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Poder e privilégios: a jornada de Tanya em White Lotus

Adorável na tela, a personagem interpretada por Jennifer Coolidge talvez fosse detestável na vida real

14 dez 2022 - 14h46
(atualizado às 16h25)
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Jennifer Coolidge quase recusou o papel de Tanya, mas acabou topando fazer a milionária ligeiramente perturbada
Jennifer Coolidge quase recusou o papel de Tanya, mas acabou topando fazer a milionária ligeiramente perturbada
Foto: Reprodução/Instagram

Um amigo manda a seguinte mensagem pelo celular: 

– Quando puder falar, a senha é …. White Lotus. 

Respondo na hora: 

– Tô ligando. 

Dois dias tinham se passado desde o episódio final da temporada 2 de White Lotus (HBO Max), exibido no último dia 11. Havia muita cena para comentar, muito diálogo para saborear novamente numa conversa entre dois obcecados pela criação do roteirista e diretor Mike White. Na minha percepção, quanto mais falávamos sobre detalhes da série, mais genial ela se tornava. 

Fui fisgada por White Lotus na primeira temporada. Mas cheguei com atraso ao resort 5 estrelas que dá nome à produção. Ao me aventurar pelas histórias dos hóspedes ricos e dos funcionários do paradisíaco hotel no Havaí, alguns capítulos já estavam disponíveis no streaming da HBO. Maratonei, virei noite, quase um vício. 

Na temporada 2, que estreou em 30 de outubro, a experiência foi outra. Nos últimos sete domingos, com o relógio próximo das doze badaladas, quando um novo episódio ficaria disponível, cumpri religiosamente uma rotina. Computador no colo, air pods nos ouvidos, era o que precisava para me transportar para a Taormina, na Sicília, onde fica o resort da ficção, que soube depois existir na vida real. Um antigo convento remodelado e batizado de San Domenico Palace serviu como cenário perfeito para o novo grupo de hóspedes endinheirados, que são apresentados a partir  do momento em que desembarcam neste pedaço do litoral italiano. 

Uma das pessoas do grupo, já era familiar ao público: Tanya McQuoid, interpretada pela atriz Jennifer Coolidge. E ali, naquela conversa despretensiosa ao telefone, Tanya ganhou vida novamente. Cheia de idiossincrasias, é uma personagem adorável ao seu modo. Ela nos faz rir com o seu jeito meio abilolado, com sua falta de noção, típica de quem nasceu num mundo de privilégios. Aparentando ter por volta de 50 anos e dona de uma fortuna de 500 milhões de dólares, deixada pelo pai, Tanya não consegue dar conta da sua própria existência. Precisa da massagista do SPA do Havaí, a quem ilude prometendo mundos e fundos, assim como da assistente pessoal Portia, que é atraída, muito a contragosto, para o redemoinho que é a relação disfuncional entre Tanya e o marido Greg.  A maneira como Portia é tratada pela chefe chega a ser irritante. 

Não há dúvida de que Tanya e os outros hóspedes do grupo são todos muito poderosos. Mas é dentro do quarto do hotel que a vida se revela sem filtro algum. Neste microcosmo, surge um farto cardápio que renderia muitas sessões de análise: a falta do desejo, o vício em pornografia, a compulsão por sexo e a infidelidade recorrente.

É evidente que o marido Greg não suporta mais a mulher e que tem um caso fora do casamento. Mas se mantém na relação por causa do estilo de vida que o dinheiro de Tanya proporciona. Prefere torturar a mulher com comentários sobre o seu peso. Faz gaslighting (palavra de 2022, segundo o dicionário Merriam Webster) como na cena em que ironiza Tanya de ter comido todos os macarons que estavam na caixa de boas-vindas do hotel, apesar de Tanya dizer o contrário. Confunde a cabeça da mulher com prazer.   

Depois de abandonar a mulher sozinha no hotel, com a desculpa de que precisavam dele no trabalho, Tanya fica desolada. Mas logo é consolada pelo grupo de homens gays que conhece na Sicília. Quentin, o inglês vivido pelo ator Tom Hollander, é um deles. 

É uma figura que parece saída do jet set internacional, sempre vestido com conjuntos de paletós e calças de linho de cores claras e espadrilles nos pés. Quentin é também o responsável por selar o destino de Tanya, vislumbrado numa sessão de tarô, quando Tanya estava determinada em saber se o marido tinha um caso com alguém. 

Não há como não se solidarizar com ela, torcendo para que consiga sair da armadilha em que se deixou enroscar, por causa de sua busca constante por atenção e afeto. Por um momento, ela até tenta. Mas ela é Tanya, o estereótipo da princesa madura que não abandona o salto, a maquiagem carregada, os vestidos ao estilo Dolce Vita, o excesso de bagagem, a desilusão com a infidelidade do marido. 

Desconfio que se Tanya fosse alguém da vida real, poderíamos achá-la detestável. Mas nas telas, os traços tragicômicos de sua personalidade a colocam na galeria de personagens inesquecíveis.    

E pensar que a atriz Jennifer Coolidge ao ser convidada por Mike White quase recusou o papel. Na época, não sentia que estava no melhor de sua forma. Estava infeliz com sua aparência, depois do período da quarentena. Por sorte, uma amiga insistiu muito para que ela topasse viver a milionária ligeiramente perturbada. Ao final da temporada 2 de White Lotus, fica difícil imaginar uma outra Tanya que não a da atriz. Vai deixar saudade. 

Fonte: Redação Nós
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