Blogueirinha pedir desculpa é válido; Ludmilla não aceitar, também
Todos podem melhorar e crescer, mas quem foi vítima sabe o estrago que o racismo causou
Nesta semana, um caso de 2019, voltou aos holofotes das redes. Em entrevista ao Léo Dias, a cantora Ludmilla contou que nunca aceitou ir ao programa da Blogueirinha porque, quando ela venceu o Prêmio Multishow em duas categorias com a música Onda Diferente, ao subir no palco para receber seus troféus, Ludmilla foi alvo de vaias e ofensas racistas. Para agravar ainda mais todo esse cenário catastrófico a cantora era a primeira mulher negra a vencer nas categorias principais do evento. Ainda na entrevista Ludmila falou: “No dia seguinte, me deparei com um vídeo da Blogueirinha dizendo que eu tinha que agradecer pelas vaias e falas racistas. Eu fiquei mal. É um personagem? É! Mas a brincadeira só está legal quando tem duas pessoas rindo".
Bruno Matos, ator que faz a personagem blogueirinha, fez um vídeo se desculpando com a cantora, falou que era uma pessoa diferente há 5 anos, que quando ele disse que ela deveria agradecer pelas vaias não pensou na questão racial e sim na treta dos fãs de Ludmilla e Anitta. Ele foi direto e disse: “Realmente, o tom foi péssimo, eu só tenho que pedir desculpas para ela”. Ainda teve mais coisas depois disso, mas nada que acrescente nesse discussão.
A cantora Ludmilla é alvo de racismo com frequência na internet. Sempre que ela faz algo bom aparece alguns comentários racistas mitigando suas conquistas ou falando da sua aparência, e quando ela comete algum equívoco a coisa só piora. O racismo é uma ferida que não se fecha. Pessoas que são vítimas constantemente como a Lud, vive como se diariamente sua ferida exposta fosse cutucada. Quando essa “cutucada” ganha manchete na mídia, isso é muito pior. Uma coisa é um arroba sem foto falar asneira e ter 6 visualizações, outra coisa são pessoas grandes, com uma cartela de fãs e que com certeza irá chegar ao conhecimento da vítima.
Eu defendo com unhas e dentes o direito da Ludmilla não aceitar o pedido de desculpa, assim como no dia que ela achar que deve virar a página terá todo meu apoio. Digo isso pois várias pessoas de caráter duvidoso fica questionando a vítima, no caso a Ludmilla, trazendo outros acontecimentos em uma tentativa óbvia de questionar o seu sentimento sobre o caso com a blogueirinha. Isso me deixa bem chateado. Essas pessoas a questionam por falar com o Léo Dias e não com a blogueirinha, questionaram por ela ter foto com um cara que não citarei o nome para não dar IBOPE, mas é aquele que foi racista com a Thelminha e com a Maju Coutinho e outras coisas na tentativa de reduzir a indignação da artista. Uma prática cruel que, na maioria das vezes, é feita por um grupo de pessoas bitoladas em rivalidades entre cantoras, que não vê limites para provocações, flertando assim com a perversidade, competitividade e racismo.
Eu acredito muito que não existe ninguém perfeito. Acredito também que todos nós por mais progressista que sejamos, estamos o tempo todo caindo em erros nos quais crescemos aprendendo e vivemos tentando desaprender. Por isso que eu nunca vou reduzir a dor da vítima por algum comportamento que eu penso ser equivocado, assim como acho que sempre temos que está aberto a ouvir um pedido de desculpa. Existe uma parcela da população, inclusive muitas pessoas negras, que cresceram com a ideia da democracia racial, que o Brasil não tem racismo e que pessoas negras e brancas partem do mesmo local. Eu mesmo só fui entender melhor a questão racial na universidade, logo, quem sou eu para questionar, nesse caso a desculpa do Bruno Matos. Acredito sim que ele pode ter se arrependido, que se culpa por ter jogado luz nas atitudes racistas que atingiram a cantora e acredito também que ele, ao longo desses anos que estourou tem demonstrado essa melhora, e que o dia a dia irá confirmar, ou não, sua verdadeira intenção.
Contudo, independente de coração puro, só a vítima tem o direito de dizer como se sentiu e se perdoa ou não. Ludmilla não deve ser cobrada para perdoar. Quem sou eu para dizer para o outro como lidar com suas mágoas e sentimentos. O que para mim é bobagem, para você pode ser importante. E quando esse questionamento sobre a dor da cantora parte de pessoas brancas, isso me deixa ainda mais perplexo. É um grupo de pessoas que por mais empatia que possam ter, jamais saberão como é sentir o racismo e perceber que ganhar dinheiro não te blinda dele. Logo podemos achar bacana a atitude da blogueirinha, mas jamais questionar o sentimento da Ludmilla. Que as pessoas tomem consciência dos seus erros, não pelo outro, e sim por si. Afinal, a vítima jamais deve ser responsabilizada pelo dano causado por terceiros.