Nem tão abolida assim... Por que a escravidão ainda é uma realidade nos dias atuais?
É chegada a era da inteligência artificial! São anunciadas a 4ª e até a 5ª Revolução Industrial e, a cada ano, cresce o número de pessoas resgatadas de condições análogas à escravidão. "Mais recentemente, um dado concreto expõe a extensão do fenômeno: mais de 1 milhão de pessoas vivem em situação de 'escravidão contemporânea', no Brasil." A estimativa é do Global Slavery Index 2023, índice da escravidão mundial.
Embora o dia 13 de maio de 1888 seja uma data historicamente significativa para o povo negro no Brasil — porque marca a assinatura da Lei Áurea, que oficialmente aboliu a escravidão no país — na prática, muitos desafios foram enfrentados pela população direta e indiretamente afetada pelo Regime Escravista (base da economia nacional por 388 anos).
Abolida legalmente há 135 anos, a cultura escravista ainda permanece viva em nosso território. Consequência da falta de um projeto de equiparação sócio-econômica e inserção dos poucos que ainda se encontravam em cárcere, já que 90% dos escravizados haviam conquistado sua própria liberdade antes da abolição ser promulgada.
Abandonados à própria sorte, sem acesso à terra, educação, saúde ou apoio governamental para enfrentar a transição à vida livre. Muitos recém-libertos permaneceram nos locais onde foram escravizados, trabalhando nas mesmas plantações, supostamente como trabalhadores assalariados ou meeiros.
Ou seja, a libertação legal dos 700 mil escravizados não acompanhou qualquer tipo de amparo socioeconômico imediato às suas condições de vida. Ao contrário de outros países — como os Estados Unidos que, ao abolir a escravidão, implementou políticas de reparação e indenização —, o Brasil não estrutuou qualquer ação substancial às pessoas "libertas" (e seu descendentes).
Essa ausência de um plano efetivo de inclusão social e econômica para os ex-escravizados resultou em condições precárias de vida, marginalização e contínua discriminação, fato que contribuiu para a perpetuação de desigualdades sociais por meio da violação dos direitos da população sobrevivente.
Conhecer a trajetória das leis brasileiras voltadas aos direitos da população negra no contexto escravista e pós-abolição é ferramenta crucial para compreender uma conta que nunca fechou: de um lado, havia promessas legislativas. De outro, uma realidade que as tornava ineficazes (como se verifica na linha do tempo ilustrada abaixo).
Justiça: ao pé da letra, só pra inglês ver
Essa linha do tempo destaca a lacuna entre as promessas legais (expectativa) e a efetiva implementação de direitos (realidade) para a população negra no Brasil. Evidenciando como a abolição, por si só, não foi capaz de transformar as condições estruturais de desigualdade racial. O legado dessas políticas e práticas históricas continua a influenciar a sociedade contemporânea, resultando em condições de empregabilidade “análogas à escravidão” que permanecem sendo exercidas nos campos e residências de grandes famílias, como vimos em muitas denúncias nos últimos anos.
Não é à toa que, mesmo sendo a maior parte dos habitantes do Brasil (56%), a população negra:
Até quando seremos um dos países mais desiguais do mundo, enquanto os 10% mais ricos, no Brasil, possuem quase 80% do patrimônio privado do país?
"O Bolsa Família conseguiu reduzir uma parte das desigualdades nas camadas mais pobres da população", recorda Lucas Chancel (principal autor do relatório e codiretor do Laboratório das Desigualdades Mundiais).
Ainda assim, o Brasil carece de reforma tributária e de reforma agrária, ou a desigualdade não deixará de compor suas estruturas. Há muito trabalho a ser feito, uma vez que as desigualdades sociais são totalmente entrecortadas pelas raciais.
Por isso, ainda se faz necessária, neste território, a reivindicação pela responsabilização da máquina pública por promover:
- políticas de educação e de reparação — pela diversidade e equidade social, fundamentadas nos princípios de justiça, em respeito aos direitos humanos —;
- ações de igualdade de direitos civis para corrigir injustiças históricas e sistemáticas, nas camadas pública e privada;
- oportunidades de um presente (e futuro) mais inclusivo para pessoas negras (pretas e pardas), — a fim de que todos os cidadãos tenham igualdade de oportunidades de produzir e se beneficiar do desenvolvimento econômico e social do país —.
"Superar a pobreza não é um gesto de caridade. É um ato de justiça. É a proteção de um direito humano fundamental, o direito à dignidade e a uma vida decente. Enquanto a pobreza persistir, não haverá verdadeira liberdade" (Nelson Mandela).