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Boris Johnson sabia? Como governo mudou versões sobre denúncias de abusos sexuais

Primeiro-ministro confirmou que tinha conhecimento de acusações contra político ao nomeá-lo para cargo importante no Partido Conservador

6 jul 2022 - 06h35
(atualizado às 08h55)
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O parlamentar conservador Chris Pincher, alvo de denúncias de abuso sexual
O parlamentar conservador Chris Pincher, alvo de denúncias de abuso sexual
Foto: PA Media / BBC News Brasil

O premiê britânico, Boris Johnson, enfrenta mais uma crise política no seu governo após mudar as versões sobre o conhecimento de denúncias de abuso sexual contra um político nomeado para um cargo importante no Partido Conservador.

Nesta terça-feira (05/07), o ministro da Saúde, Sajid Javid, e o das Finanças, Rishi Sunak, renunciaram aos seus cargos.

Johnson escolheu o parlamentar conservador Chris Pincher em 2019 como "deputy chief whip", vice do posto que, no sistema político britânico, tem como atribuição garantir que parlamentares do partido no poder votem conforme a orientação das lideranças.

Pincher deixou o cargo no último dia 30 de junho, após relatos de que apalpou dois homens em um clube em 2019. Ao anunciar sua saída do posto, afirmou que havia "bebido muito" e "constrangido a mim e outras pessoas".

Ele já havia enfrentado outras acusações de abuso sexual, vindas de integrantes de seu partido.

Após o anúncio da demissão, o governo e uma série de ministros inicialmente negaram que Johnson estivesse ciente de acusações específicas contra o colega de partido antes de nomeá-lo para a posição.

Mas o ex-diplomata Lord McDonald acusou o governo de faltar com a verdade e afirmou que o primeiro-ministro foi comunicado "pessoalmente" sobre uma "queixa formal" a respeito do comportamento de Pincher em 2019 - na época o parlamentar ocupava um cargo no Ministério das Relações Exteriores.

O governo agora diz que o primeiro-ministro foi de fato informado em 2019, mas não conseguiu "lembrar disso" quando novas denúncias surgiram na semana passada. Johnson confirmou a informação de seu gabinete e declarou que "lamenta amargamente" não ter agido com base no que sabia.

30 de junho

Uma reportagem sobre as denúncias de abuso sexual é publicada no tabloide The Sun. Pincher renuncia.

O premiê Boris Johnson
O premiê Boris Johnson
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

1º de julho

O porta-voz do governo declara que o primeiro-ministro não estava ciente das denúncias contra Pincher antes de nomeá-lo para o posto no Partido Conservador.

Na mesma ocasião, afirma algo ligeiramente diferente: que Johnson não tinha conhecimento de "acusações específicas" contra o parlamentar.

Foi também informado que todas as nomeações ministeriais são analisadas pela equipe de Propriedade e Ética do governo, e a conclusão à época foi de que não havia base para suspender a indicação "com base em denúncias infundadas".

Na noite do mesmo dia, Pincher recebe uma suspensão como parlamentar do Partido Conservador.

3 de julho

A secretária de Trabalho e Previdência, Therese Coffey, é questionada na BBC se o primeiro-ministro sabia de "denúncias de abuso sexual contra Chris Pincher" quando o nomeou para o posto de "deputy chief whip".

"Até onde eu entendi, o primeiro-ministro não tinha conhecimento de denúncias específicas contra Chris Pincher", disse Coffey.

Questionada sobre como obteve essa informação, Coffey respondeu que veio de "alguém da assessoria de comunicação do governo".

Will Quince, o ministro para Crianças e Famílias, também disse que o premiê não estava ciente das acusações
Will Quince, o ministro para Crianças e Famílias, também disse que o premiê não estava ciente das acusações
Foto: PA Media / BBC News Brasil

4 de julho

No dia seguinte, Will Quince, ministro para Crianças e Famílias, participou do programa Today da BBC e também foi questionado sobre o conhecimento das acusações contra Pincher por parte de Boris Johnson.

