Na era Taylor Swift, Madonna ensina que um reinado é feito de hits, não de seguidores
Em nova turnê, Madonna, aos 65, manda recado de que não existe comportamento 'adequado' para mulheres com sua idade
Madonna deu o início à tão esperada Celebration Tour, no último sábado (14/10) em Londres, a série de concertos que comemora os 40 anos de carreira da estrela. Depois do susto provocado por uma infecção bacteriana que a levou para UTI e obrigou o cancelamento da primeira 'perna' da turnê, no Canadá, Madonna faz desse momento em que estará na estrada até abril de 2024 seu retorno triunfal. Volta à cena para ocupar um lugar que é seu por direito, mas que estava ofuscado por outras questões.
Já faz alguns anos que Madonna não emplaca uma música de sucesso. Seu último álbum "Madame X" (2019) em que contou com a colaboração de jovens nomes da música como o colombiano Maluma (Medellín) e Anitta (Faz Gostoso), não teve a recepção esperada.
Se por um lado Madonna não frequentou as paradas de sucesso, por outro, esteve com frequência na mídia por conta de sua aparência física. Tem sido criticada pelos inúmeros procedimentos estéticos a que se submeteu, por não lidar bem com o envelhecimento e por sua recusa em sair de cena. Seus esforços em ensaiar exaustivamente para que pudesse celebrar os 40 anos de carreira em grande estilo quase lhe custaram a vida. Pressão do mercado, dominado por estrelas com metade de sua idade, pura obstinação ou os dois fatores?
Para o público mais novo, no qual se incluem Little Monsters (fãs de Lady Gaga) e Swifties (fãs de Taylor Swift) não tão familiarizados com a história de Madonna, é bom lembrar da comoção que a cantora causava toda vez que lançava algo novo. A cada reinvenção, Madonna esquentava o debate com novas ideias ou tendências.
Foi ela a responsável por elevar o status da lingerie feminina, sutiãs e corsets, como peça a ser mostrada. Foi quem popularizou crucifixos em brincos colares e colocou na roda o assunto da cabala, a corrente místico-filosófica do judaísmo que conteria os segredos da existência humana. Sem contar na enorme contribuição que deu à comunidade LGBTQIA + e ao feminismo em geral, falando de liberdades individuais, empoderando e dando voz às chamadas minorias.
Tudo isso numa época em que rede social nem existia. Hoje, qualquer passo que uma artista pop dá se torna assunto. Uma ida de Taylor Swift a um restaurante com o boy novo, um término de relação amorosa, o que a celebridade come ou deixa de comer alimentam dias de falatório. O reality da vida pessoal tem tanto ou mais peso do que a produção artística. Rende negócios e seguidores, fazendo com que a artista nunca saia dos holofotes.
Nessa seara, Madonna, por exemplo, tem pouco mais da metade dos seguidores de Juliette, a vencedora do BBB 21. Mas isso pouco importa quando uma estrela do seu quilate se lança na estrada, numa turnê de 78 dias, por 15 países diferentes, que parece mais ambiciosa do que as de Beyoncé e Taylor Swift. Beyoncé fez 46 shows com sua Renascence Tour e saiu dela US$ 145 milhões mais rica, segundo a Forbes. Ainda segundo a revista, a Eras Tour de Taylor, que bateu todos os recordes de turnê mais lucrativa da história, com 56 shows neste ano, deu um lucro de US$ 305 milhões à cantora.
A seu favor, Madonna tem um setlist de 40 sucessos. 40! Hit atrás de hit, embalando gerações pelo mundo afora. Sem falar no know-how de dominar o formato dos grandes concertos. Afinal, Madonna mudou o showbiz quando incluiu em suas apresentações uma trupe de bailarinos, inúmeras trocas de figurinos, cenários e telões com o mais novo em tecnologia.
Depois dela, os concertos mudaram de patamar. Se hoje milhões de adolescentes dão plantão em frente às telas de celulares e computadores, num esquema de guerra, para comprar um ingresso da turnê de Taylor Swift, é porque Madonna adicionou doses extras de entretenimento para o público de shows.
Mas se Madonna já não dança com a mesma vitalidade de antigamente por causa dos esforços físicos ao longo da carreira, continua divertindo e emocionando plateias, agora em companhia dos filhos Lola, Merci, David e Stella, como vemos nas imagens do show de estreia que circulam pela internet. As imagens revelam que Madonna segue provocativa, inquieta, mantendo a aura de sex symbol que não economiza em erotismo em suas coreografias. No entanto, sem ameaça de ser censurada ou presa como aconteceu na turnê Blond Ambition, nos anos 90, quando sua performance de Like a Prayer simulando uma masturbação chocou os puritanos de plantão.
O "pecado" agora é outro. É envelhecer diante do público. Enquanto celebra a longevidade, Madonna parece mais disposta do que nunca a mandar ao mundo um recado em alto e bom som. Nenhuma mulher de sua idade deve se sentir presa a seguir um comportamento padrão, ditado por uma visão patriarcal e misógina da sociedade. Ninguém tem o direito de se apropriar dos corpos e das vidas de mulheres dizendo o que podem e não podem fazer. Madonna quer continuar por aí, produzindo e se mantendo ativa artisticamente. Quer ficar ainda por um bom tempo. Essa é a provocação que a estrela está disposta a fazer. Longa vida a Madonna.