Serena Williams expõe dor das mães no mercado de trabalho
Anúncio de aposentadoria da tenista foi pautado na impossibilidade de conciliar carreira com maternidade
Serena Williams anunciou que irá se aposentar, e a decisão, tomada com muita dor, segundo ela mesma escreveu, tem um motivo claro: se dedicar a sua família - e inclusive aumentá-la. A notícia dada pela própria atleta, em um ensaio para a revista norte-americana Vogue, nesta terça-feira (09), e mais do que levantar um debate sobre a importância de Williams para o cenário do tênis, acende um ale
rta para outra discussão fundamental, dentro e fora do esporte: o peso da maternidade no mercado de trabalho.
Serena tem 40 anos, e certamente o momento de parar já estava nos planos para daqui a alguns anos, mas a impossibilidade de conciliar mais uma gravidez e a atenção à filha Olympia, de cinco anos, à rotina complexa de uma atleta de alto nível como ela aceleraram os passos.
“Acredite, eu nunca quis ter que escolher entre o tênis e uma família. Não acho justo. Se eu fosse um cara, não estaria escrevendo isso porque estaria lá jogando e ganhando enquanto minha esposa fazia o trabalho físico de expandir nossa família. Talvez eu fosse mais um Tom Brady se tivesse essa oportunidade”, disse.
A declaração comprova que nem mesmo ser uma multi campeã, com 72 títulos apenas nas disputas de simples na carreira, isenta as mulheres dessa questão estrutural da sociedade, que cobra a presença da mulher junto à família, com a maior dedicação possível, enquanto aos homens cabe apenas o trabalho de prover - mesmo que para isso ele fique distante dos filhos.
Dados da pesquisa “Elas: Comportamentos e barreiras”, realizada pela Nielsen em parceria com o Opinion Box entre fevereiro e março de 2022 reforçam essa realidade de preconceito com mulheres mães no mercado de trabalho.
75% das mulheres ouvidas afirmam que a gravidez é usada como razão para questionar seu trabalho, e 88% acreditam que a possibilidade de engravidar é considerada um motivo para não as contratar. No comparativo com os homens, 75% das mulheres disseram ser perguntadas sobre terem filhos em processos seletivos, contra 69% dos homens. Ainda 52% delas contaram terem sido questionadas sobre onde deixariam seus filhos durante o trabalho.
Outros números, desta vez do estudo Estatísticas de Gênero, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em março de 2021, mostram que o percentual de mães na faixa etária entre 25 a 49 anos que têm crianças de até três anos em casa que estão empregadas é de 54,6%, e que a taxa fica ainda menor quando olhamos para a maternidade negra: apenas 49,7% está no mercado de trabalho. Esta mesma pesquisa indica que homens com filhos pequenos estão mais empregados (89,2%) do que aqueles que não têm filhos (83,4%).
Serena tem razão quando afirma que, se ela fosse Tom Brady (com 45 anos e pai de três filhos) poderia pensar em seguir no esporte por mais tempo. Seja no esporte ou em qualquer outro ambiente, o mercado de trabalho parece ainda não estar preparado para lidar com a maternidade e segue sendo bastante cruel com as mulheres.