Em hospitais ou em arquibancadas de F1, é difícil ser mulher
Assédio no GP da Áustria e paciente estuprada por um médico anestesista são novos casos de violência contra mulher
A semana foi dominada pelo caso absurdo e repugnante do anestesista Giovanni Quintella Bezerra, de 31 anos, que foi preso e autuado em flagrante na segunda-feira (11) por estuprar uma mulher grávida durante o parto. Vídeo feito por funcionários do hospital mostra o momento em que o médico coloca o pênis na boca da paciente, que estava dopada para realização de uma cesariana. O crime ocorreu no Hospital da Mulher Heloneida Studart em Vilar dos Teles, São João de Meriti, no Rio de Janeiro.
Os inúmeros protestos e manifestações, além de desdobramentos, como a investigação de outros 30 possíveis casos de estupro cometidos pelo menos anestesista, acabaram, de certa forma, tirando o foco de uma outra violência contra mulher.
Desde sexta-feira (08), durante os treinos para o GP da Áustria, diversas mulheres, de torcedoras à profissionais que estavam trabalhando no Circuito de Spielberg, relataram terem sofrido assédio moral e abuso sexual - na internet, espectadores contaram ainda que houve ofensas racistas e homofóbicas nas arquibancadas.
Uma delas disse que um grupo de cinco fãs holandeses de Max Verstappen chegou a levantar seu vestido. “Quando os confrontei, disseram que ‘nenhum fã do Hamilton merece qualquer respeito''', contou.
O automobilismo sempre foi um ambiente sumariamente masculino, e possui pouca presença feminina entre pilotos e outras profissionais de equipes, mas ganhou, nos últimos anos, um novo perfil de torcedores, com mulheres, principalmente jovens, se interessando pelo esporte.
Situações condenáveis como estas vistas na Áustria, porém, levantam o questionamento: será que a F1 está preparada para respeitar as mulheres?
Em post nas redes sociais, a categoria reforçou que esses comportamentos são inaceitáveis e intoleráveis. “Fomos informados de relatos de que alguns fãs foram sujeitos a comentários completamente inaceitáveis por outros no GP da Áustria. Levamos esse assunto muito a sério, conversamos sobre ele com os promotores e a equipe de segurança do evento, e estaremos conversando com aqueles que relataram os incidentes. Esse tipo de comportamento é inaceitável e não será tolerado”, declarou.
Toto Wolff, chefe da Mercedes, também se posicionou a respeito, e foi mais incisivo em seu comentário: “A F1 precisa encontrar esses caras e tirá-los daqui. Se você é um fã real da F1 não importa de qual equipe ou piloto, não pode ser racista, homofóbico ou sexista. Porque se não, você não cabe na F1. Espero que tenhamos fornecido um bom show para o resto, mas esses aí podem ficar em casa. Fiquem longe, não queremos vocês”.
Dificilmente a repercussão negativa e essas declarações serão suficientes para impedir que novos casos de assédio aconteçam no ambiente da F1. Em sua coluna no UOL, Julianne Cerasoli, especialista em automobilismo e que há vários anos acompanha de perto as provas pelo mundo, alerta para o GP do Brasil, que acontece em novembro, em Interlagos, São Paulo. Segundo a jornalista, a F1 está levando “muito a sério” as denúncias, e casos parecidos de ofensas já foram registrados nas arquibancadas brasileiras em outros anos.
A expectativa, claro, é que possamos falar mais de mulheres no ambiente esportivo - e em toda sociedade - por um viés positivo, de conquistas e equidade. Mas como ignorar estes fatos tão condenáveis, que são um recorte minúsculo do que ocorre todos os dias pelo Brasil e pelo mundo? Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública indicam, por exemplo, que apenas em 2021 uma menina ou mulher foi vítima de estupro a cada 10 minutos (e estes são apenas os casos que chegaram até as autoridades policiais).
Não podemos nos calar.