"Eu não ando, mas posso voar", diz ativista PcD Andrea Schwarz
Conheça a paulistana cadeirante de 47 anos que já empregou mais de 20 mil pessoas com deficiência no Brasil e é inspiração nas redes sociais
Com mais de 800 mil seguidores nas redes sociais, Andrea Schwarz é, hoje, uma das vozes mais potentes do Brasil em prol dos direitos das pessoas com deficiência e tem uma trajetória que merece ser celebrada hoje, Dia Nacional da Pessoa com Deficiência Física. Mais do que uma ativista social de sucesso, Andrea é uma empreendedora social renomada que não faz muita de rótulos ou títulos. "Sou uma mulher única, com minhas particularidades, e prefiro não colocar a mim mesma, nem a ninguém, em caixinhas", diz.
Multifacetada, de fato, Andrea é mesmo. E surpreendente, conforme provou a bela (e disruptiva, nas palavras dela) campanha de Dia dos Namorados que fez ao lado do marido, Jaques Haber, para a marca de roupas Reserva - com direito à participação especial de sua inseparável cadeira de rodas.
"Acho importante que as mulheres com deficiência que me seguem tenham referências positivas, pois isso impacta diretamente na autoestima delas. As imagens ajudam a provar que PcDS também namoram, se apaixonam e podem, sim, ser muito sensuais", celebra.
A beleza e a intimidade do ensaio deixam transparecer uma intimidade de décadas e uma relação que tem muita história para contar. No final de 1997, logo no comecinho do namoro, o casal decidiu fazer um "mochilão" para a Europa. "Foi a nossa primeira viagem juntos e a última antes da cadeira, pois no ano seguinte me tornei cadeirante. Minha vida mudou por completo. Ainda no hospital, o Jaques me disse: 'para mim não importa se você está de pé, sentada ou deitada, meu amor por você continua o mesmo. Nosso amor permaneceu e permanece até hoje", conta a paulistana de 47 anos.
Xô, capacitismo; olá, salto alto!
Em setembro de 1998, quando passava um temporada em Santos (SP) com o então namorado, Andrea sentiu uma espécie de fraqueza nas pernas, caiu e não conseguiu mais se levantar. Após um mês internada, recebeu o diagnóstico de que tinha cavernoma intramedular, uma lesão benigna que apresenta risco de piora e pode levar a sangramentos. Ela chegou a ser operada, mas ficou paraplégica por causa de uma lesão medular relacionada ao andamento da doença e da própria cirurgia.
"Tive um momento de depressão, mas não deixei que aquilo se prolongasse. Sofri, mas reagi. Considero que ficar paraplégica não foi um ponto final da minha história. A cadeira de rodas é uma espécie de vírgula. Ser cadeirante faz parte da minha identidade, mas não me define. Aliás, costumo dizer que eu deixei de andar, mas aprendi a voar", pontua.
Jaques e Andrea se casaram e são pais de dois adolescentes: Leonardo, de 14 anos, e Guilherme, de 17. Mesmo sendo desmotivada por profissionais, ela engravidou naturalmente duas vezes e sem contratempos. O casal ama viajar e já percorreram mais de 40 países.
Ela já não se importa com os comentários - alguns sutis, outros nem tanto - em apoio ao fato de Jaques ter permanecido ao seu lado e ter escolhido se casar com ela "apesar", como muita gente ainda pensa, de sua paraplegia. "É comum se aproximar alguém e interagir somente com o Jaques, mesmo quando a pergunta é direcionada a mim, como se eu fosse totalmente incapaz e estivessse sob a responsabilidade dele", relata.
"Vocês me veem da forma que eu me vejo?", costuma questionar Andrea em seus posts. Com segurança e autoconfiança, ela desafia o capacitismo dia a dia a bordo não só da cadeira de rodas como muito bem acompanhada de sapatos de salto altíssimos, que adora e são sua marca registrada. "E daí que eu não ando? Eu gosto de me sentir bonita, isso me faz bem!", avisa ela, que também adora moda e maquiagem.
Inclusão e ocupação de espaços
Em 1999, ao lado de Jaques, ainda na época de namoro, Andrea Schwarz fundou a iigual, consultoria especializada na inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Em quase duas décadas, a empresa já ajudou mais de 20 mil pessoas a serem contratadas em mil empresas.
Hoje, o banco de talentos da iigual soma mais de 100 mil currículos de profissionais com todos os tipos de deficiência, diferentes níveis de escolaridade e de todas as regiões do país. A empresa ainda trabalha com sensibilização de colaboradores e lideranças de empresas, presta consultorias em acessibilidade, faz recrutamento, seleção, treinamento de PcDS e fornece soluções para os empregadores identificando os melhores perfis para as vagas disponibilizadas.
Em 2019, Andrea Schwarz foi escolhida como Top Voice LinkedIn. "Aproveitei essa visbilidade para, durante a pandemia, abrir um perfil no Instagram para intensificar o meu ativismo e conquistar um novo público. A partir das minhas perspectivas e experiências, tento mostrar que é possível uma pessoa com deficiência viver no chamado 'padrão de normalidade'. Até porque ninguém é normal, certo? Somos todos diferentes. A deficiência não pode ser encarada como um destino ruim. Existe uma pessoa antes dela que merece ocupar espaços, ter acessos, ser valorizada e protagonizar uma vida plena", declara ela, que também compartilha sua rotina no TikTok.
Em 2021 e 2022, Andrea entrou para o rol das 500 pessoas mais influentes da América Latina pela Bloomberg Línea, o que intensificou ainda mais as demandas para consultorias e palestras. Assumidamente acelerada, do tipo que responde as mensagens assim que chegam enquanto faz uma outra tarefa doméstica em casa, Andrea se mostra incansável no propósito de fomentar a inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
"Entendi que essa é a melhor via de inclusão. O que acontece nas empresas é um reflexo da sociedade, por isso também luto para tornar o ambiente corporativo mais acessível, inclusivo e diverso. Esse papel não cabe apenas ao RH ou à aplicação da Lei de Cotas, é uma questão transversal de todos nós", fala.
Enquanto cumpre os compromissos profissionais e familiares e, claro, planeja a próxima viagem, Andrea Schwarz também vem pensando em tirar do papel um objetivo que vem cultivando há um ano: escrever um livro. Ela já publicou três títulos, entres os quais "Cotas: como vencer os desafios da inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho", em 2010, e agora quer compartilhar a própria biografia.
"Passei mais da metade da minha vida na cadeira de rodas e acredito que posso mostrar que existem caminhos além daquela realidade que parece estar traçada se você é uma pessoa com deficiência. A deficiência me ensinou que controlamos pouco daquilo que nos acontece, mas que podemos controlar como reagimos quando aquilo acontece", explica.