Hospital se nega a colocar DIU em mulheres por ser "contra os valores religiosos da instituição"
Hospital São Camilo afirmou que só realizam o procedimento em caso de endometriose grave e não como método contraceptivo
Uma criadora de conteúdo revelou nas redes sociais que não conseguiu realizar o procedimento de inserção do DIU (dispositivo intrauterino). Segundo Leonor Macedo, de 41 anos, o hospital São Camilo informou que o procedimento "vai contra os valores religiosos da instituição".
Leonor foi a uma consulta na unidade da Pompeia, zona oeste de São Paulo, na última segunda-feira (22), e no dia seguinte compartilhou a indignação no X (antigo Twitter).
"Vocês acham que é fácil ser mulher? Ontem fui a uma consulta no Hospital São Camilo e a médica me informou que não pode colocar o DIU em mulheres porque isso vai contra os valores religiosos da instituição", escreveu ela.
Vocês acham que é fácil ser mulher? Ontem fui a uma consulta no Hospital São Camilo e à médica me informou que não pode colocar o DIU em mulheres porque isso vai contra os valores religiosos da instituição. 🫠🫠🫠
— Leonor Macedo (@subversiva) January 23, 2024
Em outra publicação, ela narra que o hospital São Camilo ligou para explicar que a instituição não realiza procedimentos como DIU e vasectomia. "Só colocam o DIU no caso de endometriose grave, mas não como método contraceptivo. Explicou que é uma instituição religiosa e que segue os preceitos da Igreja Católica e do Vaticano", contou.
"Foi uma conversa respeitosa, mas expliquei que vou denunciar e que vou responder aos jornalistas que estão me procurando pra fazer matéria porque é uma maneira muito antiga de pensar e que só com a indignação coletiva e com a denúncia é que as coisas avançam", acrescentou.
O Hospital São Camilo me ligou pra explicar que não fazem procedimentos como DIU e vasectomia, que só colocam o DIU no caso de endometriose grave, mas não como método contraceptivo. Explicou que é uma instituição religiosa e que segue os preceitos da Igreja Católica e do Vaticano
— Leonor Macedo (@subversiva) January 23, 2024
Leonor ainda disse que a médica informou que ela poderia fazer o procedimento em um hospital particular. "E que veria a questão do reembolso, ou que eu poderia procurar outro médico do meu convênio que seja fora da rede São Camilo. Fiquei bem indignada, em choque", disse ao UOL.
O hospital disse à ela que "tecnicamente, o DIU é comparado a um aborto" por "agir contra algo fecundado" e, por isso, não realizam o procedimento.
No X, em resposta a um comentário da postagem de Leonor, o hospital confirmou que de fato não realiza o método. "É de nosso interesse prestar as informações necessárias. Por diretriz institucional de uma instituição católica, não há a realização de procedimentos contraceptivos, seja em homens e mulheres", comunicou.
"Quando é assim, orientamos que a pessoa busque a rede referenciada do seu plano de saúde que tenha esse procedimento contemplado. Permanecemos à disposição", completou o hospital.
Oi, Jana, tudo bem?
É de nosso interesse prestar as informações necessárias. Por diretriz institucional de uma instituição católica, não há a realização de procedimentos contraceptivos, seja em homens e mulheres. (1/2)
— Hospital São Camilo SP (@HospSaoCamiloSP) January 23, 2024
Quando é assim, orientamos que a pessoa busque a rede referenciada do seu plano de saúde que tenha esse procedimento contemplado. Permanecemos à disposição. (2/2)
— Hospital São Camilo SP (@HospSaoCamiloSP) January 23, 2024
Ao Terra NÓS, o hospital São Camilo informou que "por ser uma instituição confessional católica, tem como diretriz não realizar procedimentos contraceptivos, em homens ou mulheres. Tais procedimentos são realizados apenas em casos que envolvam riscos à manutenção da vida".
"Os pacientes que procuram pela Rede de Hospitais São Camilo - SP, e que não apresentam riscos à saúde, são orientados a buscar na rede referenciada do seu plano de saúde hospitais que tenham esse procedimento contratualizado", afirmou.
A reportagem do Terra NÓS também entrou em contato com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para mais esclarecimentos sobre a conduta da instituição.
Veja abaixo o posicionamento da ANS:
"Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) informa que regula as operadoras de planos de saúde e administradoras de benefícios atuantes no Brasil e sua relação com os prestadores de serviços de saúde, conforme a Lei 9.656/1998.
Contudo, a legislação não permite à ANS a regulação dos hospitais. De todo modo, ao longo de sua trajetória, a ANS vem estimulando o mercado regulado a promover e manter iniciativas de controle de qualidade sobre os seus serviços e os dos prestadores, com a implementação de ações de indução de melhorias, além da adoção de boas práticas por todos os atores envolvidos na saúde suplementar.
A Agência também esclarece que as operadoras de planos de saúde são obrigadas a oferecer todos os procedimentos previstos no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS, respeitando-se os casos de Diretrizes de Utilização (DUT), carências e Cobertura Parcial Temporária (CPT), quando houver, de acordo com a segmentação assistencial, área geográfica de abrangência e área de atuação do produto, dentro dos prazos definidos pela ANS. Dito isso, a Agência destaca que o planejamento familiar tem cobertura obrigatória pelos planos de saúde, conforme art. 35-c, III da Lei 9656/98 e sua regulamentação encontra-se prevista na Lei 9263/96. Dessa forma, destacamos que estão contemplados no Rol, por exemplo, procedimentos como:
- Cirurgia de esterilização masculina (vasectomia) (conforme regras estabelecidas na DUT nº 12 – anexo II da RN nº 465/2021)
- Cirurgia de esterilização feminina (laqueadura tubária/ laqueadura tubária laparoscópica) (conforme regras estabelecidas na DUT nº 11 – anexo II da RN nº 465/2021)
- Implante de dispositivo/sistema intrauterino (DIU/SIU) hormonal - inclui o dispositivo
- Implante de dispositivo intra-uterino (DIU) não hormonal - inclui o dispositivo
Para garantir a assistência oferecida nos planos contratados, as operadoras devem formar uma rede de prestadores, seja própria ou contratada, compatível com a demanda e com a área de abrangência do plano. Dessa forma, a rede prestadora deve ser capaz de atender à demanda dos beneficiários nos prazos regulamentares, respeitando o que foi contratado, sendo imputada à operadora a responsabilidade por falhas na formação desta rede.
Eventual prática em desacordo por parte da operadora pode ser considerada negativa de atendimento, levando à abertura de processo administrativo sancionador contra a operadora, que poderá, conforme a legislação vigente, resultar na possibilidade de aplicação de multa.
A operadora também poderá ter a comercialização de planos suspensa temporariamente em decorrência de reclamações registradas nos canais de atendimento da Agência sobre a falta ou demora de cobertura".