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'Estou parando de usar ouro'; campanha levanta debate sobre efeito do garimpo ilegal para indígenas

Instituto Alana chama atenção para as consequências do consumo do minério

16 fev 2023 - 08h44
(atualizado às 10h16)
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A cena é de 2020, da série Aruanas, da Globoplay, mas foi parar agora numa campanha do Instituto Alana, viralizou e levantou um debate. No vídeo, a personagem da atriz Débora Falabella, uma jornalista, diz: "Estou parando de usar ouro a partir de hoje, porque a minha riqueza é de outra ordem". Na sequência, imagens de uma reportagem sobre a tragédia Yanomami, na Amazônia, e, então, ela tira suas joias.

A campanha do instituto sobre consumo consciente não começou agora, mas ganhou novos contornos a partir da crise sanitária do povo Yanomami, afirma o presidente do Alana, Pedro Hartung. "A campanha não é só esse vídeo, mas questiona as consequências do consumo do ouro e a certificação", diz. "É quase impossível rastrear o ouro no Brasil."

Uma das consequências do consumo, defende a campanha, é o garimpo ilegal. Em janeiro, o governo federal declarou emergência em saúde pública no território indígena após identificar uma alta de casos de malária, desnutrição infantil e problemas de abastecimento.

As imagens de indígenas magros e abatidos, entre eles várias crianças, chamaram a atenção nas redes sociais para a tragédia humanitária, reflexo de problemas de assistência e avanço do garimpo ilegal na região.

A série, inicialmente lançada no canal de streaming, foi produzida pela Maria Farinha Filmes, é o que se chama de entretenimento de impacto, pois leva ao público uma discussão social relevante. "Temos dados que mostram que a série conseguiu furar a bolha e levar esse debate a pessoas que não estavam familiarizadas com o tema", diz Hartung.

A primeira temporada, que abordou o garimpo ilegal na Amazônia, foi assistida por 34,9 milhões pessoas. De acordo com dados recolhidos pelo instituto, 91% da audiência que assistiu a série se sentiu solidária e teve vontade de se engajar à luta das personagens ativistas.

A campanha parte do mesmo princípio para abordar a questão sobre o consumo de ouro.

"Isso mostra a força do entretenimento", afirma Hartung. "E isso sempre foi o objetivo dos ativistas, ampliar o debate."

Nota fiscal eletrônica

Representante das empresas do setor, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) afirma que a situação do povo Yanomami é uma das consequências diretas das ações praticadas há muitos anos por quadrilhas de criminosos organizados na Amazônia. "Entre os quais, os que se autointitulam 'garimpeiros' (atividade regulamentada em lei), mas que, na realidade, praticam o garimpo ilegal."

Segundo o Ibram, o instituto tem ações contra a ilegalidade, como os pedidos à Receita Federal para que institua notas fiscais eletrônicas nas transações com ouro do garimpo. A legislação admite o uso de notas fiscais em papel, manuscritas e, por vezes, "até mesmo produzidas em papel comum", diz em nota.

Na avaliação do Ibram, será decisivo para conter o garimpo ilegal fechar seu acesso aos mercados. "E isso só acontecerá se o Brasil conseguir produzir ouro sempre de forma legal. É uma ação que depende de um eficiente sistema de rastreamento e ele começa a partir da emissão da nota fiscal eletrônica e passa pela equalização de impostos e taxas cobradas sobre o ouro. No Brasil, o ouro tem duas classificações: 'ativo financeiro' e 'mercadoria'. Como apresentam diferenças expressivas em termos de carga tributária, há espaço para operações de lavagem, conforme já denunciado às autoridades", afirma o instituto.

Questionado sobre a campanha do Alana, o Ibram não se manifestou.

Ações da PF

Nesta semana, a Polícia Federal pôs nas ruas duas operações contra o garimpo ilegal. Na terça-feira, a PF desencadeou a Avis Aurea em Roraima, contra a retirada de ouro da Terra Indígena Yanomami.

Nesta quarta-feira, a Operação Sisaque focou na organização criminosa que usava empresas de fachada para "esquentar" o ouro ilegal. De 2020 a 2022, o esquema movimentou 13 toneladas de ouro avaliadas em R$ 4 bilhões, segundo as investigações.

Muitos garimpeiros começaram a deixar a área logo após o governo federal anunciar que a retirada dos não indígenas da reserva yanomami é uma prioridade
Muitos garimpeiros começaram a deixar a área logo após o governo federal anunciar que a retirada dos não indígenas da reserva yanomami é uma prioridade
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Estadão
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