"Eu esperava que você fizesse essa pergunta. Tanto na noite passada quanto nesta manhã, pedi clara e firmemente ao gabinete por respostas sobre isso e recebi uma garantia categórica de que o primeiro-ministro não estava ciente de nenhuma acusação específica ou queixa contra Pincher no momento em que ele foi nomeado."

O secretário de Educação, Nadhim Zahawi
O secretário de Educação, Nadhim Zahawi
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Mais tarde, em uma entrevista gravada na TV pouco antes das 11h30, o secretário de Educação, Nadhim Zahawi, disse que as acusações contra Chris Pincher "foram investigadas" e "a conclusão foi de que não eram corretas".

Ele reforçou que Johnson não sabia de denúncias específicas.

Às 12h30, o governo havia mudado de discurso. O porta-voz disse que Johnson tomou conhecimento de que as denúncias "não evoluíram para uma queixa formal", acrescentando que "não foi considerado apropriado suspender uma nomeação simplesmente por causa de denúncias infundadas".

Naquela noite, a correspondente política da BBC Ione Wells revelou que Boris Johnson havia sido informado de uma queixa formal sobre o "comportamento impróprio" de Chris Pincher quando ele fazia parte do Ministério das Relações Exteriores entre 2019 a 2020.

A queixa se tornou um processo disciplinar que confirmou irregularidades em sua conduta.

5 de julho

Lord McDonald publica uma carta no Twitter escrita ao comitê de ética do Parlamento britânico. A carta dizia: "O primeiro discurso do governo não é verdadeiro e o modificado ainda não é exato".

Ele também apareceu no programa Today para dizer que integrantes do Ministério das Relações Exteriores disseram em 2019 que Pincher havia se comportado de forma inadequada, que uma queixa havia sido registrada e que Pincher havia se desculpado.

"Eu informei um alto funcionário no governo", disse Lord McDonald. "Eu sei que esse alto funcionário informou o primeiro-ministro pessoalmente porque esse funcionário me disse isso na época."

O secretário de Relações Exteriores na época da denúncia, Dominic Raab
O secretário de Relações Exteriores na época da denúncia, Dominic Raab
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Dominic Raab, que era secretário de Relações Exteriores na época da denúncia, também apareceu no programa, após a publicação da carta.

Ele disse que não tinha conhecimento de que o primeiro-ministro havia sido informado das denúncias.

"Isso é novidade para mim - eu não sabia disso - e não está claro para mim se é exatamente isso", disse.

Mais tarde, no Parlamento, Michael Ellis, outro integrante do governo britânico, confirmou que o primeiro-ministro havia sido de fato informado das denúncias, embora não tenha usado a frase "queixa formal". Ellis declarou que "funcionários apontaram fontes de preocupação".

"Na semana passada, quando surgiram novas acusações, o primeiro-ministro não se lembrou imediatamente da conversa no final de 2019 sobre esse incidente", disse ele aos parlamentares.

O porta-voz oficial do governo afirmou que Johnson inicialmente "não conseguia se lembrar" do briefing, que teria sido na forma de uma conversa, e que precisou de um tempo "para estabelecer os detalhes exatos".

Questionado sobre quando o governo decidiu que a informação veiculada na semana passada não estava correta, Ellis disse que isso ocorreu "no final do domingo ou no início da segunda-feira".

Em uma entrevista à BBC, o primeiro-ministro disse: "Houve uma queixa mencionada especificamente para mim... foi há muito tempo e foi dito para mim em uma conversa... mas isso não é desculpa, eu deveria ter feito algo sobre isso".

Johnson negou ter mentido para sua equipe sobre o briefing e acrescentou: "Estou farto de pessoas dizendo coisas em meu nome ou tentando falar sobre o que eu sabia ou não sabia".

- Texto originalmente publicado em https://www.bbc.com/portuguese/internacional-62059601

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