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Comissão do TSE procura o caminho para igualdade de raça na política

Candidatos negros são sub-representados na política nacional. Além do racismo estrutural, falta de recursos explica parte do problema

13 set 2022 - 05h00
(atualizado em 22/9/2022 às 11h18)
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Na Assembleia Constituinte de 1988, havia 11 negros em 559 deputados
Na Assembleia Constituinte de 1988, havia 11 negros em 559 deputados
Foto: Pamella Moreno sobre Wikicommons

Durante a formulação da Constituição de 1988, a Câmara dos Deputados contava com 559 deputados, sendo 11 deles negros, segundo pesquisa de Thula Rafaela de Oliveira Pires para Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Isso quer dizer que o Brasil, com uma população de maioria negra (54%, segundo o IBGE), teve sua Carta Magna feita por mãos e mentes majoritariamente brancas.

A falta de representatividade política é um dos problemas que a Comissão de Igualdade Racial, criada este ano pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tenta resolver.

De acordo com a portaria que instituiu a comissão, ela tem como principais objetivos planejar ações para fortalecer a capacidade eleitoral da população negra e combater o preconceito no processo eleitoral.

No lançamento, o ministro do TSE e coordenador da iniciativa, Benedito Gonçalves, falou sobre qual será o trabalho da comissão.

“A ideia inicial, além das propostas que estão na comissão, é nós trabalharmos exatamente para o melhor aproveitamento do cidadão e da cidadã negra candidata nos Fundos que existem. E, aliado a isso, propor estratégias de prevenção e punição a práticas ilícitas que desvirtuem a destinação desses recursos a essas candidatura”. Em outras palavras, a chave para a promoção da igualdade racial nas eleições, na visão da Comissão, é o dinheiro – ou melhor, o acesso a financiamento de campanha. 

Em abril deste ano, foi promulgada a emenda constitucional que impõe um repasse obrigatório de, no mínimo, 30% do Fundo Eleitoral para candidatura de negros e mulheres. Ou seja, uma das grandes missões do grupo de trabalho será fiscalizar o cumprimento da medida – que já foi tema de discussão em 2018, com a candidatura de mulheres laranjas.

Nos últimos anos, os números apontam um crescimento da candidatura de pessoas negras. Nas eleições gerais deste ano, o número de candidaturas de pessoas negras (49,57%) superou o número de brancas (48,86%). Esse crescimento maior das candidaturas negras já vinha sendo detectado nas duas eleições anteriores, mas ainda não reflete em uma maioria de pessoas negras eleitas de fato.

Foto: DataWrapper

Para Marina Marçal, advogada e mestra em relações étnico-raciais, o crescimento das candidaturas não é, necessariamente, convertido em votos. E os números comprovam isso.

No entanto, ter uma equidade nos recursos é fundamental para reverter esse quadro.

“O aumento de candidaturas negras e femininas têm sido gradual faz algum tempo, mas ainda não suficiente para ver garantida a representatividade desses grupos no parlamento brasileiro. Um orçamento dedicado para garantir segurança e condições iguais de disputa eleitoral para esses candidatos é o que faz a diferença”, afirmou.

A questão da auto-declaração

Não há uma definição objetiva para definição de raça no Brasil e o que vale é a autodeclaração. Conforme definição do Instituto Brasileiro de Geografia e Estátistica (IBGE), no Brasil, negro é quem se autodeclara preto ou pardo. Sendo assim, a população negra é a soma de cidadãos que se enxergam como pretos ou pardos.

Na política, isso acaba criando um problema real: candidatos brancos que fraudam o mecanismo.

Segundo levantamento do g1, entre as eleições municipais de 2016 e 2020, 25.911 candidatos mudaram a raça na declaração ao TSE, sendo 40% passando de branco para negro. Mas vale destacar que nem toda mudança configura fraude.

“Um orçamento dedicado para garantir segurança e condições iguais de disputa eleitoral para esses candidatos é o que faz a diferença. Não à toa que os poucos casos de candidatos brancos tentando fraudar o mecanismo, forjando uma nova heteroidentificação como pretos, têm interesse único em orçamento de campanha para viabilizar suas candidaturas, mas não representa de forma nenhuma a forma que esses fraudadores vêm votando no parlamento: contra os projetos de lei benéficos para as populações negras”, destaca Marina.

Em um país miscigenado, a identificação com uma raça não é algo claro e evidente. O Brasil enfrenta, historicamente, uma defasagem de letramento racial e uma constante discussão sobre o que é ser negro em um dos últimos países a se livrarem da escravidão.

Durante audiência para discutir a promoção da igualdade racial no processo eleitoral em maio deste ano, a advogada Bianca Maria Gonçalves, integrante do LiderA, observatório eleitoral do Instituto Brasileiro de Ensino Desenvolvimento e Pesquisa, destacou propostas implantadas em processos universitários e no serviço público para prevenção de fraudes.

“Tomando por parâmetro as ações afirmativas implementadas no âmbito de ingresso em faculdades e concursos públicos, temos diversas impugnações por falta de fenótipo [...] Essa situação pode ser aplicada à seara eleitoral, revelando que a autodeclaração pode não ser suficiente, e a banca de heteroidentificação é uma opção a ser considerada”, explicou.

Ou seja, a comissão tem uma grande missão: fazer com que os recursos financeiros a pessoas negras realmente sejam destinados a esse público, diante das limitações de identificação racial já tradicionais no Brasil. Caso a medida seja efetiva, espera-se que mais candidatos negros sejam eleitos, aumentando a representatividade no Congresso e a forma com que as leis são feitas.

Fonte: Redação Nós
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