Por que mulheres podem demorar para denunciar casos de violência sexual?
Diversas vezes, vítimas optam por não se apresentar a nenhum órgão público para relatar o crime; entenda alguns motivos
Número de estupros e violência contra a mulher aumentaram no Brasil, e segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), existe uma disparidade entre a quantidade real de ocorrências e os registros oficiais.
No ano passado, o Brasil registrou um total de 83.988 casos de estupros e estupros de vulneráveis e um aumento de 6,5% em relação a 2022. A estatística de 2023 equivale a um crime de estupro a cada seis minutos no país. Os dados são do 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública
Ainda segundo o levantamento, a violência contra a mulher aumentou em todas as modalidades. O crime de importunação sexual cresceu 48,7% em um ano, com 41.371 ocorrências, enquanto o crime de assédio sexual aumentou 28,5%, totalizando 8.135 casos.
Além disso, o número estimado de casos de estupro no Brasil é de 822 mil por ano, o equivalente a dois por minuto, segundo uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) do ano passado. No entanto, apenas 8,5% chegam ao conhecimento da polícia e 4,2% são identificados pelo sistema de saúde.
Essa disparidade entre a quantidade real de ocorrências e os registros oficiais se deve a uma série de fatores. Segundo Daniel Cerqueira, pesquisador do Ipea e um dos autores do estudo, "o registro depende, em boa parte dos casos, da decisão da vítima, ou de sua família, por buscar ajuda no Sistema Único de Saúde", disse ao site do instituto.
Muitas vezes, as vítimas optam por não se apresentar a nenhum órgão público para relatar o crime, o que faz com que o número de casos notificados seja substancialmente menor que a prevalência real, segundo apontou o Ipea. E essa falta de denúncia logo após o crime, a demora em fazê-la, pode ocorrer por diversos fatores:
Vergonha
Muitas vítimas sentem vergonha do que aconteceu e temem serem julgadas pela sociedade ou culpabilizadas pelo crime. A violência sexual é, muitas vezes, acompanhada de estigmas que recaem sobre a vítima, fazendo com que ela se sinta constrangida e se retraia ao pensar na possibilidade de expor o caso.
Ainda não entendem que foi uma violência
Muitas mulheres não identificam de imediato que o ato sofrido foi uma violência sexual, especialmente quando o agressor é alguém próximo, como um parceiro, parente ou amigo. O processo de compreender o que aconteceu pode ser longo e doloroso, o que adia a busca por ajuda ou por justiça.
"Os estupros são um tipo de crime geralmente, tipicamente, muito subnotificados por motivos diversos, seja porque a mulher tem medo de registrar ou porque não compreende que aquilo pelo que passou se tratou de um estupro ou porque se trata de uma criança ou uma pessoa vulnerável que não consegue identificar ou que tem medo, não consegue falar, confia naquele autor", disse Isabela Sobral, supervisora do núcleo de dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), à Agência Brasil no ano passado.
Medo do agressor e de serem desacreditadas
O medo do agressor, especialmente quando ele tem alguma forma de poder ou controle sobre a vítima, é uma das razões para o silêncio também. Além disso, há o receio de que, ao denunciar, a vítima não seja levada a sério pelas autoridades ou pela própria sociedade, reforçando o sentimento de impotência.
Vítimas sentem culpa
Muitas vítimas internalizam a culpa pela violência sofrida, acreditando que poderiam ter feito algo para evitá-la. Esse sentimento de culpa é amplificado por pressões sociais que responsabilizam as vítimas por suas próprias agressões e, com isso, desencorajando a denúncia.
Recentemente, a representante especial do secretário-geral da ONU para violência sexual em conflitos Pramila Patten destacou que a violência sexual é “o único crime para o qual a sociedade está mais propensa a culpar as vítimas do que os próprios autores”.
Elas temem retaliações
Além do medo do agressor, existe o temor de represálias sociais e familiares. A exposição do caso pode levar ao afastamento de amigos e parentes, perda de apoio e até mesmo discriminação dentro de seu próprio convívio.
Em caso de violência contra a mulher, denuncie
Violência contra a mulher é crime, com pena de prisão prevista em lei. Ao presenciar qualquer episódio de agressão contra mulheres, denuncie. Você pode fazer isso por telefone (ligando 190 ou 180). Também pode procurar uma delegacia, normal ou especializada.
Saiba mais sobre como denunciar aqui.