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Médica vira ré após falas racistas em consulta ginecológica de jovem negra

Ginecologista afirmou que a maioria das mulheres negras "tem cheiro forte" nas partes íntimas; afirmação não é verdadeira

12 jun 2023 - 13h08
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Médica é acusada de racismo em consulta no Rio
Médica é acusada de racismo em consulta no Rio
Foto: Reprodução/TV Globo

Uma ginecologista é acusada de racismo, no Rio de Janeiro, após atender uma jovem negra de 19 anos. Conforme mostrou o Fantástico, da TV Globo, Helena Malzac afirmou à paciente que a maioria das mulheres negras "tem cheiro forte" nas partes íntimas, uma afirmação preconceituosa e sem comprovação científica. A médica responde pelo crime na Justiça.

O caso ocorreu quando Luana Génot levou a afilhada para colocar DIU com a profissional, que, até então, era de sua confiança, e que já conhecia havia mais de dez anos.

"Entrei na consulta e comecei a ouvir que as pessoas negras tinham odores diferentes. E aí veio o meu estranhamento", explica.

Diante da situação, ela começou a gravar a conversa:

Helena: "Muito forte, aqui, ó. Quando você sua, o cheiro piora. É a mesma coisa do sovaco. É o mesmo cheiro, é um cheiro forte, mas é por causa da cor e do pelo. Você vai ser a vida inteira assim, então, você tem que se preocupar com isso, tá?"

Luana: "Mas quando você fala da cor e do pelo, você tá dizendo que isso acontece só em pessoas negras?"

Helena: "É, é muito comum. Não é 90%, mas a gente coloca uns 70%."

Luana: "Então, tem a ver com a melanina?"

Helena: "Tem a ver com a melanina também."

Quando saiu do consultório, a madrinha então perguntou para a jovem se ela havia percebido o que tinha acontecido.

"Aquele argumento que a médica nos deu foi algo racista", afirmou Luana ao Fantástico. "Me senti vulnerável e fiquei no meu canto", afirmou a vítima, que não quis se identificar.

"Eu tenho receio de me consultar novamente com outras ginecologistas, porque tem essa possibilidade de acontecer novamente. Esse medo permanece em mim", confessou a jovem. 

Processo

Depois do episódio, elas foram até uma delegacia, onde registraram o caso. Após a investigação, o Ministério Público denunciou a médica pelo crime de racismo, porque, além da jovem, ela se referiu a um conjunto de mulheres negras. 

Durante a audiência, a médica confirmou o que disse no consultório.

"Pela minha experiência de 44 anos como ginecologista, atendendo todos os tipos de mulheres, a negra tem um cheiro mais forte. E aí ela perguntou: 'Mas por que esse cheiro?'. Eu falei: 'De repente, pode ser por causa da melanina, mas a gente vê que a maior parte das pessoas negras tem um odor muito mais forte, tanto que essas firmas de desodorante, o desodorante para negro é diferente'", declarou. 

Helena também disse que aprendeu isso na faculdade, e chegou a pesquisar sobre o assunto. 

Especialistas negam associação 

O Fantástico ouviu especialistas que refutam o argumento da médica, e afirmam que o odor corporal não tem qualquer relação com a melanina, além de não ter comprovação científica sobre isso. 

"Não tem nenhum sentido científico você atribuir o odor à melanina ou a cor da pele, e sim à flora bacteriana de cada pessoa. Isso é uma coisa específica de cada indivíduo. [...] Você pode ter algum estudo sim, mas não tem robustez científica, não a ponto de ser considerado uma verdade científica", explicou Heitor Gonçalves, presidente da Sociedade Brasileira de Dermatologia.

"A melanina tem uma relação muito grande com a cor da pele. Odor vaginal é uma questão da mulher", afirmou ainda Adnaldo Lopes, presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia.

Para a ginecologista e obstetra, Mariana Ferreira, casos como esse afastam pacientes dos atendimentos. "Infelizmente, essas falas vêm carregadas de preconceitos, e trazem estigmas para essas mulheres. Isso, inclusive, atrapalha que elas procurem atendimento. Elas não se sentem à vontade, e isso traz uma série de impactos para a autoestima delas", ressalta. 

Defesa da médica

Em defesa prévia apresentada à Justiça em janeiro, o advogado da médica afirmou que em nenhum momento, durante o procedimento médico, ocorreu a "vontade de discriminar a suposta vítima". Segundo ele, o objetivo da médica foi "visando exclusivamente tratar o mal cheiro com forte odor na região das virilhas". 

O advogado também disse que a médica sugeriu depilar os pelos pubianos, o que "nada tem a ver com discriminação". Além disso, a defesa também disse que a mãe da doutora Helena é filha de "norte-americano negro, casado com a sua avó de nacionalidade portuguesa, ariana com olhos na cor azul", e que ela poderia ser "considerada da raça negra".  

"É praticamente a terceirização do racismo. Você não deixa de ser racista porque o seu pai é negro, ou porque você já teve namoradas negras, mas pela suas próprias atitudes", afirmou a madrinha da vítima.

O Terra tentou localizar a defesa da médica, mas não conseguiu. O espaço permanece aberto para qualquer manifestação. 

Fonte: Redação Nós
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