Deus nos livre de CEOs misóginos
Com a repercussão da declaração de Tallis Gomes, homens do mundo corporativo deveriam debater sobre a importância da equidade de gênero
O empresário Tallis Gomes ganhou os holofotes desde que lançou no Instagram a frase "Deus me livre de mulher CEO". O empresário, o mesmo que já havia dito que não contratava "esquerdistas", desfiou uma série de opiniões medievais em sua última polêmica. Para ele, uma mulher em cargo de liderança se masculiniza. Ou seja, ela se distancia do que Gomes acha que é o papel da mulher: o de servir.
Quem vai cuidar da casa, família, do marido e dos filhos, se ela adotar uma jornada semanal como a defendida pelo empresário, de 70 a 80 horas semanais? O conteúdo misógino de suas falas foi tão chocante que não teve outro jeito a não ser a retratação pública e a saída da presidência da G4 Educação, empresa fundada por Gomes e que oferece mentorias sobre práticas usadas por empresas bem sucedidas no mundo. Para não queimar a imagem da empresa, foi anunciada uma mulher para o cargo de Gomes. O empresário também teve palestras canceladas e foi expulso do conselho da Hope.
Muito me admira que um empresário que tenha criado uma escola de liderança nunca tenha constatado ou lido sobre a série de vantagens em ter mulheres em cargos de comando. Provavelmente porque equidade de gênero seja um tema sem relevância na empresa fundada por ele, onde há apenas uma mulher na equipe de quinze mentores (ah, os coachs), segundo o próprio site da companhia. O assunto deve passar longe mesmo, a julgar pela mentalidade do empresário de que a "energia feminina" é para ser usada nos "lugares certos" como o lar.
Há evidências, mais do que conhecidas, que apontam que mulheres no trabalho têm um nível de comprometimento muito maior do que o de homens. E quando chegam em cargos de chefia, também promovem equipes mais engajadas, com mais entusiasmo e motivação. Segundo pesquisa da Ipsos, para o Dia Internacional da Mulher de 2024, as brasileiras são percebidas como líderes que tratam as pessoas LGBTQ+ e minorias étnico-raciais de forma mais justa no ambiente de trabalho.
O que um bom líder deveria estar preocupado, nessa altura do campeonato, era em capacitar mais mulheres para cargos de liderança porque, para a empresa, seria melhor. Apesar de haver mais mulheres em altos postos de chefia hoje em dia, a imensa maioria dos cargos de CEO no Brasil, 95%, são ocupados por homens. Prova de que o caminho da paridade de gênero no país ainda é longo. Mas precisa ser trilhado.
Ao contrário do que possam supor, à medida que mulheres conquistam mais espaço na sociedade, inclusive em cargos de liderança, homens saem ganhando. De acordo com um estudo do pesquisador noruegês Øystein Gullvåg Holter, professor da Universidade de Oslo, países onde a equidade de gênero é maior, os homens tendem a ser menos violentos, menos deprimidos e experimentam relacionamentos mais estáveis e felizes.
Deveríamos aproveitar que o assunto do empresário que quer distância de mulher CEO causou uma avalanche de comentários e questionamentos, para nos conscientizar da urgência de uma sociedade que seja mais justa para todos.