"Mãe também goza, erra, pede desculpas", diz Samara Felippo
Com duas filhas, atriz usa redes sociais para desconstruir a romantização da maternidade com humor e honestidade e inspirar mulheres
Um rápido passar de olhos pelos comentários no Instagram de Samara Felippo é suficiente para concluir que se uma mulher livre incomoda muita gente, uma mãe livre incomoda muito mais. Além de registros de trabalhos recentes e antigos e momentos em família e com amigos, a atriz de 44 anos costuma postar fotos com roupas sexy embaladas por textos provocativos - como o que dizia que aproveitaria a ausência das filhas para gozar e gemer alto com o parceiro - que, volta e meia, são alvo de questionamentos do tipo: "O que é que as suas filhas acham disso???".
E é com essa pergunta que inicio o papo com Samara, que responde, rindo: "Elas acham lindo. Conversamos muito a respeito de tudo e nosso relacionamento é baseado no diálogo e na sinceridade. A Alícia até me ajuda a escolher minhas roupas", conta ela, se referindo à filha que fará 14 anos em junho. Ela também é mãe de Lara, de 9 anos. Ambas são fruto de seu relacionamento com o ex-jogador de basquete Leandrinho, que atualmente mora nos Estados Unidos.
Os looks sensuais que Samara compartilha compõem seu figurino quando ela encarna a DJ nas festas Apocalipse Tropical, que acontecem em São Paulo. "Nessas festas eu desperto a mulher que a maternidade engoliu. São um momento em que eu resgato a autoestima dessa mãe e lembro que mães não são figuras assexuadas. A mãe que sou precisa dessa mulher da festa e vice-versa", explica. E reforça: "É comum as mulheres se esquecerem que mães felizes criam filhos felizes."
Pontos sensíveis
Criticada constantemente não só pelos trajes (ou ausência deles), mas pelas ideias, a artista conta que ignora ou simplesmente bloqueia os haters. Porém, admite que o que dói mais são os julgamentos machistas de outras mulheres. "Isso me machuca. Quantas mulheres lutaram e até morreram por nossa liberdade e essa luta ainda é desvalorizada?", indaga.
A honestidade com que Samara busca mostrar que ser mãe é um papel que vem depois do ser mulher nem sempre é bem compreendida, principalmente porque ela toca em pontos sensíveis que muitas preferem ignorar. Um exemplo emblemático foi quando disse, em 2020, que amava as filhas, mas odiava a função de ser mãe. Entre críticas e elogios, a fala gerou debate e reflexão sobre como a criação dos filhos, mesmo entre casais mais progressistas, muda radicalmente a vida de uma mulher, mas não impacta tanto na rotina do homem.
Mais recentemente, um vídeo bem-humorado no Instagram sobre como as mães tratam de maneira diferente e inconsciente filhos mais velhos e mais novos gerou burburinho por, mais uma vez, mostrar a realidade sem filtro.
Samara se diz mãe solo, como "11 milhões de mulheres no Brasil, país em que o abandono paterno é naturalizado". "É uma jornada exaustiva, sobrecarregada, com enorme carga mental e cheia de culpa. E, ainda, uma construção diária de desentendimento, mas também de muita paz e muito amor", ressalta. Ela compara a maternidade com um game, cada fase tem seus desafios e descobertas. "A fase de agora é dividir com a Alícia e a Lara as alegrias, de vê-las como meninas admiráveis e perceber o quanto eu as admiro. É uma parceria", define.
Numa live em 2021, Samara relatou um episódio de racismo sofrido pela caçula na escola. "O tema é sempre motivo de conversa na minha casa, pois aposto numa criação esclarecedora. Já ouvi da mais velha para deixar para lá, pois reclamar na escola as coloca numa posição de exposição constrangedora com as amiguinhas. Mas elas precisam entender que racismo é crime e não devem se calar diante disso. Sou uma mãe branca com duas filhas pretas e encaro isso tudo com dor, mas não consigo imaginar a dor de uma mãe preta que tem essa vivência constante", aponta.
Sonhos engavetados
Desde 2018, Samara divide o dia a dia com o ator Elídio Sanna. "Sou uma militante da não-monogamia e temos nossos combinados, mas, não, não é um casamento aberto como publicaram recentemente na imprensa", pontua.
A atriz voltou a percorrer o Brasil com o espetáculo teatral "Mulheres que nascem com os filhos", que estreou em 2019 ao lado da amiga e "sustento emocional" Carolinie Figueiredo, parceira desde os tempos de "Malhação" (1999-2001). Sem babá, Samara diz contar com uma rede de apoio formada pelo grupo de mães da escola das meninas no WhatsApp para dar conta de imprevistos e avisa que, nesse momento, vem se preparando para retomar alguns projetos antigos, como voltar a fazer novelas e levar uma série para o streaming.
"Pouca gente assume, mas a maternidade também é um processo de engavetar sonhos. Hoje minhas filhas estão mais independentes, mas em alguns momentos tive de passar por cima do selo da culpa para tocar algum trabalho. Isso é ser mãe: errar, assumir que não pôde dar atenção, pedir desculpas, ir levando, tentar", define.