"Nunca quis ser personagem, mas praticar jornalismo sério na TV", diz repórter trans
Mellyssa Almeida faz história e dá voz à comunidade LGBTQIA+ na TV Ponta Negra, afiliada do SBT no Rio Grande do Norte
Mellyssa Almeida da Silva celebra a recepção positiva como repórter trans na TV Ponta Negra, afiliada do SBT no Rio Grande do Norte, e almeja combater estereótipos na mídia.
"O mundo ainda é preconceituoso, por isso eu não esperava uma recepetividade tão bonita das pessoas. Estou muito feliz e me sinto orgulhosa em mostrar a diversidade na comunicação potiguar", celebra a repórter Mellyssa Almeida da Silva, de 31 anos. Mulher trans, Mell tem quebrado barreiras ao se destacar numa mídia em que a diversidade - sobretudo em se tratando de pessoas transgênero - ainda engantinha: o jornalismo televisivo.
Desde junho, Mell é repórter do "Jornal do Dia", exibido pela TV Ponta Negra, afiliada do SBT no Rio Grande do Norte. Ela já tinha uma passagem pela TV Futuro, afiada da TV Cultura no estado, onde participou de alguns programas e cobriu o famoso Carnatal. Após um hiato de quatro meses, recebeu o convite para trabalhar como produtora na Ponta Negra.
A estreia diante das câmeras aconteceu no Carnaval desse ano, extraoficialmente. O desempenho de Mell agradou os telespectadores e os executivos da casa, que a escalaram para as reportagens. Ela cobre os mais diversos assuntos em sua rotina profissional, mas admite que os temas que fazem seus olhos brilharem envolvem questõs da comunidade.
"Gosto de fazer matérias sobre denúncias de buracos ou falta de iluminação em bairros, por exemplo, porque vou até lá como uma forma de ajudar as pessoas que já fizeram de tudo para resolver os problemas. Isso gera empatia e conexão com quem precisa de mim naquele momento", conta.
Para Mell Almeida, o jornalismo ainda é um pouco conservador. Por essa razão, ficou surpresa ao ver como sua contratação repercutiu positivamente e virou notícia não só no RN, mas em diversas partes do Brasil.
"Ainda há uma certa visão deturpada das pessoas trans e das travestis na TV, que historicamente foram representadas como caricatas, palhaças, baixas ou barraqueiras. Ver uma mulher trans no noticiário é fundamental para desconstruir o imaginário popular e quebrar essa concepção estereotipada", observa ela, que ainda destaca: "Nunca quis ser personagem, mas praticar jornalismo sério na TV".
Primeiros passos
Nascida em Macau, no interior do estado, Mell hoje mora em Natal. A paixão pela comunicação surgiu na infância, quando sonhava em se tornar apresentadora infantil. "Mas a realidade não permitia grandes sonhos", diz ela, que passou a dançar em um grupo. Como não tinha faculdade de Jornalismo onde morava, Mell acabou se dedicando a outros cursos.
As primeiras experiências com as câmeras aconteceram no YouTube, no extinto canal de um amigo. Ao se mudar para Natal, acabou se formando em Turismo e Eventos e participou de um concurso para ser repórter do Carnatal. Desde então, o céu é o limite para a repórter que não para de receber mensagens de incentivo e de parabéns pela carreira que vem construindo.
"Desde que me entendi como uma mulher trans, não queria me limitar às funções de cabeleireira ou doméstica tão comuns à nossa comunidade. Não se trata de uma crítica, pois ambas as profissões são dignas. Minha mãe, aliás, que sempre me aceitou e me amparou bancou a minha criação sendo doméstica. Mas eu queria mais, eu queria ser reconhecida", afirma.
Hoje, Mell quer galgar degraus cada vez mais altos na profissão e almeja fazer história na TV. "Quero que a minha visibilidade seja benéfica, combata preconceitos e abra espaços para que outras pessoas trans possam estar onde queiram estar. Vencer, para nós, é muito difícil. As referências podem ajudar a chegar lá, mesmo que a gente precise provar mil vezes mais do que as pessoas cis que somos capazes", pontua.