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Lugar de adolescente é com amigos de escola, nunca como primeira-dama

Chocante, perturbador, bizarro, imoral? Como classificar o casamento de um idoso de 65 anos com uma adolescente de 16?

26 abr 2023 - 09h11
(atualizado às 09h12)
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Prefeito de Araucária, Hissam Hussein Dehaini, de 65 anos, se casou com uma adolescente de 16 anos
Prefeito de Araucária, Hissam Hussein Dehaini, de 65 anos, se casou com uma adolescente de 16 anos
Foto: Reprodução/Instagram

Assim como tantos outros, que souberam pela imprensa que o prefeito de Araucária, Hissam Hussein Dehaini, de 65 anos, havia se casado com uma jovem de 16 anos, não consegui parar de pensar no que será da vida da adolescente com a união que ocorreu este mês.

A cidade rica, situada nos arredores de Curitiba, tem agora como primeira- dama uma garota que ainda cursa o ensino médio. Mesmo que a legislação permita, mesmo que os pais tenham emancipado a filha antes de oficializar a união no cartório (cuja titular, aliás, é a vice-prefeita da cidade), mesmo com as alegações de que legalmente o casamento era permitido, fica difícil ter alguma tolerância com essa história. 

A começar porque, de fato, é um casamento infantil, como define a ONU (Organização das Nações Unidas), já que uma das partes é menor e tem menos de 18 anos. Mas não é uma união infantil qualquer. Do outro lado, existe um marido com idade para ser avô da esposa, a 5ª do prefeito paraense. 

Tudo fica ainda mais perturbador quando, além do episódio do casamento, se tem a notícia de que a mãe e a tia da adolescente ganharam cargos na administração da cidade, levantando indagações se as nomeações estavam no pacote do casamento. 

Nas redes sociais, a repercussão foi intensa. Muito se especulou sobre o início desse relacionamento. Como se sabe, o casamento aconteceu no dia seguinte ao aniversário de 16 anos da noiva, como se o evento estivesse apenas em contagem regressiva para  ganhar uma roupagem de legalidade. Por isso, paira a dúvida sobre quantos anos teria a garota quando o casal começou a se relacionar. Ela ainda era a menina que desfilava o corpo franzino e sonhava com o título de princesa no concurso de beleza da cidade quando a família consentiu o envolvimento com um senhor rico e poderoso? Reformulando a questão: que idade ela tinha quando passou a ser objeto de interesse do alcaide paranaense, 49 anos mais velho que ela? Num período tão crucial quanto a adolescência, a garota de Araucária tem como companheiro um homem com filhos adultos para dividir a vida. Um homem que está entre os mais influentes da cidade, com uma fortuna declarada de 14 milhões de reais. Hipoteticamente, o que aconteceria se ela, um dia, manifestasse alguma insatisfação com o novo papel de esposa?  

Garotas quando chegam aos 16 deveriam investir em sonhos. Deveriam deixar o pensamento voar alto, imaginando as possibilidades que o futuro reserva. Aos 16, elas deveriam suspirar por seus ídolos teens e enquanto isso seguir na escola. Deveriam estar cercadas por seus pares e se divertindo em programas típicos de adolescentes. Poderiam estar perto daqueles amigos e amigas da mesma geração, com conflitos semelhantes, para entender melhor quem se é. Garotas de 16 deveriam estar se preparando para ganhar o mundo em seus próprios termos, ansiosas para conquistar autonomia e ter uma vida própria, independente dos planos da família. 

Mas, no Brasil, boa parte dessas garotas têm seus sonhos destruídos muito antes disso. Segundo dados do Anuário de Segurança Pública de 2022, divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) a cada hora, 4 meninas, com menos de 13 anos, são vítimas de estupro no Brasil. Os casos de violência contra essas meninas representam mais de 60% dos casos de violência sexual contra a mulher. O agressor geralmente está dentro de casa. É um pai, um padrasto, tio, avô, homens que devem achar natural se relacionar com uma criança. É um retrato do Brasil patriarcal, machista, onde o homem é detentor do poder de fazer o que bem entender, inclusive ser pedófilo e destruir a vida de uma criança. Um país que produz alguns absurdos, como acompanhamos nestas últimas semanas, em que a diretoria do Corinthians, um dos maiores clubes de futebol, não viu mal algum em contratar um técnico sobre quem, há anos, paira uma acusação de estupro envolvendo uma menor de 13 anos. Até ontem, Cuca era saudado como um gênio da bola, preservado das polêmicas do passado. Era visto como alguém que consertou alguns clubes grandes que estavam em apuros, contribuindo para a conquista de títulos. Mas será que é sobre isso que se trata a vida? De viver para ganhar títulos? Essa é a ética, ou a falta dela, que permeia uma contratação controversa?  

Mais uma vez, a última coisa que parece importar para a parcela masculina que não vê mal algum em o agora técnico do time, ao lado de outros ex- jogadores, ter estado num quarto de hotel com uma menina de 13 anos. A recusa em não revistar o passado, só traz mais dor às mulheres que passaram por episódios semelhantes. Infelizmente, elas são muitas. Mereciam todo o nosso respeito e acolhimento para curar feridas. Se é que é possível curá-las um dia. 

Fonte: Redação Nós
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