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Cabelo como arte e resistência; conheça a história de Jacy Carvalho

Mais do que descobrir a beleza do crespo, ela fez de seu cabelo uma obra de arte - e uma expressão de autoestima

7 mai 2022 - 05h10
(atualizado às 14h18)
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"Na adolescência não existia isso de aceitar o meu cabelo, sabe? Era mais sobre como eu podia escondê-lo das formas mais dolorosas possíveis, sem exagero", recorda a artista e criadora de conteúdo Jacy Carvalho.

Depois de 13 anos se submetendo aos mais diversos tipos de tratamentos químicos para o cabelo, sofrendo com a dor causada pelos produtos, falhas no couro cabeludo e queda capilar, ela decidiu que era hora de dar um basta em tantos procedimentos. Mais do que isso: Jacy decidiu enaltecer a potência do cabelo crespo e transformá-lo em obras de arte com o projeto online Esculturas Crespas.

"Para que eu vou ficar tentando me encaixar em algo em que eu não me encaixo? Como diz minha mãe, eu faço arte desde 1989 e vou continuar fazendo por muito tempo."

'A estética é uma porta inicial para a gente se conhecer e começar a se respeitar’, diz Jacy, autora do projeto Esculturas Crespas
'A estética é uma porta inicial para a gente se conhecer e começar a se respeitar’, diz Jacy, autora do projeto Esculturas Crespas
Foto: Reprodução/Instagram

"Quando eu vejo o cabelo crespo, vejo uma expressão artística", diz a criadora de conteúdo Jacy Carvalho, de 32 anos. Mas nem sempre foi assim. Fundadora do projeto online Esculturas Crespas, no qual transforma o cabelo em obras de arte, ela conta que foi uma longa trajetória até descobrir que poderia exaltar a própria beleza - e influenciar a autoestima de outras mulheres - por meio de seus fios.

Segundo Jacy, aos 9 anos ela já fazia relaxamento nos cabelos. Filha de cabeleireira, os produtos eram de fácil acesso para ela e as irmãs. Para ter os fios mais lisos, os produtos faziam o couro cabeludo arder. "A gente aguentava um tipo de tortura, sabe? Falava que queria tirar e as pessoas diziam: 'Tem de arder para funcionar'. Hoje, olhando para toda a estrutura, eu sei como isso funciona, mas na época só suportava aquilo porque era a forma que eu poderia ser mais aceita nos lugares", diz.

Na época, ela via aquilo como uma espécie de ritual, uma proteção ancestral. Sua mãe repetia em Jacy o que foi feito desde sempre com o próprio cabelo, como uma preservação. "É uma forma de se embranquecer para passar menos violência do que poderia passar se a gente estivesse com um dread, um afro. O cabelo impecável tinha de ser de acordo com o que a branquitude pede: liso, esticado e tudo mais", afirma.

Jacy era uma das únicas negras em sua escola e, por isso, se comparava constantemente com as colegas brancas. "Era bem complicado, porque eu queria me encaixar em um grupo de pessoas que não eram iguais a mim, com cor de pele, formas de expressão e cabelos bem diferentes."

As diversas escovas de chocolate, progressivas e cremes relaxantes com hidróxido de sódio, tioglicolato e tantas outras substâncias fizeram com que Jacy tivesse um corte químico aos 13 anos. Ou seja: uma quebra severa dos fios, que acontece como consequência do excesso de procedimentos capilares químicos. As constantes quedas de cabelos fizeram com que ela criasse estratégias para disfarçar as falhas no couro cabeludo. "Aprendi a prender o cabelo de um jeito que escondia a falha até ele crescer de novo. E foi numa dessas que aprendi a colocar trança", lembra ela.

O penteado feito com linha, lã, kanekalon ou "miojinho" (material sintético que imita fios de cabelo) foi o modo que Jacy encontrou para começar a gostar do cabelo natural e esconder as agressões químicas. "Eu colocava onde estava mais curtinho, com toda a paciência do mundo. E nunca mais parei."

INSPIRAÇÃO

Sua crescente habilidade com acessórios levou Jacy a falar sobre o assunto na internet. Em 2015, ela criou um canal no YouTube para ensinar outras mulheres a fazer tranças e lidarem com a transição capilar. Os vídeos iam bem, mas em 2020, ela decidiu deixar os tutoriais de penteados do dia a dia para apresentar algo um pouco mais ousado no Instagram. "Eu tinha visto um show da Solange (Knowles), irmã da Beyoncé, e percebi a beleza do cabelo crespo com o penteado que ela usava. Então decidi fazer algo diferente no cabelo, mais artístico, e publiquei", recorda.

A foto, na qual seu cabelo ganhava um trançado circular por trás da cabeça, foi o início do projeto que Jacy chamou de Escultura Crespa, que exalta a beleza e a pluralidade de estilos do cabelo crespo. "Quando vejo o cabelo crespo, vejo uma expressão artística, então eu quero que as pessoas vejam isso também. Tanto pessoas pretas vão se ver naquilo, quanto pessoas brancas vão olhar e admirar."

O resultado foi uma legião de fãs (mais 900 mil com as redes sociais) e um curso sobre técnicas avançadas de tranças. "A estética é uma porta inicial para a gente se conhecer e começar a minimamente se respeitar, porque não existe amor se não tiver respeito. Quando a gente não respeita nossa própria estética, nossos próprios traços, a gente não se ama." Seus seguidores também são impactados com conhecimentos sobre negritude e feminismo. "A partir da estética, a gente apresenta outras possibilidades. Quando elas vêm já estão lendo um livro da Bell Hooks (feminista negra norte-americana)", brinca.

Estadão
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