Frases que não devem ser ditas a uma pessoa em um relacionamento abusivo
“Por que você ainda está com ele?” e “Você deve ter feito algo para provocar isso” são algumas expressões que culpabilizam a vítima
Quando se trata de apoiar pessoas que vivem um relacionamento abusivo, as palavras têm um poder imenso. No entanto, algumas frases podem ser extremamente prejudiciais. É crucial reconhecer que certas expressões podem reforçar o ciclo de abuso ou desvalorizar a experiência da vítima, invalidando seus sentimentos e minando a sua coragem de buscar ajuda ou sair do relacionamento.
Ao tentar ajudar alguém que está em um relacionamento abusivo, é importante evitar frases como “Por que você simplesmente não sai?” ou “Você deveria ter percebido antes”. Essas declarações podem culpabilizar a vítima e minimizar a complexidade do ciclo de violência.
“Esses comentários, conselhos e opiniões, fazem com que a vítima passe a assumir a responsabilidade total pelo problema enfrentado, o que geralmente faz com que ela se coloque à disposição do agressor, muitas vezes como forma de se redimir de 'sua culpa'. Dá força para que o agressor continue no controle da situação e da vida da vítima”, diz ao Terra NÓS a psicóloga Kátia Braz, especializada em saúde mental e dependência química.
“Por que você ainda está com ele?”
Questionar o motivo de uma pessoa ainda estar em um relacionamento abusivo pode parecer uma abordagem lógica, mas na realidade pode ser prejudicial para a vítima. Para muitas pessoas, deixar uma relação abusiva é um processo complexo e, ao questionar isso, corre o risco de culpabilizá-las, fazendo com que se sintam envergonhadas, isoladas ou até mesmo mais presas à situação.
“Uma pessoa que, para além de estar vivenciando as dores de uma relação abusiva, receber críticas e opiniões negativas a respeito dos seus pensamentos, sentimentos ou comportamentos referentes ao modo que está lidando com seu relacionamento no momento, pode trazer muitas dúvidas e sofrimento, impactando de forma negativa a sua autoestima”, afirma Kátia.
Para a psicóloga, que é mestranda em psicologia criminal com especialização em psicologia forense, responsabilizar a vítima por permanecer no relacionamento pode fortalecer o ciclo de violência e controle imposto pelo abusador.
“Aumento da tensão; ato de violência; arrependimento; e comportamento carinhoso, esse é o ciclo da violência. Inicialmente as fases podem se alternar com longos períodos de tempo, mas quanto mais a vítima aceita os pedidos de desculpa, acreditando na sinceridade do arrependimento e se sentindo acolhida com os comportamentos carinhosos, mais vulnerável ela vai ficando frente à força abusiva desse relacionamento”, pontua.
“Se você está com ele é porque você quer”
Outra frase para não ser dita que ignora as camadas do abuso psicológico e emocional envolvidos. As vítimas frequentemente enfrentam manipulação e controle intensos, o que torna difícil tomar decisões autônomas.
Essas expressões podem intensificar o isolamento social da vítima, tornando ainda mais desafiadora a busca por apoio e assistência.
“Medo, vergonha, culpa, ninguém quer ser vítima, ninguém quer ser questionado ou acusado por suas escolhas. Ela acaba acreditando que é mais fácil tentar se adaptar do que enfrentar todo o tipo de julgamento e revitimização.”
“Você poderia sair a qualquer momento, se realmente quisesse”
Muitas vezes, o medo, a manipulação psicológica e as ameaças criam uma sensação de impotência e dependência na vítima, uma abordagem que pode agravar a insegurança, ao invés de fornecer apoio e compreensão.
“A falta de informação, de conhecimento, junto com julgamento das pessoas externas, aumenta o sentimento de culpa e de solidão, fazendo crescer as incertezas, gerando mais sentimentos de ansiedade e estresse”, afirma ainda a psicóloga.
“Você deve ter feito algo para provocar isso”
Ao atribuir a culpa a vítima, essa declaração perpetua a ideia de que o comportamento do agressor é justificado pela suposta provocação da vítima, que constantemente se convence de que é a única responsável pelo sofrimento que vivencia.
“A falta de informação, não só da vítima, mas de todas as pessoas sobre a gravidade desse tipo de relacionamento e seus desdobramentos emocionais, a coloca em posição desfavorável, com isso ela não tem coragem, nem forças, para reconhecer a situação, enfrentar o problema e muito menos para buscar ajuda, perpetuando o ciclo de abusos”, completa Kátia.
A mestranda em psicologia criminal diz também que para uma vítima conseguir se reerguer é preciso incentivar e acolher. “O acolhimento, a compreensão, o respeito pelas escolhas da pessoa, a escuta sem julgamento, o apoio na medida certa, o incentivo, a informação correta sobre os tipos de violências e os direitos da vítima podem devolver a força, a coragem e o desejo de buscar melhores condições para a sua vida.”