Ex-patrões viram réus acusados de manter idosa em trabalho análogo à escravidão por 72 anos
Maria de Moura começou a trabalhar para a família aos 12 anos e foi resgatada em 2022, aos 85 anos
Maria de Moura, de 87 anos, viveu 72 anos de sua vida trabalhando em condição análoga à escravidão para uma família no Rio de Janeiro. Aos 12 anos, ela se mudou para a residência dos patrões de seu pai, em uma fazenda onde ele trabalhava, e foi resgatada em 2022, aos 85 anos.
Em fevereiro deste ano, o Ministério Publico Federal apresentou uma denúncia contra Yonne Mattos Maia, filha do proprietário da fazenda, e seu filho, André Mattos Maia Neumann, acusando-os de manter Maria de Moura em condições análogas à escravidão.
Para a reportagem do Fantástico, da TV Globo, a promotora Juliana Mombelli confirmou que este é o caso mais duradouro de trabalho em condições análagos à escravidão. Ela também mencionou que, de acordo com o documento do Ministério Público do Trabalho, Maria dormia em um sofá, próximo à empregadora, sem lençol, cobertor ou travesseiro.
Ainda de acordo com a reportagem, o procurador Eduardo Benones afirmou que as condições nas quais Maria de Moura foi encontrada foram cruciais para as acusações, revelando jornadas exaustivas e restrições à sua liberdade.
Maria não tinha plano de saúde e nem remuneração. Atualmente, sua fonte de renda é a aposentadoria como autônoma, além de um salário mínimo que recebe da família Mattos Maia, como determinado judicialmente.
"Quase da família"
A defesa solicitou que Maria fosse ouvida durante o julgamento, alegando que ela conviveu com a família por muito tempo e que inclusive viajava com eles. No entanto, o pedido foi negado devido aos sinais de demência apresentados pela idosa.
"Ela conviveu nessa família a vida toda. Ela frequentava samba, desfiles, viajava com a família. Estão tratando a Maria de Moura como se ela fosse um objeto. Estão subtraindo dela a humanidade dela. De ouvi-la. Você quer ficar com quem? ", disse o advogado da família, Marcos Vecchi, ao g1.
O conceito de considerar alguém "quase da família" pode ser prejudicial quando se trata de uma pessoa que está sendo mantida sem salário e ainda trabalhando. O Ministério Público Federal levou em conta essa percepção ao formular a denúncia.
“Depois de muitos e muitos e muitos anos servindo as mesmas pessoas, a pessoa tem a sua consciência capturada. Ela não consegue se enxergar na condição de vítima, porque ela é tratada como se fosse supostamente uma pessoa da família", disse o promotor Eduardo Benones ao Fantástico.