Entenda de vez o que é transfobia recreativa
Termo tem ganhado cada vez mais destaque por abordar o viés do preconceito como entretenimento
A atriz Renata Carvalho vem com frequência usando o título transpóloga, uma junção dos termos trans e antropóloga, por conta do seu extenso trabalho de pesquisa sobre vivências e corpos como o seu e por sua formação em Ciência Sociais. Em suas pesquisas, ao se deparar com o conceito de "Racismo Recreativo", explanado no livro de mesmo nome do jurista Adilson Moreira, entendeu que o mesmo acontece com corpos transgêneros. Foi dessa percepção que surgiu o termo "transfobia recreativa", publicado pela primeira vez no "Dossiê dos Assassinatos e da Violência contra Pessoas Trans" de 2020, realizado pela ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais).
Ela explica: "Transfobia recreativa é quando utilizamos do humor como ferramenta para satirizar, depreciar e/ou ridicularizar corpos, vivências e identidades de pessoas trans e travestis". Renata complementa ainda que se trata de um "mecanismo que encobre a hostilidade e o preconceito por meio do humor reproduzindo estereótipos viciados cheios de conteúdo transfóbico".
Renata aponta que a transfobia recreativa acontece tanto nos programas humorísticos quanto nas piadinhas cotidianas. Um bom exemplo é a Valéria do extinto "Zorra Total, da Rede Globo, interpretado por Rodrigo Sant'Anna. "O humor transfóbico tem papel importante na perpetuação da transfobia enquanto sistema de opressão, fazendo uma associação perigosa da travestilidade/transexualidade com algo negativo, risível, falso, patológico, sexual, criminal, com moralidade inferior e/ou ausência de humanidade", afirma a atriz. Seu mais recente espetáculo, "Manifesto Antropofágico", traz um panorama da comunidade trans mesclado com a história de sua vida.
Renata conta que a maior parte da população trans/travesti afirma ter sido alvo de piadas de cunho transfóbico ou transformadas em motivo de riso em algum ambiente em que já esteve ou passou. "Muitas vezes, são 'chamadas' pelo nome de algum personagem cômico estereotipado de programas humorísticos e novelas. A sociedade foi ensinada a rir dos corpos trans/travestis. Essas piadas, esses estereótipos transfóbicos, são facilmente transformados em xingamentos e agressões físicas", pontua.
Para combater a Transfobia Recreativa, a transpóloga indica que devemos parar de rir da existência do outro, do corpo do outro e da vida do outro. "Devemos rever nosso riso, nossas piadas depreciativas e estereotipadas. Precisamos refletir eticamente sobre o nosso humor e o e nos responsabilizar pela reprodução de piadas cheias de conteúdo transfóbico. Transfobia é crime e reproduzi-lo também", indica.