015 a 2016, disse que os funcionários tinham que apresentar nota fiscal caso um produto que eles tivessem na bolsa fosse semelhante a algum produto da loja.

"[...] a depoente botava sua bolsa em cima do balcão, o Prevenção olhava e, se tivesse algum produto semelhante aos vendidos na empresa, como pasta de dente, era necessário mostrar a nota fiscal", cita.

Com base nas provas colhidas, o órgão considera a vistoria "invasiva" e que fere a presunção de inocência, "obrigando os empregados a comprovarem sua inocência ao fim de cada dia de trabalho".

"Trata-se de uma prática bastante invasiva, expondo o trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, com uma suspeita ou imputação de conduta criminosa, ferindo frontalmente o princípio da presunção de inocência", pontua o MPT-BA.

No processo, a defesa do Atakarejo diz que a empresa cumpriu com a liminar da Justiça do Trabalho e deixou de adotar a prática em 2016. Conforme a defesa, as revistas aconteciam apenas nos pertences dos funcionários, como bolsas, sacolas e mochilas e a vistoria era feita sem contato físico, "[...] feitas dentro dos parâmetros legais".

Ainda segundo a defesa, as vistorias não eram obrigatórias e os funcionários que negavam passar pelo procedimento não eram punidos.

"Dessa forma, a proteção da propriedade, principalmente em empresas varejistas que possuem maior vulnerabilidade à ocorrência de furtos dos seus bens, como a Recorrida, abre espaço para o exercício da revista pessoal como medida protetiva ao exercício regular do seu direito, amparado no exercício do seu poder diretivo como empregador", cita um dos trechos da defesa.

Sobre o pedido de indenização do MPT-BA, o Atakarejo refuta que a revista era íntima mas, sim, de vistoria pessoal.

"[...] vale dizer que restou claro que a Recorrente, em nenhum momento, realizou revista íntima em seus empregados, mas, sim, revista pessoal de pertences, feita de forma visual, generalizada, respeitosa e de forma moderada, não havendo razão para ser condenada ao pagamento de indenização por danos morais", defende.

Posicionamento Atakarejo

Diante do caso, a Alma Preta Jornalismo entrou em contato com o Atakarejo e perguntou como ocorria a revista dos funcionários da empresa e quais são as medidas adotadas atualmente. Também questionamos o motivo da empresa alegar que a prática se tratava de ação "preventiva" e questionamos quais têm sido os argumentos defendidos pela empresa durante o processo, porém, não obtivemos retorno até o fechamento da matéria.

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Alma Preta
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