Que mulher se sente confortável para amamentar num estádio?
Coritiba libera entrada apenas de mulheres e crianças após punição e permite que público feminino se sinta seguro em partida de futebol
Há alguns meses escrevi, neste mesmo espaço, que o "futebol parece querer afastar mulheres e crianças dos estádios com violência das torcidas". Sim, resgatei exatamente a frase utilizada em agosto do ano passado para valorizar o que ocorreu neste domingo, quando 8.871 mil mulheres e crianças - e apenas mulheres e crianças, de até 12 anos - preencheram as arquibancadas do Couto Pereira para assistir à partida entre Coritiba e Aruko pela primeira rodada do estadual do Paraná.
Um fato inédito no Campeonato Paranaense, que ganhou status emocionante com uma cena flagrada por Juliana Fontes, amiga, produtora e repórter do Globo Esporte Paraná. Ela fotografou mães amamentando seus filhos nas arquibancadas de cimento do Couto, durante o jogo.
Mulheres amamentando os filhos na arquibancada. Sem palavras para esta linda cena. #trcouto pic.twitter.com/9XpAMqPj1p
— Juliana Fontes (@Fontes_Juu) January 15, 2023
Essa imagem é, para mim, mais uma prova do quanto a presença masculina intimida as mulheres a frequentarem estádios. Afinal, quantas mães se sentiriam confortáveis para levar blusa e sutiã, deixar parte dos seios à mostra e amamentar seus filhos no meio de homens que, não raras vezes, têm atitudes violentas e preconceituosas?
Segundo o estudo "Marcas em campo! O futebol e a mídia dentro e fora das 4 linhas", da Kantar Ibope, de maio de 2022, as mulheres representam 44% da base de fãs de futebol no Brasil, mas é sabido que o preconceito, o assédio e os frequentes episódios de violência as afastam dos campos.
Momento do gol do Coritiba, que venceu por 1 a 0 o Aruko, na estreia do Campeonato Paranaense 2023. Gol de Alef Manga. #trcouto pic.twitter.com/pb5Vue71Z1
— Juliana Fontes (@Fontes_Juu) January 15, 2023
Como curitibana e coritibana da nascença, e frequentadora deste estádio em específico por mais de 20 anos, confesso que gostaria de ter vivenciado a experiência. Sempre fui aos jogos junto com a minha tia (o que é uma raridade, duas mulheres no estádio), e tenho a sorte de nunca ter sofrido com assédio, mas presenciei inúmeros casos de brigas - desde pequenas discussões até o emblemático episódio de invasão que aconteceu em 2009, quando o Coritiba foi rebaixado para a Série B após perder para o Fluminense.
O espetáculo deste domingo foi uma exceção à regra. Só aconteceu porque o Coritiba havia sido punido por um confronto entre torcidas que ocorreu no clássico contra o Athletico Paranaense, ainda pelo campeonato de 2022, e deveria estrear em 2023 sem a presença de público.
Palmas para o Coxa, por ter pensado nessa solução, ao Tribunal de Justiça Desportiva do Paraná (TJD-PR), que acatou a decisão, e claro, às mulheres presentes, que mostraram que podem fazer um ótimo espetáculo, sem brigas e com muito apoio ao time.
Não defendo que a solução de todos os problemas seja afastar os homens dos estádios, mas é um alento ver mulheres ocupando um ambiente historicamente masculino. Que essa cena sirva para que clubes e autoridades olhem com mais cuidado para ambientes esportivos e permitam que a festa seja cada vez mais plural, com mulheres, homens, crianças, comunidade LGBTQIA+ e quem quiser participar.