Pacote Verde: ministra Cármen Lúcia vota pelo fortalecimento dos órgãos de proteção ambiental
Restante do julgamento foi interrompido por ministro André Mendonça, que pediu mais tempo para analisar as ações que questionam as políticas ambientais do governo
Na última quarta-feira (6), a ministra Cármen Lúcia concluiu a leitura do seu relatório e proferiu o seu voto como relatora de duas das setes ações ambientais do chamado 'Pacote Verde', que está sendo julgado no Supremo Tribunal Federal (STF).
Em seu voto, que se estendeu por duas sessões, a ministra Cármen Lúcia julgou procedentes a ADPF 760 e a ADO 54 e reconheceu o estado de coisas inconstitucionais, o que é caracterizado por uma violação massiva, sistemática e generalizada de direitos fundamentais. A ministra também pontuou diretrizes a serem seguidas pelas União e entidades federais competentes quanto ao desmatamento da Amazônia e omissão apontadas pelas ações.
As ações votadas pela relatora são a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 760 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 54, que em julgamento conjunto tratam sobre omissão na preservação da Amazônia por parte do governo federal.
A ADPF 760 denuncia os atos de omissão da União, incluindo o Ministério do Meio Ambiente e entidades administrativas federais, como o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e a Funai (Fundação Nacional do Índio), que provocaram o aumento do desmatamento, queimadas e incêndios na Amazônia entre 2019 e 2020.
Já a ADO 54 alega a omissão inconstitucional do Presidente da República e do Ministro do Meio Ambiente na tarefa de combater o desmatamento, em que é sustentado que Bolsonaro em todas as suas declarações faz pouco caso do meio ambiente ou do desmatamento extensivo da Amazônia.
Dentre as diretrizes apontadas pela ministra, há a determinação de que a União e os órgãos e entidades federais competentes , como o Ibama, ICMbio, Funai e outras indicadas pelo poder executivo federal, formulem e apresentem um plano em até 60 dias de execução efetivo e satisfatório do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm). Lançado em 2004, o PPCDAm foi descontinuado por Ricardo Salles quando estava à frente do Ministério do Meio Ambiente.
"Pela gravidade do quadro de comprovada insuficiência estrutural das entidades públicas competentes para combater o desmatamento na Amazônia Legal, a União deverá no prazo máximo de 60 dias preparar e apresentar ao STF plano específico de fortalecimento institucional do Ibama, do ICMBio e da Funai e de outros a serem eventualmente indicados pelo poder executivo federal", também pontuou a magistrada em seu voto.
Além disso, Cármen Lúcia também apontou a necessidade de redução efetiva dos níveis de desmatamento e mais transparência sobre as políticas ambientais governamentais.
O restante do julgamento, com o voto dos demais ministros, foi interrompido por André Mendonça - ex-Ministro da Justiça e Segurança Pública e indicado por Bolsonaro ao STF -, que pediu mais tempo para analisar as ações ajuizadas, afirmando que estados também são responsáveis pela preservação do meio ambiente. "A responsabilidade de proteção da região não é apenas da União, é também dos estados", pontuou.
Importância do 'Pacote Verde'
De acordo com Sylvia Siqueira, ecofeminista e diretora do movimento Nossa América Verde, o voto da Ministra Carmen Lúcia ecoa a luta pelo direito socioambiental no Brasil e as preocupações de cientistas e ativistas por justiça climática na América Latina e no mundo.
"Há três anos, organizações ambientalistas, antirracistas e feministas estão denunciando as atrocidades do governo Bolsonaro às autoridades nacionais e em espaços internacionais, como na COP26. A ineficiência e a insuficiência das políticas ambientais do governo, apontadas pela ministra, colocam em risco a vida de populações indígenas e quilombolas, causando assassinatos e criando um estado de terror", explica.
De acordo com a ecofeminista, mais do que inconstitucional, a política de Bolsonaro é genocida e antidemocrática.
"As expressões fortes no voto da ministra-relatora conectaram o Direito à responsabilidade histórica. A gente precisa que a votação do pacote ambiental não seja uma queda de braço contra ao favor do governo, mas, sim, que represente a defesa do direito à vida digna, à biodiversidade a um futuro possível com a Amazônia preservada e seus povos vivendo em segurança", ressalta.
Outras cinco ações ambientais do 'Pacote Verde' (ADPF 735, ADPF 651, ADO 59, ADI 6148 e ADI 6808) devem ser analisadas e terem seus julgamentos iniciados a partir desta quinta-feira (7).
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