Expressões capacitistas para se tirar do vocabulário
Adjetivos, muitas vezes presos no nosso inconsciente, potencializam o pavor que indivíduos sem deficiência têm de adquirir uma deficiência
Há na nossa estrutura linguística muitas expressões que reforçam a imagem ruim e negativa que a sociedade tem com relação a se ter uma deficiência e que vão passando de geração em geração.
Historicamente, as pessoas com deficiência sempre foram vistas como incapazes, inválidas, ineficientes, seres dignos de pena e por aí vai... Tais adjetivos, por muitas vezes presos no nosso inconsciente, potencializam o pavor que indivíduos sem deficiência têm de adquirir uma deficiência, vir a ter um filho com deficiência e/ou em ter que conviver de uma hora para outra, seja por qual for o motivo, com alguém dentro dessa condição.
O capacitismo, termo que define o pré-conceito contra pessoas com deficiência e que faz, seja de maneira sutil/velada ou de modo descarado/intencional, com que a sociedade super valorize ou não considere nós, pessoas com deficiência, como seres humanos dotados de direitos e obrigações como parte pertencente de um grupo, isso está há muito tempo presente em nossos hábitos, atitudes e expressões, que contribuem para a naturalização de comportamentos estereotipados que nós não aceitamos e nem aguentamos mais passar e viver.
Hoje trago algumas expressões capacitistas que todos nós já falamos e usamos, e que estão tão enraizadas em nosso vocabulário que temos dificuldade de substituir, mas se continuarmos a repetir os estigmas existentes com relação à deficiência e ao corpo com deficiência, continuarão existindo e, mais do que isso, será um ciclo sem fim e que se perpetuará de geração em geração:
- Fé cega (Tem uma fé inabalável);
- Cega de paixão (Está demasiadamente apaixonada);
- O amor é cego (O amor não vê defeitos/tudo suporta);
- Eu não tenho braço para realizar isso (Eu preciso de ajuda para executar essa tarefa);
- Fulaninho está dando uma de João-sem-braço (Preguiçoso ou desentendido);
- Esse juíz tá cego (Esse juíz não está prestando atenção);
- Nó cego (Esse nó está difícil de desatar);
- Faca cega (Essa faca não está amolada);
- Que mancada (Que equívoco ou engano):
- Tá surdo? (Você poderia me responder o que eu te perguntei?);
- Tá cego? (Você prestou atenção no que eu te mostrei?);
- Em terra de cego, quem tem olho é rei (No meio da ignorância, domina quem sabe pouco).
Já pararam para pensar que tais adjetivos nunca estão elogiando? Sempre ou quase sempre os usamos de forma pejorativa ou para diminuir o outro.
Em minhas palestras, nas minhas redes e no convívio comigo no dia-a-dia, sou muito questionada sobre como podem ser aliados da luta anti-capacitista e eu costumo dizer que uma boa oportunidade para começar é substituindo essas palavras e expressões do seu vocabulário. Sabemos que não é uma tarefa fácil, mas nenhuma mudança acontece de uma hora para outra, ela precisa começar de algum lugar e esse já seria um excelente pontapé inicial.
Vamos juntes?