Gabinete de Transição diz que Palmares não tem condições administrativas para atuar
Em visita técnica, a equipe do gabinete de Igualdade Racial e de Cultura se deparou com uma instituição sucateada com o menor orçamento da história
Integrantes do Gabinete de Transição de Cultura e Igualdade Racial do governo Lula, disseram que o quadro da Fundação Cultural Palmares é de inviabilidade administrativa, após realizarem visita técnica e reunião institucional na sede. Para o grupo, a promoção e preservação da cultura negra no país está em condições alarmantes.
Uma das coordenadoras do GT de Igualdade Racial, a quilombola e doutora em Antropologia pela Universidade de Brasília (UnB), Givânia Maria da Silva, esteve presente no local. A visita foi acompanhada pelo presidente substituto da entidade, Marco Antônio Evangelista, por Marina Elvas, representante da Casa Civil, pelas coordenações técnicas da Palmares e por uma delegação da Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas (CONAQ).
Os visitantes encontraram o acervo armazenado em locais não apropriados, sem nenhum tipo de tratamento ou proteção. Além disso, constataram condições insalubres das instalações do prédio que a entidade ocupa desde o início de 2021. Há questões sanitárias, com infiltrações, por exemplo. Na infraestrutura, o grupo enxergou lacunas de instalação elétrica, internet, ventilação e mobiliário.
De acordo com a equipe, os cortes nos orçamentos dos últimos seis anos colocam a Palmares com um dos menores orçamentos em toda a estrutura governamental.
"O montante para ações finalísticas da entidade, que chegam efetivamente à ponta, foi de aproximadamente R$ 2,5 milhões em 2022, englobando atividades realizadas pela unidade sede e pelas cinco unidades regionais. Na PLOA de 2023, o orçamento previsto nessa rubrica é de apenas R$ 1,4 milhão. Os valores correspondem a um terço do que a instituição executa em emendas parlamentares impositivas", afirmou em nota.
Ao grupo, a Palmares afirmou que só não paralisou suas atividades porque conseguiu reduzir gastos com a transferência da sede ao prédio atual, cedido pela Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) a partir de uma ação do Ministério Público. O atual presidente da EBC, general Luiz Carlos Pereira Gomes, foi o responsável pela logística de mudança da sede.
Parlamentares e instituições partidárias entraram com ações na Procuradoria Geral da República e no Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) questionando a transferência da sede da Fundação e de todo seu acervo. O local onde estão as instalações da Palmares, hoje, era uma espécie de almoxarifado para a EBC e estaria sem uso administrativo desde 2016.
A questão orçamentária também reverberou nos recursos humanos da instituição. o grupo declarou que a Fundação possui apenas 61 servidores em todo o Brasil, sendo apenas 23 deles efetivos e seis com tempo de aposentadoria completo. No primeiro estatuto da Palmares, de 1992, estabeleceu-se o patamar mínimo de 162 servidores efetivos para assegurar o funcionamento básico da instituição.
"Os contratos de terceirizados foram ainda revistos, implicando na redução dos serviços prestados e no corte significativo dos salários. Na avaliação da comitiva, é um contexto de precarização aguda do trabalho, com consequente adoecimento dos trabalhadores e redução da qualidade dos serviços prestados", mostrou a nota.
Para que a Fundação Palmares não entre em colapso operacional e possa cumprir sua missão no apoio, fomento e preservação da cultura afro-brasileira, o grupo indica medidas urgentes, como a realização imediata de concurso público, a revisão da dotação orçamentária e a reforma da sede.
A Alma Preta Jornalismo entrou em contato com a Fundação Palmares para mais explicações, mas não obteve respostas até o fechamento do texto. Segundo Givânia Silva, a função do governo de transição é apontar as dificuldades e positividades e fazer relatórios para a próxima administração que entrará junto com a posse do governo Lula. Ela disse que a Palmares é um retrato do governo Bolsonaro e que, presencialmente, viu a necessidade da reestruturação diante do estrangulamento das atuações dos profissionais em áreas que eles não deveriam atuar.
Em outra reportagem, a Alma Preta Jornalismo mostra a visão do movimento negro atuante para o futuro da Fundação Palmares e o que as principais lideranças desejam para a entidade na próxima gestão. Para Simone Nascimento, coordenadora nacional do Movimento Negro Unificado (MNU) e co-deputada estadual eleita (PSOL-SP), o funcionamento adequado da Seppir e da Palmares é fundamental para que a população negra avance em seus direitos de forma transversal.
"Acredito que o combate ao racismo precisa estar em todos os ministérios, secretarias e espaços do governo federal. Um bom exemplo é o papel fundamental que esses espaços podem ter no apoio e difusão da Lei 10.639/03, que torna obrigatório o ensino da História da África e Afro-Brasileira nas escolas, através de uma educação guiada pelo antirracismo, ou seja, são espaços que precisam funcionar de forma articulada com todo governo", explica Simone.
A Fundação Cultural Palmares (FCP) é uma instituição criada em agosto de 1988 pelo governo federal como resultado da luta do movimento negro. O órgão tem a função de promover uma política cultural igualitária e inclusiva, que contribua para a valorização da história e das manifestações culturais e artísticas negras brasileiras como patrimônios nacionais.